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A internet no banco dos réus

Nome sujo no feed

Por Dennys Antonialli, Francisco Brito Cruz e Mariana Giorgetti Valente

Por Francisco Brito Cruz
Atualização:

Se as redes sociais são uma espécie de novo espaço público, parece que ainda falta muito para que tenhamos uma espécie de código informal sobre como se relacionar em cada espaço. Ou, ainda, para entender que a comunicação na Internet tem características diferentes da comunicação face a face, como, por exemplo, a permanência das comunicações.

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Uma das funções a quem têm servido as redes, inclusive por conta da relativa publicidade de alguns dos espaços como os murais de Facebook, é a de cobrança ou constrangimento públicos. Foi o que aconteceu em um caso envolvendo dois vizinhos em Santa Maria (RS): por um conserto mecânico, ficou acertado o pagamento de R$ 250, R$ 200 a serem pagos no aperto de mãos, e R$ 50 no dia seguinte. Segundo o dono do carro, ele não teria pago porque não encontrara o vizinho para pagar os R$ 50 restantes e, quando confrontado, não possuía o dinheiro trocado.

Aproveitando-se da amizade que mantinham no Facebook, o mecânico decidiu fazer a cobrança publicamente por meio de postagens na rede social. Alegou que tentava receber o dinheiro fazia mais de um mês, sem sucesso. Surpreendido com as postagens que o chamavam de "mau pagador", o devedor, que é comerciante, decidiu levar o caso à Justiça. A fama de "caloteiro", afirmou, teria-lhe obrigado inclusive a fechar seu estabelecimento.

Buscando uma reparação por ter sofrido danos morais resultantes das postagens, o dono do carro processou o vizinho mecânico pelas postagens. Ao decidir, o juiz do Juizado Especial Cível de Santa Maria entendeu que houve dano moral e condenou o réu ao pagamento de indenização no valor de R$ 1.500 ao dono do carro. No prejuízo, o vizinho decidiu recorrer e o caso foi à segunda instância. Em julgamento realizado no mês passado, a Quarta Turma Recursal Cível decidiu manter a indenização sob o argumento de que seria "inevitável o reconhecimento do abalo moral causado ao demandante, pois poderia o réu perseguir seu direito por outra forma". O trio de magistrados que julgou o recurso foi unânime ao entender que deveria ser evitada "a exposição do nome e imagem do devedor".

 

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 Foto: Estadão

 

De fato, a exposição de uma pessoa perante o seu círculo de contatos - e até fora dele - pode trazer consequências indesejáveis. Pense em uma pessoa que tenha sua situação financeira exposta para seus colegas de trabalho ou de uma pessoa que tenha detalhes da sua vida íntima revelados de forma irrestrita.

Em alguns casos, no entanto, o constrangimento público vem servindo como forma de evitar um processo longo e custoso. Em 2014, por exemplo, um trabalhador freelancer lançou o site"Pague meu Freela" para pressionar uma agência a pagar pelos serviços que ele havia prestado. Ao constranger a empresa publicamente, o prestador de serviços acelerou um processo de cobrança que poderia se estender por muito tempo. A estratégia deu certo e o freela foi pago. Existem também os muitos casos de denúncias envolvendo casos de assédio sexual, que são complexos por envolver dificuldades de denúncia.

No caso dos vizinhos de Santa Maria, é possível imaginar que havia outras formas de cobrança à disposição do mecânico, que não precisaria ter recorrido às redes sociais para receber o restante do pagamento - por exemplo, ao encontrar o dono do carro no mercado, podia cobrar pessoalmente.

Independente do que se pense sobre a decisão judicial em questão e de outras tantas ocorrências de constrangimento público, o caso parece indicar que, se até um tempo atrás os casos judiciais envolvendo tecnologias da informação eram raridades, que chamavam a atenção, parece que eles começam a se tornar dia a dia. Direito e Internet vira tema até de briga de vizinhos.

 

Acesse aqui a decisão do TJRS.

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