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A internet no banco dos réus

Os filhos postam, os pais pagam

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Por Francisco Brito Cruz
Atualização:

Por Dennys Antonialli e Francisco Brito Cruz

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Não é difícil notar que os jovens invadiram as redes sociais. Antes no Orkut, agora no Facebook, Twitter, Instagram ou em uma infinidades de outras redes e grupos, crianças e adolescentes se acostumaram a interagir por meio da Internet. Apesar de os termos dessas plataformas estabelecerem idades mínimas para sua utilização (13 anos, no caso do Facebook e 16, no do WhatsApp, por exemplo), sabemos que tem sido cada vez mais difícil fazê-los esperar para criar seus perfis.

O uso dessas plataformas pode ser saudável por familiarizá-los com a tecnologia e colocá-los em contato com conteúdos e informações antes inalcançáveis, além de prepará-los para novos contextos de sociabilidade. Mas ela também pode causar situações desagradáveis, potencializando os efeitos de episódios graves como manifestações de preconceito, discriminação ou bullying.

Em São Leopoldo, no Rio Grande do Sul, um desses casos acabou sendo levado à Justiça. Ofendida pela criação da comunidade "Parece um ET" no extinto Orkut, uma pré adolescente gaúcha resolveu processar sua colega de turma, que teria criado a comunidade. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul concordou com a decisão de primeira instância, que concedeu umaindenização à ela diante do teor ofensivo da própria descrição da comunidade:

Pra quem odeia essa MEIA-FODA vai dizr... ela parece um ET e tm uma voz irritante [...] chega a te deixar tonto... e alem de tudo ela eh mto infantil intão eu so obrigada a criar essa comunidade pq não aguentava + fikr guardando isso cmg... e alem d tudo ela merec aff... entra ai viu..."

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Como a criadora da comunidade é menor de idade, quem deve arcar com o valor da indenização, fixado em 8 mil reais, são seus pais. É o que determina o Código Civil (artigo 932, inciso I). A decisão pode servir de alerta para quem ainda não teve com seu filho uma conversa mais séria sobre a importância de se usar essas plataformas com respeito e responsabilidade.

Segundo a decisão, a "vida em sociedade implica um mínimo de civilidade", sendo os comentários "absolutamente inadequados, impróprios e incompatíveis com um convívio social minimamente saudável e respeitoso". Para o desembargador relator do caso, "comportamentos deploráveis desse tipo (...) conquanto cada vez mais comuns e corriqueiros nos contatos travados na internet (...), como facilmente se constata (e quem tem filhos menores como o prolator deste voto bem sabe disso) -, não podem ser tolerados e equiparados a fatos banais e inconseqüentes".

A preocupação dos desembargadores faz sentido. Um levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) aponta que quase 1/3 dos estudantes brasileiros já sofreu bullying alguma vez durante a sua vida escolar, por exemplo. Com a Internet, essas situações podem atingir proporções incontroláveis, levando, inclusive, muitos jovens a cometer suicídio. Lidar com ofensas na Internet exige uma estrutura emocional que, muitas vezes, a criança e o adolescente não tem. Por essa razão, há que se ter cautela em enquadrar essas manifestações como exercício legítimo da liberdade de expressão. Dizer que uma criança é feia ou gorda pode ser muito mais sério do que dizer que um adulto é feio ou gordo.

Isso não quer dizer, contudo, que não se deve levar em consideração o contexto ou a forma de comunicação que se estabeleceu entre os participantes de um grupo, por exemplo. Há muitos grupos de amigos que criam piadas ou apelidos que, ainda que supostamente ofensivos, não geram constrangimento ou discriminação. É a famosa zueira.

Em todo caso, admitir que, cedo ou tarde, jovens farão parte de redes sociais e plataformas como o Facebook ou o WhatsApp, por exemplo, pode ser uma boa justificativa para pensar em prepará-los para fazer bom uso desses ambientes. Se é verdade que o que se aprende em casa, se reproduz na rua, o que se aprende em casa, também se reproduz na rede. Ao invés de proibir, acompanhar e instruir jovens e adolescentes na utilização dessas plataformas pode ser um primeiro passo para educá-los para a liberdade. E essa pode ser a diferença entre o bully e o jovem consciente dos danos que a Internet pode ocasionar. Para outras pessoas e para o bolso de seus pais.

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