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Inovação e cultura maker contada por mulheres

Saiba como a tecnologia está mudando a sua relação com a comida

Fazer uma horta automatizada dentro de um apartamento minúsculo, comer carne produzida em laboratório, passar a consumir alimentos que você jamais considerou. Em qual cenário você aposta?

Por Ana Paula Lima
Atualização:

 

Em um mundo com vasto volume de informações e tecnologias de monitoramento cada vez mais acessíveis, por que ainda não sabemos exatamente o que colocamos no nosso prato? A falta de transparência no processo de produção de alimentos é um problema que atinge diretamente os consumidores, mas que pode estar com os dias contados. Estão surgindo em vários países iniciativas que usam a tecnologia em prol da agricultura local, de movimentos inspirados na cultura do faça você mesmo e de inovações que visam a criar processos produtivos menos predatórios e com menos desperdício. Veja algumas dessas tendências:

 

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Criação de fazendas urbanas

Algumas cidades estão na vanguarda da criação desses espaços, que geralmente são compartilhados e abertos à população. Uma delas é Nova York, onde há várias "rooftop farms". A Gotham Greens é um dos exemplos mais emblemáticos. Lá os produtos são cultivados totalmente livres de pesticidas, em estufas de telhado urbano modificadas tecnologicamente. Por ser muito mais do que um local de produção de alimentos, a Gotham virou um ponto de atração turística no verão.

A força desse movimento tem chamado a atenção de investidores como Kimbal Musk - irmão do fundador da Tesla e da Space X, Elon Musk. Kimbal está por trás da Square Roots, uma aceleradora de fazendas urbanas aberta a empreendedores locais. A ideia do projeto é tornar qualquer tipo de plantação possível em qualquer época do ano sem o emprego de pesticidas e de transgênicos. A principal diferença da Square Roots em relação às fazendas na laje é que seus produtos são cultivados dentro de contêineres equipados com a tecnologia necessária para criar as condições adequadas ao cultivo.

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 Foto: instagram/squarerootsgrow

Horta em casa

A tecnologia implementada pela aceleradora "agrotech" Square Roots pode ser encontrada em várias startups que atuam na área. Um dos projetos mais interessantes vem da Open Initiative Agriculture (OpenAg), do MIT Media Lab. O grupo entende que, para aumentar o número de pequenos produtores agrícolas no mundo, é preciso disponibilizar ferramentas para sistemas de agricultura que não dependam necessariamente da terra ou do clima. Em vez de serem fixadas no solo, as raízes das plantas são nutridas pela água (hidropônico) ou pelo ar (aeropônico). Mas o melhor de tudo é que as ferramentas pensadas para esses sistemas têm o código aberto. O que significa isso? Que qualquer pessoa pode ter acesso ao código e aprimorá-las.

A engenheira mecânica Camille Richman faz parte do time da OpenAg. Ela desenvolveu uma câmara climática que cria as condições ideais para o cultivo de qualquer planta. No sistema criado por Camille, sensores medem e controlam todos os aspectos do ambiente, como quantidade de fertilizantes; gás carbônico; intensidade da temperatura e umidade presentes. A ideia é que a máquina acompanhe as diversas etapas da plantação, compartilhando as informações geradas em um aplicativo. O objetivo da OpenAG é que esse ecossistema seja uma espécie de Internet da Comida, na medida em que gere um banco de dados que poderá ser acessado e alimentado por pessoas do mundo todo.

Startups como a chilena Cloudponics e as americanas Grobo, Seedo, Hydroponics e Grove desenvolveram máquinas como a de Camille, que prometem tirar dessa nova modalidade de agricultor grande parte do trabalho que demanda uma plantação (leia-se: elas automatizam o processo). Muitas dessas empresas surgiram na onda do "plante a sua própria erva", mas a tecnologia usada serve também para o cultivo dos mais variados tipos de vegetais.

 

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Como evitar o desperdício de alimentos

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Tecnologias capazes de analisar o estado dos alimentos em todas as etapas da cadeia produtiva podem ser a solução para o desperdício. Pensando nisso, a C2Sense criou sensores que podem detectar, por exemplo, quando uma fruta está madura ou uma carne ainda está fresca. Esses alimentos liberam gases (etileno e amina biogênica, respectivamente) que o olfato humano não consegue perceber. No caso das frutas, elas amadurecem mais rápido quando expostas ao etileno - e conforme amadurecem, vão liberando mais quantidades desse gás, o que acelera o processo de decomposição de outras frutas.

Ao detectar os gases emitidos, os sensores indicam que alimentos devem ser consumidos primeiro. Uma poderosa ferramenta para o controle dos estoques, que pode também ser usada pelo consumidor em um futuro próximo. O custo (um pouco alto), ainda é um problema. Quando diminuírem, porém, será possível integrá-los a embalagem dos alimentos e até mesmo às sacolas de supermercado.

 

Embalagens comestíveis

Por falar em embalagens, a indiana Bakeys criou talheres comestíveis, produzidos a partir de cereais, arroz e trigo. A alternativa aos canudos de plásticos, altamente poluentes, vem da startup indonésia Avani, que usa derivados de amido de milho na composição do produto. A empresa também substituiu o plástico de sacolas de supermercado por mandioca, tornando inofensiva a eventual ingestão do material por animais marinhos.

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 Foto: instagram/avanieco

Snacks de insetos

As práticas adotadas pela indústria da carne, o crescimento do vegetarianismo e as restrições alimentares de um estilo de vida fitness, seguido por um número cada vez maior de pessoas, fizeram aumentar a pesquisa por novas fontes de proteína. Uma das soluções vem da startup brasileira Hakkuna, que descobriu que grilos (sim!) podem ser ótimas fontes de proteína se criados em condições adequadas. A empresa pretende lançar no mercado snacks como barras proteicas feitos a partir de proteína desses insetos.

A introdução de insetos aos nossos hábitos depende, claro, da mudança de toda uma cultura alimentar do Ocidente, que vê os bichinhos com repulsa. Nada que o marketing não possa realizar.

Charge: J.P.Lima Foto: Estadão

 

Carne de laboratório

Na era da pós-modernidade, o simulacro chega à alimentação. A New Wave Foods, fundada por Dominique Barnes e Michelle Wolf, vende camarão falso, feito de uma combinação de plantas e de algas. As fundadoras garantem que o sabor e o valor nutricional são similares. Já a Clara Foods produz ovos veganos, ou seja, ovos que não derivam das galinhas, partindo de proteínas vegetais idênticas às do alimento original. A Impossible Foods, por sua vez, reproduz o sabor, a textura e o cheiro de carne de hambúrguer com ingredientes como trigo, óleo de coco e batata.

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Dominique Barnes e Michelle Wolf são co-fundadoras da New Wave Foods Foto: Estadão

Entre as biotechs, a Memphis Meat talvez seja a mais conhecida pelo uso avançado de tecnologia na produção de carnes de pato e de frango em laboratório. Ao contrário do que muita gente pensa, esse processo não gera carnes produzidas a partir de transgênicos. O que a empresa faz é reconstituir tecidos a partir de amostras com células dos animais.

Embora essas mudanças pareçam distantes da nossa realidade e das nossas mesas, é uma questão de tempo para elas serem incorporadas gradativamente aos nossos hábitos alimentares. Como toda mudança, terão grandes impactos na vida das pessoas, seja na reorganização das tarefas domésticas (no caso das hortas em apartamentos, a mulher também será responsável por produzir a comida nos lares mais tradicionais?), seja na economia, sobretudo no Brasil, onde a indústria da carne e o agronegócio têm grande peso.

 

* Super obrigada à Thatiana Diniz, que editou o texto, e ao J.P. Lima, autor da charge.

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