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Os problemas do Marco Civil

Lei aprovada ontem pelo Senado apresenta falhas em questões como privacidade e liberdade de expressão

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Por Renato Cruz
Atualização:

Senado aprovou ontem o Marco Civil da Internet Foto: Estadão

Durante os quase três anos em que tramitou na Câmara, a maior parte da discussão sobre o projeto do Marco Civil da Internet se concentrou no conceito de neutralidade de rede, que exige tratamento igualitário a todo conteúdo que trafega na internet. Afinal, todos bits são iguais.

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Enquanto isso, outros pontos essenciais, como privacidade e liberdade de expressão, não receberam o cuidado que mereciam. Na semana passada, participei de uma audiência pública no Senado, e falei sobre essas questões.

O artigo 10 define as regras de acesso aos registros de conexão dos usuários. O problema está no parágrafo 3º: "O disposto no caput não impede o acesso aos dados cadastrais que informem qualificação pessoal, filiação e endereço, na forma da lei, pelas autoridades administrativas que detenham competência legal para a sua requisição".

Na prática, isso deixa margem para integrantes do governo terem acesso a dados de usuários de internet sem decisão judicial. Mas por que permitir que o governo tenha acesso a informações de usuários que não são suspeitos de nenhum crime?

Outro ponto preocupante são os parágrafos 3º e 4º do artigo 19, que trata de liberdade de expressão. Eles permitem que juizados especiais, criados para julgar ações de pequeno valor, que não exigem advogado, tomem decisões sobre retirada de conteúdo da internet, e que concedam liminares.

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Esses parágrafos criam uma via rápida para retirada de conteúdo da rede, mas não definem regras para um possível recurso. Ou seja, vai ser fácil tirar conteúdos - inclusive jornalísticos - da internet, mas difícil reverter essa decisão. O risco é que esses processos em juizados especiais venham a ser usados, por exemplo, para censurar reportagens com denúncias de corrupção.

O Marco Civil da Internet é uma lei muito importante e urgente. Mas é de se lamentar que tenha sido tratado dessa forma. Liberdade de expressão e privacidade são valores cada dia mais importantes, numa sociedade mais e mais conectada.

A própria base do governo admite que o texto é imperfeito. Na semana passada, durante a audiência pública, o senador Walter Pinheiro (PT-BA) chegou a defender a aprovação do projeto da seguinte forma: "Vamos experimentar, e depois, num segundo momento, vamos aprimorar. Por enquanto, esse não é o ótimo nem o bom, mas é o possível".

Com sua aprovação, só nos resta esperar que essa lei, criada para proteger os direitos dos cidadãos na rede, não acabe virando mordaça nem máquina de vigilância. Que não acabe sendo usada para atacar os mesmos direitos que se propõe a defender.

No Estado de hoje ("Texto aprovado tem problemas em pontos importantes", p. B12).

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Foto: Moreira Mariz/Agência Senado

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