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Por que os eletrônicos são tão caros

Apesar dos benefícios da Lei da Informática e Lei do Bem, custo Brasil tira competitividade dos eletrônicos produzidos no País

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Por Renato Cruz
Atualização:

Foxconn fabrica iPhones e iPads em Jundiaí Foto: Estadão

Os eletrônicos no Brasil estão entre os mais caros do mundo, apesar da Lei de Informática e da Lei do Bem, que concedem benefícios tributários à fabricação local. Fatores como impostos indiretos e custos de transporte acabam encarecendo o produto brasileiro e tirando sua competitividade no mercado internacional. A taiwanesa Foxconn fabrica o iPhone e o iPad da Apple em Jundiaí (interior de São Paulo) e na China. Em Jundiaí para o Brasil e na China para o resto do mundo.

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A Lei de Informática atual é bem diferente da primeira lei para o setor, promulgada em 1984, que oficializou a reserva de mercado e fechou o Brasil a produtos e capital estrangeiro. Mas existe uma coisa em comum: ser uma lei que tem como base o mercado interno, no lugar de incentivar a exportação.

A reserva de mercado de informática, que durou até o começo da década de 1990, criou alguma inteligência local, mas penalizou consumidores e afastou investimento. A história da Coreia do Sul, que se industrializou depois do Brasil, foi diferente. O país adotou um modelo de industrialização baseado com base na importação de tecnologia, na formação de grandes grupos nacionais e no incentivo à exportação. O modelo brasileiro, por outro lado, teve como base grandes projetos de "substituição de tecnologia" e ênfase no mercado interno.

A Lei de Informática atual usa a demanda brasileira para atrair investimento de fora, mas ainda não conseguiu desatar o nó da competitividade.

A Lei do Bem, sancionada em 2005, isenta do PIS e Cofins os computadores, tablets e smartphones fabricados no Brasil. Recentemente, foi prorrogada até 2018. "Há cinco anos, o produto brasileiro era competitivo, de 10% a 20% mais caro que o importado", disse o professor Fernando Meirelles, da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo. "Agora, em média, está 50% mais caro, podendo chegar a 100%."

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Segundo Meirelles, os impostos indiretos e o custo Brasil, que inclui itens como logística e insegurança trabalhista e jurídica, acabaram comendo a competitividade do produto brasileiro, trazida pelo corte de impostos. Isso transparece nos dados do setor. Desde 2006, as exportações brasileiras de informática caíram 6,6%, para US$ 385,9 milhões em 2013, enquanto as exportações de telecomunicações despencaram 73%, para US$ 432 milhões.

Contribuíram para a queda das exportações de telecomunicações as barreiras impostas aos produtos brasileiros pelos países vizinhos. A Argentina, por exemplo, revitalizou a sua zona franca da Terra do Fogo e, ao dificultar a entrada dos eletrônicos do Brasil, fez com que vários fabricantes internacionais de celulares e computadores se instalassem por lá.

Para Humberto Barbato, presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), o produto brasileiro tem competitividade internacional. Mas ele concorda que existem custos característicos do Brasil que elevam os preços ao consumidor. "Precisamos contratar uma segurança ostensiva absurda para o transporte", exemplificou. "Os carregamentos precisam vir escoltados."

Mesmo com os incentivos tributários, o eletrônico brasileiro carrega cerca de 14% a 16% de impostos no preço final, incluindo tributos de importação dos componentes, ICMS, PIS e Cofins sobre os insumos. Além disso, as empresas têm o compromisso de aplicar cerca de 4% de seu faturamento em pesquisa e desenvolvimento, como uma das exigências da Lei de Informática. "Essa carga é bem parecida com a que existe em outros países", disse Barbato.

Para o presidente da Abinee, o Brasil poderia ser uma grande plataforma de exportação de produtos eletrônicos, já que os grandes fabricantes estão instalados aqui. O que emperra essa pretensão, como também afirmou o professor Meirelles, é o custo Brasil. "Aqui são mais caros a energia, a mão de obra, o transporte, os portos e os aeroportos", afirmou Barbato. Ou seja, a possibilidade de o produto brasileiro brigar pelo mercado internacional depende de mudanças que vão além de uma política setorial.

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Existem medidas mais específicas, no entanto, que poderiam melhorar o quadro atual. Uma delas seria a assinatura de acordos internacionais de comércio, para abrir mercados externos aos eletrônicos fabricados aqui.

Outra seria o incentivo para a instalação de fabricantes de componentes no País. Os componentes são os itens que mais pesam na balança comercial do setor eletroeletrônico. Desde 2006, sua importação subiu 80%, para US$ 24,6 bilhões no ano passado.

O governo tem apoiado algumas iniciativas, como a instalação da Six Semicondutores em Ribeirão das Neves (MG). Além do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), a fábrica tinha como investidor o grupo EBX, de Eike Batista. Com os problemas enfrentados pelo empresário, a EBX acabou sendo substituída pela argentina Corporación América. A Six Semicondutores deve começar a funcionar no ano que vem.

Falta ao Brasil uma política clara para o setor de eletrônicos, que traga segurança aos investidores e permita planejamento de longo prazo. A Lei do Bem venceria no fim deste ano, e só teve sua prorrogação para 2018 confirmada em outubro.

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A Lei de Informática, que também beneficia as telecomunicações, foi estendida até 2029. "A política de informática dá certo por alguns anos, mas não resolve estruturalmente nada." Enquanto isso, continuamos a pagar mais caro por computadores, tablets e smartphones.

Sobrou pouco da época da reserva de mercado

A história dos computadores no Brasil é uma história de oportunidades perdidas. Sobreviveram poucas empresas criadas na época da reserva de mercado, que fechou o Brasil a produtos importados e a investimento estrangeiro. Uma delas é a Itautec, do Itaú. Outra é a BB Tecnologia e Serviços, do Banco do Brasil, que antes se chamava Computadores Brasileiros (Cobra). Elas sobreviveram principalmente por estarem ligadas a instituições financeiras, que, além de bolsos fundos, são grandes consumidoras de tecnologia.

Até recentemente, também existiam a Scopus e a CPM, do Bradesco, que acabaram vendidas. A reserva começou em 1975, durante a crise internacional do petróleo, com a exigência de anuência prévia da Comissão de Coordenação das Atividades de Processamento Eletrônico (Capre) para importação de todos os artigos de informática.

No ano seguinte, o mercado de minissistemas e periféricos foi limitado a empresas nacionais. Em 1979, a Capre foi substituída pela Secretaria Especial de Informática (SEI). Dois anos depois, chegaram ao mercado os primeiros microcomputadores produzidos no Brasil, com preços cinco vezes maiores que seus equivalentes internacionais.A primeira Lei de Informática brasileira, oficializando a reserva, foi promulgada em 1984.

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No ano seguinte, o governo americano começou a pressionar o Brasil por mudanças, por causa de desrespeito a direitos autorais. Em 1988, o então presidente José Sarney assinou a regulamentação da Lei do Software, que autorizava a importação de qualquer programa de computador destinado ao usuário final. Em 1990, o governo Fernando Collor de Mello anunciou sua intenção de liberar a importação de computadores. A reserva de mercado terminou oficialmente em 1992.

O Brasil atraiu fábricas internacionais de semicondutores no mesmo período que países asiáticos, mas acabou perdendo-as por causa da reserva. Havia sete fábricas de semicondutores no País, controladas por multinacionais: Philips, Motorola, Siemens, NEC, Fairchild, Texas Instruments e National Semiconductors. Entre 1989 e 1992, todas elas deixaram o País, pois a reserva limitava a atuação de estrangeiros.

A fábrica da Philips foi instalada no Recife em 1974. No mesmo ano, foi instalada uma unidade em Kaoshiung, em Taiwan. As duas tinham a mesma capacidade inicial de produção, de 50 milhões de circuitos integrados por ano. A fábrica brasileira foi obrigada a congelar a produção. Cinco anos depois, Taiwan já produzia 1 bilhão de circuitos integrados ao ano.

Diferentemente de países como a Coreia do Sul e Taiwan, o Brasil criou uma política informática voltada para dentro. O alvo era o mercado local. O governo levantava barreiras e quem pagava a conta do desenvolvimento de produtos e da ausência de escala era o consumidor. Não havia foco em exportações.

Foto: Divulgação

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No Estado de hoje ("Políticas para eletrônicos não ajudam indústria local a ser mais competitiva", p. B14).

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