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P2P e cultura digital livre

Nova abordagem para um velho problema sem solução

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Por Tatiana Mello Dias
Atualização:

Jammie Thomas-Rasset é uma dona de casa norte-americana que foi condenada a pagar US$ 222 mil por ter baixado 24 músicas no Kazaa. O caso, que corre desde 2007, é um drama jurídico emblemático que mostra a briga de Davi e Golias entre os usuários e a indústria. Em uma série de apelações, o valor da multa que Jammie deveria pagar variou de US$ 54 mil a absurdos US$ 1,9 milhão. A última decisão foi pelo valor de US$ 222 mil - quase US$ 10 mil por música baixada.

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Jammie não é a única. Na longa luta contra a pirataria, a indústria fonográfica gastou uma enorme energia - e dinheiro com advogados - para conseguir penas duras contra usuários comuns flagrados baixando conteúdo ilegalmente.

Agora, porém, eles dizem que a abordagem mudou e que as penas desproporcionais estão com os dias contados.

Começou a ser colocado em prática o plano de combate à pirataria encabeçado pelo Center for Copyright Information (CCI), organização criada pelas entidades que representam os estúdios de Hollywood e as grandes gravadoras em parceria com os provedores de conexão nos EUA. As empresas de internet concordaram com as práticas sugeridas pela indústria cultural para combater a pirataria e trabalharam em conjunto para implantar um programa de educação e punição, na forma de respostas graduais, aos usuários piratas.

O programa funciona assim: um sistema chamado "Mark monitor" vigia a atividade online do usuário, identificado pelo IP. Se for detectada uma movimentação pirata - acessar redes P2P e baixar um conteúdo, por exemplo - o usuário recebe um aviso. A pessoa pode receber até cinco avisos - e a partir do quinto, ela sofre um corte na velocidade de conexão e começa a ser redirecionada a uma página até que seja completado um programa educativo antipirataria. A nova política já começou a ser colocada em prática por grandes provedores dos EUA como Comcast e AT&T.

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Para os defensores da política, a ideia é diminuir as penas desproporcionais e educar os usuários de internet. São duas ações que sem dúvida precisam ser colocadas em prática - resta saber se um programa punitivo do tipo é eficiente.

O novo plano levantou uma série de críticas e dúvidas. Algumas são mais filosóficas: os provedores de conexão podem vigiar a navegação do usuário? Quem garante a privacidade? Os provedores têm a responsabilidade de monitorar a navegação do usuário?

Os críticos também dizem que não é possível encontrar a identidade de um criminoso apenas com seu número de IP. Todo o processo punitivo do mecanismo está baseado no IP. Mas o protocolo não identifica necessariamente quem cometeu um crime - um mesmo IP pode ter vários usuários. Além disso, o número pode ser escondido através de ferramentas de navegação anônima.

E as consequências do novo programa ainda são desconhecidas. O CCI estimula as pessoas a vigiarem quem está usando suas conexões de internet - afinal, se alguém for flagrado baixando pirataria, a pena será para o dono da rede. O sistema também desencoraja iniciativas como o movimento pelo Wi-Fi aberto, que incentiva as pessoas a liberarem uma parte de sua conexão para que seja criada uma grande rede Wi-Fi pública e aberta pela cidade.

E, por fim, o sistema não responde à pergunta fundamental: como fazer as pessoas voltarem a pagar por cultura?

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Na França, a Lei Hadopi, que criou um sistema do tipo, não reverteu o prejuízo da indústria e foi classificada pela ministra da Cultura como "restrita, antieconômica e ineficaz". Mesmo assim o modelo continua a ser exportado - para os EUA, Inglaterra e Nova Zelândia. (Funcionaria no Brasil?)

A iniciativa de parar de criar bodes expiatórios em processos kafkianos contra usuários comuns merece ser aplaudida. Mas trocar a repressão pesada sobre poucos indivíduos por uma repressão mais branda sobre muitos indivíduos é apenas uma maquiagem para a mesma abordagem. A história já mostrou que a perseguição e o combate à pirataria, sejam pesados ou brandos, não bastam. Os consumidores devem ser conquistados, e não penalizados.

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