Caçadores de vírus

Como é a rotina de um laboratório que tenta antecipar ameaças e ataques a seu computador

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Por Fernando Martines
Atualização:

Ao abrir a caixa de entrada, verifica-se a existência de uma mensagem do banco. Nela, a instituição pede o número da conta e a senha para que o cliente receba um prêmio de capitalização. Golpe. Fácil para a pessoa com um mínimo de tempo de uso de internet identificar a tentativa de crime. Mas o conhecimento básico que não se deve clicar em links suspeitos, instalar programas que não se conhece ou digitar dados bancários em sites desconhecidos protege apenas em parte. A ameaça à vida digital – e econômica – pode chegar por caminhos muito menos óbvios.

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“A disseminação de vírus depende cada vez menos de ações do usuário, como clicar em algum link ou digitar seus dados. Também independe do aparelho que ele estiver usando, pois o vírus vai habitar as redes de internet. Quem se conectar, se infecta”, explica Leonrado Bonomi, responsável pelas pesquisas de segurança digital do laboratório Trend Micro. Seu prognóstico é dito menos em tom de alarme e mais como conselho. Afinal, é cada vez mais comum nos conectarmos com laptops e smartphones em redes desconhecidas. Bonomi é um dos vários pesquisadores da Trend Micro, empresa multinacional especializada em segurança digital, com filial brasileira no bairro paulistano do Itaim Bibi. Junto dele trabalha Fioravante Souza, cuja rotina é vasculhar a web brasileira em busca de novos vírus, como eles agem e como se espalham. Ele passa o dia em redes sociais, sites e fóruns. “Meu trabalho é ficar no Orkut”, brinca.

Produção Ao identificar um novo programa malicioso, Fioravante o estuda e registra como foi programado e o que faz no computador da vítima. Com essa radiografia do vírus, o pesquisador manda as informações aos laboratórios dos Estados Unidos e Filipinas. Lá, engenheiros vão se debruçar sobre o conteúdo e criar um software que imunize os computadores da nova ameaça. “Nosso trabalho aqui é colher informações para que os engenheiros façam as vacinas. Também buscamos identificar tendências nos crimes e usar isso na hora de fazer nossos produtos”, diz Fioravante, que completa informando que os antivírus e filtros desenvolvidos pela Trend Micro são destinados a empresas, governos e grandes corporações.

Em público Durante a conversa, Fioravante e Bonomi se esforçam para mostrar que o perfil do hacker mudou. Se antes era necessário gastar semanas ou até meses programando cada linha do vírus, agora há programas que apenas pedem como a pessoa quer que o vírus atue e, em cinco clicks de mouse, a praga está pronta. Para exemplificar a tese, Fioravante conecta seu notebook a uma televisão e começa a passear pelo Orkut. A primeira parada é uma comunidade que ensina os passos básicos de como criar um vírus. O pesquisador entra em um tópico criado por uma garota que explica como criou seu programa para travar computadores alheios. Uma rápida pesquisa em seu perfil mostra que ela faz odontologia, a universidade e o bairro em que mora. O tour segue rumo a uma comunidade que pode deixar usuários mais sensíveis paranoicos: o fórum se dedica a ensinar à criação de um vírus que, uma vez instalado no computador alheio, permite ao hacker controlar remotamente a máquina, acessar todos e quaisquer arquivos que estejam nela, além de acionar remotamente microfone e webcam. O criminoso digital tem acesso ao seu computador e ao que você fala e faz dentro de casa. Em outras comunidades, hackers trocavam listas de vítimas fáceis.

Em geral, esses jovens querem só mostrar aos colegas seu talento em invadir sistemas. Mas uma parcela usa os dados que recolhem para colocar em prática um golpe financeiro mais complexo do que simplesmente transferir dinheiro para as próprias contas (veja infográfico à esquerda).

“São esses garotos e garotas que começam a cometer crimes mais pesados que entram para as cibergangues, grupos organizados que fazem assaltos pela internet”, contou Fioravante. Mas como fazer para não ser infectado por um vírus digital? “Não tem como ficar completamente seguro. Não clicar em links que não forem confiáveis, não fazer downloads em sites suspeitos, essas coisas são a primeira parte. Também é necessário ter um bom antivírus e um firewall, e, mais do que isso, manter ambos atualizados. E, por último, só se conectar em redes de internet que você conheça ou que sejam seguras”.

Mais trabalho A internet tem penetração em 6% da população brasileira. Uma pesquisa do Banco Mundial mostra que, pelo nosso PIB per capita, isso deveria ser de no mínimo 12%. Com o barateamento de conexões 3G, computadores e smartphones e o Plano Nacional de Banda Larga do governo, a tendência é que em um futuro próximo uma parcela muito maior de pessoas consiga acessar à internet.

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Jogados esses números na mesa, Fioravante se despede consciente de que a perspectiva é que tenha muito mais trabalho daqui para frente. “O aumento de pessoas com acesso à internet significa muito mais casos de crimes cometidos por hackers”.

—- Leia mais:Veneno de ratoLink no papel – 27/09/2010

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