“Eu aceito”. Com a internet, a frase deixou de ser domínio exclusivo de cerimônias de casamento e hoje está em praticamente todo serviço que você usa na rede. São os extensos e tediosos Termos de Uso – contratos que precisam ser aceitos antes de se começar a utilizar uma nova rede social ou aplicativo na internet. Esses textos inspiraram o designer israelense Dima Yarovinksy, de 26 anos, a criar a instalação de arte “I Agree”.
Ele imprimiu os longos textos que trazem as regras que regem redes sociais como Facebook, Instagram, Twitter e Tinder em um longo rolo de papel – um para cada rede social. Ao final de cada “serpente de papel”, Yarovinsky inseriu a contagem de palavras em cada contrato e o tempo necessário para lê-lo.
Inicialmente feito como um trabalho de faculdade, o projeto acabou sendo exibido na Visualizing Knowledge, exposição na Finlândia focada em obras de design de informação. De lá, viralizou pela internet. A obra traz a mensagem forte de questionar o que aceitamos ao fazer parte destas redes sociais, principalmente em um cenário após o escândalo da Cambridge Analytica, empresa de inteligência que usou de forma ilícita dados pessoais de 87 milhões de usuários do Facebook.
Segundo o artista, a ideia do projeto surgiu antes da polêmica, mas o escândalo ajudou Yarovinsky a ganhar projeção internacional. O Estado conversou com o israelense, que falou da obra e da sua busca como designer de trazer “dimensão real” a questões exclusivas da rede. Leia a seguir trechos da entrevista:
Estado: Por que falar de Termos de Uso e Conduta que ninguém lê?Dima Yarovinksy: Eu tinha essa dúvida. Certo dia, perguntei para minha mãe se ela já havia lido algum desses contratos. A resposta dela me assustou: ela nem sabia o que era aquilo. Foi então que comecei a pensar que “li e aceito os termos de conduta” é a maior mentira da internet. Esses “termos” são contratos legais entre o usuário e a empresa, apesar de não haver nenhuma possibilidade de negociar aquilo que quase ninguém tem consciência que está aceitando.
Quanto tempo uma pessoa leva para ler os termos de uso de um serviço de internet? Quem se dispor a ler dificilmente encontrará tempo. Uma pessoa normal lê cerca de 200 palavras por minuto. Um contrato comum tem cerca de 12 mil palavras, o que significa que, se um usuário resolver ler um termo de serviço padrão, vai gastar pelo menos uma hora.
Como você começou a pensar em como o design afeta a tecnologia? Fui um dos fundadores do primeiro hackaton de ciência de dados de Israel. Lá trabalhava com os programadores a fim de apresentar os resultados de maneira mais clara. Hoje vivemos em um mundo visual, e o design é uma ferramenta poderosa de comunicação. Tudo precisa ser facilmente assimilado com o olhar.
Pensa em outras obras ligadas a questão de privacidade na rede? Tenho na cabeça uma reportagem de 2017 do The Guardian sobre os códigos de conduta do Facebook, mostrando que em vez de extensos algoritmos sofisticados, a moderação na rede era feita na Índia e Filipinas. Mais que isso, revelou também um extenso arquivo com as políticas do site, que se vende como uma grande comunidade, mas esse tipo de material mostra que ele se assemelha a um governo, com leis estritas. Um de meus próximos trabalhos será transformar isto em um livro físico, algo como uma “nova Bíblia”, com todos os preceitos morais da internet, de acordo com o Facebook.
Por que fazer o caminho inverso e levar coisas do digital para o físico? Eu nasci na era digital e nossas vidas hoje são geridas na internet. Trazer isso para o mundo físico faz com que a pessoas tenham uma noção com “escala real” daquilo que estão lidando. Antes de fazer “I Agree”, fiz a experiência de imprimir todos os meus registros de mensagem. É impressionante como só dessa maneira você consegue ter uma noção real daquilo que está na tela.