PUBLICIDADE

'Em 10 anos, transporte não será um problema', diz presidente da 99

À frente da startup brasileira desde outubro do ano passado, norte-americano falou sobre os próximos passos em entrevista exclusiva ao 'Estado'

Por Claudia Tozzeto
Atualização:
Peter Fernandez, presidente executivo da 99: empresa dobrou o número de funcionários em cinco meses Foto: JF Diório/Estadão

O americano Peter Fernandez não é o típico presidente executivo. Aos 33 anos, sendo os últimos seis no Brasil, ele aprendeu a falar perfeitamente o português e, hoje, deixa espaço na agenda para fazer pelo menos cinco corridas por mês como motorista do 99POP. “Para inovar, é preciso se colocar no lugar do cliente.”

PUBLICIDADE

Fernandez foi um dos investidores anjo da 99 e, depois de alguns anos no Google, ele se juntou à startup. Em outubro de 2016, assumiu a liderança da 99 com a missão de fazer alianças internacionais. Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista:

Estado: O que mudou na 99 após o investimento da Didi? O aporte do SoftBank acelera os planos?Peter Fernandez: Com mais recursos financeiros, conseguiremos acelerar nossa missão, que é fazer o transporte ficar cada vez mais barato, rápido e seguro para os brasileiros. Nós dobramos o número de funcionários da 99 (a empresa está próxima de 400 empregados) e devemos chegar a mil pessoas até o final do ano. Também investimos em tecnologia e em marketing para que as pessoas nos conheçam. Estamos em um período de crescimento exponencial. Desde janeiro, o número de corridas do 99POP cresceu 25 vezes e hoje representa mais da metade das corridas com o aplicativo em São Paulo.

O mercado de aplicativos de transporte ainda está no início? Estamos dando os primeiros passos e ainda temos mais 20 anos de inovação pela frente. Dá para comparar com a comunicação: há dez anos, fazer uma ligação internacional era algo muito caro, era preciso imprimir mapas. Hoje, há serviços que fazem isso de graça. Daqui a dez anos, o transporte não será mais um problema. Ele vai simplesmente funcionar e será barato. Não vamos mais precisar pensar nisso.

Como o sr. pretende gastar o dinheiro recebido na rodada? As prioridades da 99 são crescimento agressivo e segurança. Em 2017, queremos dominar o Brasil com o 99POP e agora temos recursos suficientes para acelerar isso. Mas não vamos parar: queremos fazer novas rodadas de investimento e expandir o serviço para outros países em 2018.

Quais os desafios que o crescimento do 99POP trouxe para a 99? A nossa responsabilidade aumentou muito depois do lançamento do 99POP. Com o táxi, é o governo quem garante a segurança do serviço. Com o 99POP, nós referendamos o motorista. O que mais importa nessa discussão é segurança. A gente treina os motoristas para fazer um bom serviço, ser gentil, mas o que mais importa é a segurança. Tenho uma equipe de segurança que reporta diretamente para mim, em vez de estar integrada à equipe de produtos ou tecnologia. Eles desenvolvem e lançamos semanalmente novos recursos para manter o serviço mais seguro. Isso vai de falar para o motorista que ele está entrando em uma área de risco, para ele poder cancelar a corrida se quiser, até avisar o motorista que ele vai passar num cruzamento em que acontecem muitos acidentes.

Quando essa equipe de segurança foi criada? Sempre houve esforços nessa área, mas essa equipe que se reporta direto a mim existe desde dezembro, sendo que começamos a operar o 99POP em outubro. Assim que nós lançamos a nova modalidade, nós identificamos a necessidade de investir em segurança e a equipe foi crescendo em tamanho e importância. Nossos engenheiros estão aqui, eles conhecem a realidade do Brasil. Todos já passamos por problemas de segurança. Como sentimos isso na pele, conseguimos atuar mais rapidamente no problema.

Publicidade

A 99 dobrou de tamanho em poucos meses. Quais desafios isso trouxe à gestão? Não é a primeira vez que eu estou numa empresa que tem crescimento exponencial, passei por isso tanto no AdMob como no Google. Para manter a cultura de uma empresa assim é preciso ter uma liderança forte. É responsabilidade de cada líder garantir que toda a equipe dele entenda a estratégia, a visão, a nossa cultura. Além disso, é preciso transparência. As pessoas sabem de tudo, até mesmo de assuntos que são confidenciais. Nas nossas reuniões semanais, mostramos todos os resultados, assim as pessoas conseguem tomar as melhores decisões. É preciso dar voz às pessoas também. Aqui, todo mundo tem uma chance de influenciar a gestão da empresa. Se alguém diz que estamos fazendo algo errado, eu escuto e analiso cuidadosamente.

O sr. costuma fazer corridas como motorista? Porque? Inovar é servir melhor a necessidade das pessoas, não é a tecnologia que faz a inovação. Para entender melhor o cliente é preciso se colocar no papel dele. Nós temos uma responsabilidade muito grande em entender e servir o motorista e o passageiro brasileiro, melhor do que qualquer outra empresa do mundo. O único jeito de fazer isso direito é colocar as pessoas para dirigir os carros. Conforme as pessoas fazem corridas, elas percebem os problemas e, quandos eles não são resolvidos rapidamente, as pessoas ficam inconformadas e resolvem, elas mesmas, os problemas. Eu comecei a fazer isso no mês que lançamos o 99POP, mas nunca fiz com táxi, porque seria ilegal. Hoje, faço pelo menos cinco corridas por mês como motorista.

Qual a situação mais complicada que teve de passar para conseguir os últimos investimentos? Eu tive um problema enorme na última viagem para a China antes de fechar o investimento de US$ 100 milhões da Didi Chuxing. Eu viajei na última semana antes do Natal para fazer a última apresentação na Didi. Era importante, então me preparei muito, escolhi a melhor roupa (risos). Como eu precisava de muita coisa na mala, eu despachei a minha mala, mas cometi o grande erro de colocar a minha roupa da apresentação nela. Obviamente, a companhia aérea perdeu a bagagem despachada e eu não tinha outra roupa para fazer a apresentação. Eu tive de fazer o pedido de investimento de US$ 100 milhões de pijama. Estava usando um tênis branco esportivo, que eu nunca usaria num escritório. Eu estava usando uma calça de moleton bem surrada e uma camiseta que não trocava há dois dias (o trecho entre Brasil e China demora 36 horas) e não tinha outra para trocar. Eu consegui esconder a camiseta, felizmente, com um suéter preto. Quando os executivos da Didi entraram na sala, eu mal me levantei da mesa para cumprimentá-los. Fiz a apresentação sentado. Mas deu certo (risos).

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.