Para se salvar, Twitter precisa ser menos ambicioso

A rede social 'mais importante do mundo' pode ter um futuro mais interessante se tentar não competir com empresas como Google e Facebook

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Por Agências
Atualização:

Stuart Goldenberg/NYT

 

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Farhad ManjooThe New York Times 

O Twitter é a rede social mais importante do mundo.

Essa afirmação pode parecer exagero de um viciado, mas basta observar as manchetes dos jornais todas as manhãs e a obsessão de todos os canais de notícia da TV a cabo. Praticamente qualquer coisa que aparece no noticiário hoje em dia tem alguma relação com controvérsias e conversas que ocorrem na rede dos 140 caracteres.

Ainda assim, apesar de toda a sua influência o Twitter anda em maus lençóis. A rede sempre foi muito estranha e complicada para os novos usuários se acostumarem e já faz algum tempo que o crescimento é bastante lento. Agora, de acordo com um relatório de faturamento publicado em 10 de fevereiro, o número de usuários deixou de crescer

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Os investidores do setor de tecnologia não têm dado trégua para nenhuma empresa nos últimos tempos e Jack Dorsey, um dos fundador do Twitter, que reassumiu recentemente o cargo de executivo-chefe, está longe de ser tratado com carinho.

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Assim sendo, o que pode ser feito? Este é o momento de o Twitter começar a pensar em algo radical. Há mais de dois anos, a empresa passou a negociar suas ações na Bolsa de Valores de Nova York. No primeiro dia de vendas, os investidores avaliaram o Twitter em quase US$32 bilhões, um valor que trazia consigo a expectativa de que o Twitter continuasse a mudar seu perfil para atrair usuários mais comuns, fomentando um crescimento vertiginoso no faturamento com propagandas.

Os únicos padrões de empresas virtuais bem sucedidas para Wall Street são o Google e, mais recentemente, o Facebook. Com sua IPO, o Twitter afirmava ao mundo que fazia parte do mesmo clube – dizia que não havia limite máximo para suas pretensões comerciais e que faria de tudo para criar uma máquina de fazer dinheiro tão significativa quanto o serviço que prestava.

Mas e se o melhor caminho para o Twitter, enquanto serviço virtual, fosse a empresa Twitter abandonar esse sonho? E se a possibilidade de se tornar uma gigante da internet de 25, 50 ou mesmo 100 bilhões de dólares não seja uma possibilidade para um serviço de nicho como o Twitter?

O futuro talvez seja mais promissor para o grupo enquanto uma empresa privada e independente; como uma divisão pequena e sustentável de algum conglomerado de mídia ou tecnologia; ou mesmo como um investimento de risco que funcione mais como uma fundação sem fins lucrativos.

Mesmo que o Twitter planeje continuar como sociedade anônima – afinal, não parece haver vontade, nem mecanismos muito óbvios que permitam que os investidores tornem a empresa novamente limitada – esse é o momento certo para Dorsey criar novas expectativas de futuro para a empresa. O Twitter deveria ver a si mesmo e se mostrar para os investidores como um serviço de utilidade pública, não como uma empresa que cresce desenfreadamente com chances de um dia chegar ao valor de mercado do Facebook.

CREDITO

 

“Talvez o Twitter não tenha nascido para ser a banda mais popular do planeta”, afirmou Anil Dash, velho usuário do Twitter e executivo-chefe do ThinkUp, uma startup que pretende melhorar a forma como as pessoas utilizam as redes sociais. “Talvez seu futuro seja como o do Pearl Jam, não como o do U2 ou dos Rolling Stones, e talvez o Twitter possa chegar ao equilíbrio como uma empresa com valor de mercado de US$5 bilhões”. (No momento, o valor de mercado do Twitter é de cerca de US$10 bilhões).

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Isso não quer dizer que não deveria gerar lucro. O Twitter ainda pode ser uma empresa funcional, que gera dinheiro o bastante para manter e aumentar o alcance de seu serviço. Contudo, nem toda empresa da internet precisa ser a maior e a mais ousada de todas, convertendo-se nessa entidade que cresce incansavelmente e que nos acostumamos a esperar.

Ao invés de ser algo como o Facebook, o Twitter poderia se basear em outros modelos de sucesso. Poderia ser uma empresa como a Wikipedia, comandada por uma organização sem fins lucrativos que depende de doações, ou como a New York Times Co., empresa de capital aberto controlada por uma família que tem preferência por ambições jornalísticas.

Em outras palavras, o Twitter deveria deixar claro que existem limites para o escopo de suas ambições comerciais e que ele é guiado por uma linha filosófica que prioriza a saúde do serviço em detrimento da ambição de crescer a qualquer custo.

Existe uma boa razão para Dorsey pensar em algo novo: expectativas irrealistas são o caminho certo para um futuro ruim. Depois de perder o posto de maior ferramenta de busca, o Yahoo enfrentou mais de uma década de dificuldades porque durante muito tempo quis ser o portal que não tinha condições de se tornar.

Reuters

Com esse objetivo, a empresa perdeu talento, dinheiro e teve mais executivos-chefes do que uma promoção na Brooks Brothers. Se ao invés de mirar o impossível, o Yahoo tivesse diminuído suas ambições e planejado fazer uma ou duas coisas muito bem, a empresa poderia ter encontrado um melhor rumo para o futuro.

Tornar mais clara a missão do Twitter poderia prejudicar muitas pessoas que trabalham lá, pois talvez fosse necessário dispensar empregados. Além disso, o valor das ações que pertencem aos funcionários poderia cair consideravelmente, caso a empresa deixasse a bolsa de valores. O mesmo problema afetaria os investidores que compraram ações da empresa, quando as expectativas eram grandes.

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Contudo, limitar o escopo do Twitter certamente seria melhor para o serviço. O Twitter precisa melhorar seu produto: ele deveria ter formas mais eficazes de resolver casos de abuso e assédio. Além disso, os usuários deveriam ter mais facilidade em encontrar tuítes sobre assuntos que achem interessantes. Contudo, a solução para esses problemas provavelmente não está no crescimento.

Dash destacou que tornar o Twitter mais fácil para que novos usuários entrem para a rede poderia na verdade agravar os casos de assédio. “Todos sempre falam em facilitar a experiência para quem quer utilizar a plataforma. Porém, uma das coisas que pode ajudar é justamente o contrário – dificultar o procedimento. Mas infelizmente ninguém fala sobre isso.”

Limitar o escopo comercial do Twitter também poderia ajudar a diminuir as reações excessivas que ocorrem sempre que a empresa tenta fazer melhorias no serviço.

Na atual situação, o Twitter é bom para muita gente. O Facebook tem cinco vezes mais usuários, o Instagram é tão luxuoso quanto uma viagem à Europa e o Snapchat é o mais descolado. Mas como o Twitter é uma rede acessível e em tempo real que se tornou um centro nevrálgico para jornalistas, políticos, ativistas e agitadores, para o bem ou para o mal, ele já demonstrou uma capacidade inigualável de influenciar coisas concretas no mundo real.

Basta pensar na Primavera Árabe, no #blacklivesmatter ou na campanha de Donald Trump.

“O Twitter criou espaço para amplificar a voz dos marginalizados de uma maneira nunca vista antes. Ele redefiniu a forma como vemos a esfera pública, tornando-a mais inclusiva e acessível, além de ter um impacto considerável em eventos reais”, afirmou DeRay McKesson, um dos fundadores do movimento Black Lives Matter.

Mas para além desses movimentos, é só ver todas aquelas hashtags que enchem os anúncios do Super Bowl. Ou ver como os comentários do Twitter se tornaram uma característica comum dos noticiários e programas de TV. Se ninguém tuitou sobre um fato, será que realmente aconteceu?

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É claro que o Twitter poderia ser melhor, mas não precisa ser completamente remodelado tendo em vista apenas o crescimento. “O Twitter talvez não tenha criado um produto que se adapte ao gosto dos analistas de Wall Street, mas a sua utilidade na transmissão de notícias em tempo real é inegável e não foi superada por nenhum outro serviço”, afirmou Mike Jones, executivo-chefe de uma incubadora de startups chamada Science Media.

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