Eletrônico comprado no exterior tem garantia no Brasil?

Principais fabricantes de celulares e notebooks têm políticas de conserto distintas, apesar de associações de defesa do consumidor afirmarem que produtos possuem garantia no País

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Por Stefano Wrobleski
Atualização:
Custando R$ 7 mil no Brasil e US$ 1 mil nos EUA, o iPhone X pode ser um dos itens mais trazidos na mala pelos brasileiros que viajam para fora, mas provavelmente ele não terá garantia por aqui Foto: Washington Post/Carolyn Van Houten

Em tempos de iPhone a R$ 7 mil e videogames bem acima do preço na conversão para o dólar, não são poucos os brasileiros que voltam do exterior com algum eletrônico na mala. Mas, antes de comprar um celular ou notebook em outro país, é bom ficar atento: se o aparelho quebrar durante o prazo de garantia, a maioria dos principais fabricantes que atuam no Brasil nega o conserto gratuito. A questão é tema de disputas na Justiça há 26 anos e as decisões nem sempre favorecem o usuário. Mas os órgãos de defesa do consumidor consultados pela reportagem são unânimes ao considerar que o prazo de garantia para produtos comprados no exterior deve seguir a mesma regra dos bens adquiridos no País.

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No centro da discussão está uma interpretação do Código de Defesa do Consumidor, que obriga fabricantes e importadores a consertar os defeitos de seus produtos, mas não faz referência ao local de compra. O advogado Christian Printes, do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), avalia que a norma garante ao consumidor, além do prazo de garantia contratual, também o tempo de garantia definido na lei. “O fornecedor que tem representatividade internacional e atua no Brasil deve respeitar as mesmas regras”, pontua.

A garantia contratual é aquela definida pelo fabricante, que geralmente vale 12 meses. Além dela, a lei determina um prazo de três meses para bens duráveis, como eletrônicos, que devem ser somados à garantia do fabricante.

Para o Procon de São Paulo, as empresas devem se responsabilizar ao menos pela garantia legal, de três meses, quando o aparelho é trazido do exterior por um consumidor. “O Código de Defesa do Consumidor nos permite entender desta forma porque fala do fabricante e da responsabilidade solidária dos fornecedores”, diz Fátima Lemos, assessora técnica da fundação.

Arthur Rollo, titular da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), que é vinculada ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, concorda. Para ele, “se a empresa não atender o pedido do consumidor, é caso de ação judicial porque ela faz uma publicidade mundial e tem atuação mundial. Isso reforça a marca e justifica a demanda”.

Justiça. A discussão foi para os tribunais pela primeira vez em 1991, um ano depois da aprovação do Código de Defesa do Consumidor, quando um turista comprou nos Estados Unidos uma filmadora da Panasonic que tinha garantia de um ano e apresentou problemas logo depois da compra. No Brasil a empresa não vendia o eletrônico e afirmou que, por isso, não poderia consertá-lo. O caso se arrastou até 2005, quando o Superior Tribunal de Justiça (STJ) finalmente condenou a empresa a indenizar o turista em R$ 4 mil.

A decisão do STJ passou a ser usada em ações judiciais como argumento para garantir o conserto de produtos dos consumidores, mas as sentenças nem sempre são favoráveis. Em 2015, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios entendeu, em decisão final, que um PlayStation não precisaria ser consertado pela Sony, fabricante do videogame, porque “a responsabilidade do fornecedor [...] só existirá quando colocar o produto no mercado brasileiro”, o que a turma de juízes considerou não ter sido feito com aquela unidade, trazida do exterior por um viajante.

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Conserto. Entre as 11 maiores fabricantes de celulares e notebooks com atuação no País, somente quatro afirmaram ao Estado consertar no Brasil aparelhos comprados em outros países que estejam dentro da garantia.

A Samsung oferece conserto para todos os notebooks da marca, enquanto HP e Dell só dão garantia para modelos trazidos do exterior que também forem comercializados pelas marcas no Brasil. Já a Lenovo conserta no País somente alguns modelos dos notebooks que a empresa produz – são os aparelho das linhas Think, Gamer Y720 e Yoga 900 ou superiores. 

Já Microsoft, Huawei, Asus e Motorola não oferecem garantia a nenhum eletrônico comprado lá fora. A LG disse não ter política sobre o assunto e Apple e Acer não se posicionaram depois de uma semana de solicitações da reportagem. Das 11 empresas consultadas, nenhuma estende a garantia para celulares trazidos do exterior.

Arthur Rollo, da Senacon, sugere que o consumidor tenha uma “perspectiva preventiva” na hora de escolher. “Se estiver na dúvida entre alguns produtos, ele pode perguntar quais opções têm garantia mundial.”

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Se o aparelho já tiver sido comprado e a assistência técnica se recusar a consertá-lo, Christian Printes orienta o consumidor a, primeiro, tentar comprovar a recusa por escrito e entrar em contato com o atendimento ao consumidor da fabricante.

Caso a empresa também não queira consertar o aparelho, o usuário pode fazer uma reclamação no Procon ou no site Consumidor.gov.br, que é ligado à Senacon e viabiliza resoluções amigáveis entre fabricantes e consumidores, mas não tem participação de todas as empresas. Se isto também não funcionar, Printes diz que é necessário entrar com uma ação no Juizado Especial Cível, o que pode ser feito pelo site do Tribunal de Justiça em São Paulo e não exige advogado se o produto custar menos de 20 salários mínimos – ou seja, menos de R$18.740.

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