Tim Schafer: 'Quando era criança, achava que só gente incrível fazia games’

Criador de jogos como Secret of Monkey Island, Tim Schafer vem ao País para falar sobre carreira e conhecer jogos locais 

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Por Bruno Capelas
Atualização:
Tentativa e erro. O melhor jeito para aprender a criar bons jogos é fazendo, diz Tim Schafer Foto: Arquivo Pessoal

Não se engane pelo jeito bonachão de Tim Schafer: ele é um dos maiores criadores de games de todos os tempos. Com mais de 30 anos de carreira – 10 deles na LucasArts, mítica empresa de games do cineasta George Lucas –, o norte-americano de 49 anos é responsável por jogos que marcaram os anos 1990, como The Secret of Monkey Island e Grim Fandango.

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Os dois jogos, bem como outros feitos por Schafer, são clássicos do gênero adventure – no qual é quase impossível morrer e o foco do jogo está em diálogos bem construídos, resolução de enigmas e exploração de ambientes. Nas últimas décadas, eles foram a primeira experiência com games de muita gente. “Ouço muito a frase: ‘minha namorada não gosta de games, mas dos seus ela gosta!’”, brinca Schafer, em entrevista por telefone ao Estado. 

Nesta semana, o desenvolvedor vem ao Brasil para falar sobre sua carreira no Geek & Game Rio Festival e, se possível, conhecer jogos brasileiros. “Quero conhecer a indústria e a cultura de vocês”, diz o desenvolvedor, enquanto tenta aprender como pedir uma caipirinha em sua visita ao País. 

Na entrevista, Schafer fala sobre a experiência de fazer jogos hoje e dá dicas a quem quer começar uma carreira como desenvolvedor no setor. “Quando eu era criança, achava que só pessoas incríveis, com equipamentos especiais, podiam fazer jogos. Hoje, quem quer começar um game pode olhar para mim e saber que quem está nessa área é uma pessoa comum.”

O que os brasileiros podem esperar da sua vinda ao Brasil?  Vou fazer uma palestra e darei autógrafos, mas também quero conhecer outros desenvolvedores de games. Cada país tem artistas desenvolvendo jogos diferentes. Quero conhecer a indústria e a cultura de vocês. 

Como você soube que queria desenvolver games?  Desde que meu pai trouxe para casa um Atari 400, nos anos 1970, eu sempre joguei. Estudei Ciências da Computação, mas também gostava de escrever. Não sabia que era possível trabalhar com games sendo um escritor. Achava que tinha de ser programador, até que consegui uma vaga na LucasArts (braço de desenvolvimento de games da LucasFilm, do cineasta George Lucas). Eles precisavam de bons programadores que soubessem escrever diálogos – sem querer, foi algo para o qual eu me preparei a vida inteira.

Como foi trabalhar durante dez anos na LucasArts?  Era incrível: havia pessoas incríveis, todas influenciadas por Star Wars, em uma união nada usual de talentos. Havia muito dinheiro vindo de Star Wars para explorar novas ideias malucas, como foi com The Secret of Monkey Island. É engraçado, mas como não havia internet naquela época, nós conseguíamos focar nossa atenção em nossas próprias maluquices, enquanto tentávamos criar jogos divertidos. 

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Qual é a diferença entre fazer jogos nos anos 1980 e hoje?  Sabemos melhor o que estamos fazendo hoje, então é mais fácil, mas ao mesmo tempo, é muito mais intenso. A internet reduziu a fronteira entre criadores e jogadores, e assim que você anuncia que está fazendo um jogo, há milhões de vozes interferindo nele. É legal porque podemos incluir sugestões dos jogadores, mas também deixa o criador exposto. 

Em 2015, você lançou Broken Age, um jogo feito via financiamento coletivo. Essa fronteira é ainda menor nesse caso, não?  É um processo interessante: conseguimos mostrar para o jogador onde o dinheiro dele foi parar. Fizemos um documentário mostrando como foi fazer esse jogo. Ele mostra que é difícil fazer um game, mas não é tão difícil assim. Quando eu era criança, achava que só pessoas incríveis com equipamentos especiais é que podiam fazer jogos. Hoje, quem quer começar um game pode olhar para mim e saber que quem está nessa área é uma pessoa comum.

O que o você está fazendo agora? Quais são seus projetos atuais? Estamos fazendo Psychonauts 2, uma sequência para o jogo de 2005. Além disso, trabalhamos em uma versão remasterizada de Full Throttle, que vai sair em breve para PC e PlayStation 4, e acabamos de lançar nosso primeiro jogo em realidade virtual, no universo de Psychonauts. 

O que você acha da realidade virtual? Ela pode funcionar para todos os jogos?  Sempre fui um pouco cético quanto a essa tecnologia, mas conseguimos criar algo muito divertido com Psychonauts. Para um adventure, você tem uma série de possibilidades interessantes para explorar cenários dentro da realidade virtual. Não é algo tão complicado de fazer quanto parece, e a realidade virtual te permite uma nova forma de abordar quebras-cabeças, enigmas e desafios dentro do jogo. Acho que há muito a ser explorado por jogos baseados em narrativas dentro da realidade virtual.

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Os ‘adventures’ foram muito populares nos anos 1990 e agora voltaram à moda. Por quê?  O que aconteceu é que muita gente que cresceu nos anos 1990 hoje quer fazer jogos nesse estilo. Durante algum tempo, a indústria preferia não fazer jogos desse gênero porque achavam que não dava tanto retorno financeiro como jogos de tiro ou games para celular. Com o financiamento coletivo, as coisas mudaram: conseguimos medir a demanda que há por um jogo. 

Seus jogos funcionam para apresentar alguém ao mundo dos games?  Acho que sim. Ouço muito isso: “minha namorada não joga games, mas os seus ela adora!”. Acho que faz sentido porque não são jogos que você tem de se preocupar se vai levar um tiro na cabeça ou algo assim (risos). Todas as pessoas gostam de boas histórias e bons personagens, e nós temos isso. É um pouco parecido com o cinema, eu acho. 

Que conselho dá para quem quer fazer seus próprios jogos?  Na escola, você aprende a escrever fazendo redações. O melhor jeito de começar a fazer seus próprios jogos é fazendo: baixe algum sistema de desenvolvimento, assista tutoriais e tente seguir em frente. Não é tão difícil assim.

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Você escreve e também programa. É melhor ser versátil ou se especializar?  Há espaço para todo mundo. Tem gente que desenha bem, tem gente que programa bem, e tem gente que escreve bem, e tem gente que faz tudo isso junto e é capaz de criar um jogo sozinhos, como Prince ou David Bowie. Não há uma regra de ouro se você deve ser generalista ou especialista. Siga o seu coração: descubra se você quer tocar todos os instrumentos todo mundo ou ser o melhor trombonista. 

O que tem jogado ultimamente? Estou me divertindo bastante como Night in the Woods. É um jogo de terror, mas é mais baseado em história do que em sustos. Acabou de sair para o PlayStation 4. 

Para encerrar: se você fosse para uma ilha deserta, quais seriam os cinco jogos que levaria?  Que pergunta difícil! Acho que, para começar, deveria levar um jogo grande de RPG, que nunca consegui acabar. Final Fantasy VII é um bom exemplo. Skies of Arcadia, também... eu posso ter um jogo multiplayer na ilha? 

Acho que eu posso lhe dar esse direito (risos).  Então levarei Gang Beasts, é um jogo multiplayer ridículo e muito engraçado. Ok, tenho que levar Katamari Damacy, e para fechar, Okami. É um jogo grande, daria para me distrair durante muito tempo. 

ServiçoGeek & Game Rio FestivalOnde: Riocentro - Avenida Salvador Allende, 6555. Barra da Tijuca, Rio de Janeiro.Quando: 21 e 22/4, das 10h às 21h. No dia 23/4, das 10h às 20h.Preço: De R$ 55 (diário) a R$ 105 (passaporte para três dias)

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