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‘Zelda: Breath of the Wild’ eleva padrão de qualidade dos games

Esperado há cinco anos, game da Nintendo encerra Wii U e abre o Switch com classe; ao utilizar elementos contemporâneos de outros sucessos, franquia faz um de seus melhores jogos

Por Bruno Capelas
Atualização:
Anunciado para o Wii U em 2012, Breath of the Wild teve um caminho tortuoso de desenvolvimento até ser lançado em março de 2017, para o Wii U e o Nintendo Switch. É o primeiro dos jogos da série que usa "de fato" o rótulo de jogo em mundo aberto. Foto: Nintendo

The Legend of Zelda: Breath of the Wild – o mais recente lançamento de uma das principais franquias da história dos games – demorou tanto tempo para ver a luz do dia que até parecia fadado a se tornar um daqueles jogos-lenda. Anunciado em 2012 para o Wii U e postergado diversas vezes nos anos seguintes, até se tornar um título de lançamento do novo videogame da Nintendo, o Switch, Breath of the Wild teve um caminho tortuoso de desenvolvimento, mas chegou até os consoles. E como raras vezes na indústria dos videogames, valeu a pena esperar. 

Assim como outros jogos clássicos da Nintendo – como Super Mario e Metroid –, este Zelda parte de uma variação do mesmo tema (e aqui se faz uma breve introdução para quem não sabe do que estamos falando): o jogador é o protagonista Link, um jovem herói que deve percorrer o mundo para descobrir poderes. Esses poderes, ao final do jogo, serão usados para salvar o reino de Hyrule (cujo trono é ocupado pela princesa Zelda) da ameaça do temível vilão Ganondorf. Nas últimas três décadas, versões, cenários e aspectos diferentes dessa mesma história foram sendo desfiados em games em 2D e 3D, pontos de vista e jogabilidades diversas. Breath of the Wild, lançado no início de março, é talvez um dos pontos altos dessa trajetória – especialmente por tratar o passado com reverência, mas tomar boas liberdades com os games anteriores. 

Um dos melhores elementos de Zelda: Breath of the Wild são os enigmas propostos pelos shrines (cavernas), usando as habilidades especiais do herói Foto: Nintendo

No novo jogo, Link acorda após um sono de 100 anos – ele adormeceu durante uma batalha contra o vilão Ganon, cuja força está sendo represada pela princesa Zelda. A tarefa do herói, durante o jogo, é recuperar suas memórias, bem como conquistar aliados, para poder ajudar a princesa a derrotar Ganon e trazer, mais uma vez, a paz ao reino de Hyrule. A narrativa, porém, é apenas um dos pretextos para se passar horas e horas na frente do videogame jogando Breath of the Wild. 

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Nas primeiras horas de jogo, é possível perceber o quanto a construção deste Breath of the Wild se inspirou em experiências contemporâneas do mundo dos videogames. O combate contra inimigos, por exemplo, tem uma forte influência da série Dark Souls, do estúdio japonês FromSoftware. Há todo um sistema de coleta de itens da natureza e sobrevivência que permeará o jogo – Link tem de cozinhar ou fabricar suas próprias poções, por exemplo – que parte de alguns jogos modernos de RPG (role playing game). Há ainda, como sempre, cavernas (aqui chamadas de shrines) em que é preciso desvendar enigmas – mas dessa vez, parece que a Nintendo tirou uma nota de jogos como The Witness, game do cerebral Jonathan Blow que consiste em explorar uma ilha cheia de quebras-cabeça. Além disso, pela primeira vez na história dos games de Zelda, há um mundo realmente aberto, cheio de espaços a serem explorados. 

No entanto, o que a Nintendo faz é uma experiência, por assim dizer, antropofágica: depois de alimentar a cultura dos games por muitas décadas, ela engole o que há de bom hoje e regurgita sua própria visão de como um game contemporâneo deve ser. O melhor jeito de se explicar isso aparece pela forma de explorar o mapa. Recentemente, jogos como Assassin’s Creed ou Far Cry, para ficar em dois exemplos, se basearam em revelar o mapa de uma área ao jogador depois que ele subisse a uma determinada torre. De lá, seria possível não só saber os lugares que há por perto, mas também visualizar todas as missões disponíveis. É uma estratégia interessante, mas que revela rapidamente ao jogador uma receita pronta de como se dar bem no jogo. 

Às vezes, o sucesso no jogo depende menos da habilidade do jogador, e mais das armas que ele é capaz de usar ou manter Foto: Nintendo

Em Breath of the Wild, a Nintendo usa o artifício das torres, mas no melhor sinônimo de exploração, revela ao jogador apenas características do relevo e nomes de locais em um mapa. Dessa forma, ela faz um convite para que o cenário seja explorado, demarcado e muito bem conhecido pelo jogador. Mais do que isso, além de seguir as missões e a narrativa principal da história, há todo um game a ser descoberto apenas buscando por shrines e outros itens colecionáveis – e em certo tom de piada, a Nintendo mostra que isso nem sempre é uma grande ideia – ou simplesmente vagando pela natureza em cima de um cavalo. 

Por conta desse aspecto “vasto”, por falta de outra palavra, Breath of the Wild será uma experiência muito única para cada jogador. Mesmo tendo uma narrativa central, cada história será traçada de um jeito diferente – dependendo da afinidade do jogador com uma determinada tarefa no jogo ou da habilidade dele em superar certas áreas e inimigos. É possível passar horas, por exemplo, apenas atrás dos shrines – cujas recompensas, por exemplo, ajudam a aumentar a vida e o vigor (tradução não literal para “stamina”, do inglês) de Link, o que pode lhe beneficiar em uma batalha ou jornada Hyrule adentro. Há quem vá preferir se esmerar na coleta e na arte de criar novas receitas de cozinha, ou liberar todo o mapa antes mesmo de sair em frente nas aventuras. Às vezes, um determinado desafio pedirá que jogador melhore em outras habilidades, amarrando os fios soltos do jogo. Mais do que isso, porém, essa diversidade de Breath of the Wild torna o jogo uma experiência fácil e difícil ao mesmo tempo – por vezes, é fácil morrer e morrer e morrer, até que o jogador recue, aprenda o que precisa ser feito e siga em frente. 

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Gráficos e necessidade de táticas em combates (como simplesmente explodir tudo pelos ares) são dois dos destaques de Breath of the Wild Foto: Nintendo

Esse vasto universo, porém, não seria nada sem vida: no meio de uma grande planície ou desbravando montanhas, é raro achar outro viajante perdido ou inimigos querendo atacar Link. Quando esses encontros acontecem, porém, a jornada exploratória do jogador ganha um pouco mais de sentido e de graça – especialmente por diálogos curiosos, bem construídos e, por vezes, inusitados. A forma como alguns personagens reagem e se referem a Link, por sua vez, ajudam o jogador novato a se dar conta da profundidade da história que está sendo mostrada na tela – de forma que quem nunca jogou um Zelda na vida pode se sentir confortável em desbravar Hyrule pela primeira vez. 

Gráficos e áudio, cada um a seu modo, também ajudam o game a ganhar identidade própria – mesmo no Wii U, versão testada pelo Estado. É fácil gastar horas no jogo apenas se distraindo com a riqueza de detalhes do jogo, seja na construção de paisagens ou até mesmo na forma como inimigos são desenhados. Aliás, é bom que se diga: lançado como o último grande jogo do Wii U, este Breath of the Wild é uma despedida digna a um console de conceito interessante, com jogos que merecem espaço em qualquer coleção que se preze (Mario Kart 8, Splatoon e Super Mario Maker, para ficar em três exemplos) e, infelizmente, insucesso comercial. No entanto, ao sair também para o Switch, Breath of the Wild é uma amostra de que a Nintendo aprendeu com alguns erros do passado – ao se dedicar demais para a família e pouco para o “jogador” clássico – e entregou uma experiência digna de sua história. 

Vale a pena? Muito. Talvez seja cedo para dizer porque é apenas março, mas Zelda: Breath of the Wild é candidato seriíssimo ao título de jogo do ano, especialmente por se destacar em um ano que começou muito bem, com grandes jogos como Resident Evil VII e Horizon Zero Dawn. Ao interpretar características contemporâneas do mundo dos games e reapresentá-las à sua maneira, a Nintendo mostra como os jogos de mundo aberto podem ser instigantes ao entregar menos (e não mais) aos jogadores. 

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Fazer isso com Zelda, uma franquia que já mudou diversas vezes o paradigma de “grande jogo”, é uma amostra da consciência da Nintendo em sua missão no mundo dos games. Ao trazer um jogo dessa magnitude para o Switch, a empresa mostra que entendeu os fracassos dos últimos anos, quando se distanciou do jogador “hardcore”. Mais do que isso, porém, Zelda mostra de novo – como já fez na época de Ocarina of Time e Majora’s Mask, para ficar em dois exemplos simples – o novo “padrão ouro” dos games. Que sigam-lhe os bons. 

The Legend of Zelda: Breath of the WildDesenvolvedora/Publisher: NintendoPlataformas: Wii U e Nintendo SwitchPreço: US$ 60Disponível no Brasil apenas digitalmente, via eShop norte-americana

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