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Brasil: uma das piores legislação de direitos autorais do mundo

Esta é a visão da ONG Consumers International, apresentada durante o Simpósio Internacional de Políticas Públicas para Acervos Digitais

Por Tatiana Mello Dias
Atualização:

A bola havia sido levantada na abertura do evento: os direitos autorais são o grande gargalo em relação aos acervos digitais. Mas foi no segundo dia do Simpósio Internacional de Políticas Públicas para Acervos Digitais que surgiram números, posições e possíveis para fazer da proteção aos direitos do autor um incentivo à criação e não um obstáculo na divulgação de cultura.

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“O acervo digital não pode ter o mesmo tratamento do acervo analógico”, sintetizou Marcos Wachowicz, da UFSC. O problema é conceitual: no meio digital há a cópia perfeita. Não é possível encontrar o original. “Por isso o conceito de cópia deve ser revisto”, explica.

Marcos Wachowicz (Garapa)

Hoje, em tese, só se pode digitalizar e colocar uma obra na web se ela estiver em domínio público ou tiver autorização expressa da família. A atual lei de direitos autorais impede, inclusive, a digitalização para fins de restauração. “A Cinemateca foi impedida de restaurar o filme ‘A hora e a vez de Augusto Matraga’ porque os herdeiros ficaram brigando pela quantia a ser cobrada’”, disse Marcos Souza, do Grupo de Direitos Autorais do Ministério da Cultura.

O Brasil tem a pior lei de direitos autorais do mundo – pelo menos na visão da ONG Consumers International, representada no Simpósio pelo australiano Jeremy Malcolm. “Uma grande proteção intelectual não leva ao desenvolvimento”, disse ele, mostrando um ranking dos países com os melhores índices de proteção ao consumidor. O Brasil está entre os piores. “Os mais bem colocados são os que têm a legislação mais flexível de direitos autorais. Quanto mais longo o período de proteção, pior a posição do país”, explica Malcolm.

“Se levarmos a legislação de direitos autorais ao pé da letra, teremos que fechar o YouTube”, exemplifica Wachowicz. “Toda a população vira contraventora. A legislação brasileira ainda não percebeu o ambiente digital”.

Com a presença de Marcos Souza, o debate deslanchou para a mudança da lei de direitos autorais – é ele quem encabeça o projeto do MinC. Não faltaram críticasà entidades de proteção ao direito autoral. Sem especificar, Souza disse que foi alertado por uma delas que uma biblioteca não poderia emprestar livros porque “isso fere os direitos autorais”. A plateia não conteve o riso.

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“Podemos dizer que, após 1998, 100% dos estudantes universitários no Brasil atuaram na ilegalidade. Se 100% são ilegais, o problema está na lei, não na legalidade”, disse ele.

Ainda não há data para o texto da reforma da lei, mas ele deve ser apresentado em breve. Souza não entrou em detalhes, mas adiantou alguns pontos do projeto que costumam atrapalhar os processos de restauração, digitalização e disponibilização do acervo na rede. Haverá um mecanismo de licença não voluntária em casos de abuso de direitos (quando os herdeiros, por exemplo, dificultam o uso), obras órfãs (aquelas cujos responsáveis não podem ser localizados) e esgotadas.

Na visão da Consumers International, a legislação de direitos autorais deve ter três pilares: permitir o fair use (uso amigável de trechos sem necessidade de autorização nem pagamento, como em samplers), tratamento de obras órfãs e modelos de negócio inovadores. “Quando se distribui materiais de graça é preciso pensar na sobrevivência dos artistas”, disse ele.

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