Furos e gatinhos

Criador do BuzzFeed, Jonah Peretti propõe fazer jornalismo seguindo a lógica do que você vê no Facebook: notícia séria ao lado de fotos engraçadas

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Por Redação Link
Atualização:

David CarrThe New York Times

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Na noite das prévias de Iowa, quando o BuzzFeed deu o furo de que republicano John McCain declarava seu apoio ao pré-candidato à presidência do partido Mitt Romney, mais do que um punhado de leitores coçaram as cabeças e se perguntaram: “O que é BuzzFeed?”.

Eles estão prestes a descobrir. O BuzzFeed é a criação de Jonah Peretti, um pós-graduando do Media Lab do MIT (o laboratório de mídia do Instituto de Tecnologia de Massachusetts) especializado em conteúdo com potencial de se espalhar rapidamente pela rede.

Ele levou essas habilidades ao Huffington Post, onde atuava como o feiticeiro por trás da coxia, preparando uma poção borbulhante de notícias de gosto duvidoso envolvendo celebridades e fotos cômicas de gatos por trás de uma primeira página repleta de notícias e comentários sérios.

Usando um sistema de otimização de busca, ele sabia o que as pessoas estavam procurando quase antes que elas próprias o soubessem. No início, Peretti criou o BuzzFeed como um laboratório, voltando-o menos para o que as pessoas estavam buscando e mais para o que elas estariam inclinadas a compartilhar.

Ele desenvolveu tecnologias que permitiam ao BuzzFeed determinar com muita rapidez o tipo de conteúdo que estava sendo postado e compartilhado – itens contagiosos, o tipo de coisa que acaba na página do Facebook de alguém e, subitamente, na de muitas outras pessoas.

Quando o Huffington Post foi vendido à AOL no ano passado, Peretti saiu de lá e começou a se dedicar ao BuzzFeed em tempo integral. Com sua mistura de curiosidades, “artigo-listas” (artigos em formas de lista) e memes da rede, o BuzzFeed era no começo algo parecido com o Huffington Post sem a pretensão de produzir notícias e comentários. Mas, em dezembro, Peretti contratou Ben Smith, o elogiadíssimo blogueiro e colunista do site Politico, para o cargo de editor-chefe. Pouco depois de começar, em janeiro, Smith deu o furo do apoio declarado por McCain a Romney na primária de New Hampshire.

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A mensagem era clara: o BuzzFeed era um nome importante no jornalismo. (Smith ainda escreve sua coluna semanal no Politico).

Pouco tempo depois, o BuzzFeed captou US$ 15,5 milhões da Lerer Ventures, de Kenneth Lerer, da New Enterprise Associates, da Hearst Interactive Media, do Softbank e da RRE Ventures.

Imediatamente, Smith começou a contratar repórteres, entre eles Matt Buchanan, da Gawker Media; John Herrman, da Popular Mechanics; Rosie Gray, do Village Voice; e Doree Shafrir, da RollingStone.com. O BuzzFeed não estava apenas contratando nomes conhecidos para servir de ornamentos de luxo inspiradores de credibilidade, como fizeram Tina Brown e Arianna Huffington.

 

As contratações no BuzzFeed foram mais como mastros enfeitados: jovens escritores naturais da rede que se tornaram pontos de referência em conteúdo porque se veem banhados no ethos e na prática das mídias sociais.

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Depois de uma semana em que o Facebook anunciou uma oferta pública inicial de ações (IPO) que poderia definir o valor da empresa na casa dos US$ 100 bilhões, ficou claro que o setor social da rede – Facebook, Twitter e afins – vai rivalizar com o setor de buscas – Google, Bing e afins – enquanto força capaz de auxiliar as pessoas a encontrar conteúdo.

O feed social do usuário médio do Facebook é – assim como o BuzzFeed – mistura de furos noticiosos e gatinhos fofos, funcionando como uma espécie de feed de notícias gerado pelo indivíduo que contradiz a arquitetura tradicional das agências de mídia.

Num certo sentido, Peretti está invertendo a fórmula do HuffPo. No Huffington Post, ele usou a otimização de busca para criar um chamativo ambiente divertido por trás da fachada séria de sua página inicial. No BuzzFeed, o ambiente divertido estava no centro da ideia. As abas classificando o conteúdo na página inicial davam o tom do que esperar do site: LOL, Cute, Win, OMG, Geeky, Trashy e WTF?.

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Mas, com a chegada de Smith e seus novos contratados, o BuzzFeed está ganhando força no jornalismo sério por trás de uma aparência boba e inconsequente e acrescentou a aba “2012” como referência à cobertura das eleições. (Categorias mais tradicionais do jornalismo serão introduzidas nos próximos meses.)

De alto a baixo. As coisas vão bem até o momento, e a ComScore indica 10,8 milhões de visitantes únicos em dezembro, mais do que o dobro do número observado no mesmo mês em 2010. Em parte, seu modelo de negócios se vale da mistura de conteúdo de alto e baixo nível. Em vez de vender espaço para anúncios, o BuzzFeed trabalha com empresas como a Pillsbury – de alimentos – para criar conteúdo feito sob medida para o compartilhamento nas redes sociais, como artigos do tipo “Dez coisas que você nunca soube que poderia fazer com croissant recheado”.

Se for bem sucedido, o BuzzFeed vai gerar o tipo de tráfego capaz de rivalizar com gigantes como o próprio Huffington Post. Peretti diz que o BuzzFeed lucra em alguns meses, mas, levando-se em consideração o nível de investimento e crescimento – o escritório no famoso edifício Flatiron, em Nova York, abriga agora 78 pessoas –, é significativa a proporção do novo aporte de capital que foi queimada.

“É divertido acompanhar essas contratações”, disse Choire Sicha, fundador do site The Awl e veterano da indústria nova-iorquina da web. “Mas é importante que não gastem demais. Eles são uma empresa de publicidade na rede e isso não vai mudar.”

No escritório. Peretti diz que não está concorrendo com o Huffington Post e nem pretende fazê-lo, em parte porque isto seria estranho, já que ele e Lerer estão entre os fundadores do HuffPo. Sentado na cafeteria do escritório em Manhattan, ele destacou que não há nada mais viral do que as notícias que ninguém mais tem, de modo que faz sentido criar algum material deste tipo.

Com Smith sentado à mesa, ele disse que o BuzzFeed é uma resposta natural a um ecossistema em transformação. “Depois que o alinhamento do mundo foi dos portais à busca e agora ao social, como fazemos para construir uma empresa de mídia para um mundo social?”, disse ele. “Uma grande parte disso envolve furos jornalísticos, matérias exclusivas e conteúdo original, mas existe também o lado dos gatinhos fofos num contexto cultural de entretenimento.”

Com o amadurecimento dos serviços da web voltados para o consumidor, os leitores se tornaram editores em miniatura, usando as plataformas de mídia social para compartilhar informações que considerem capazes de animar e informar seus amigos. O importante não é mais o chamado conteúdo fixo que mantém os leitores por perto e nem mesmo o conteúdo clicável que os leva a acessar um link; o desafio é oferecer um conteúdo com alto potencial de se espalhar pela rede.

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Ao acertar o tom, os leitores funcionam como abelhas, passeando pelo site à procura de links e voltando para a rede para polinizar outras plataformas. Este comportamento se vale de algo visceral, um tipo de jogo no qual a pessoa que encontra algo delicioso ganha capital social ao compartilhar o achado.

“Lembro-me da primeira vez em que almocei com Jonah, ele falou muito a respeito da web social”, disse Smith. “Saí de lá pensando que ele tinha enchido minha cabeça de jargões, mas, gradualmente, percebi que este é na verdade o ambiente em que estou vivendo.” Antes de ir para o BuzzFeed, Smith era uma força importante no Twitter, contando com cerca de 60 mil seguidores. Ele era conhecido como um repórter que não apenas trazia furos de reportagem para o Twitter, mas também servia como uma espécie de torre retransmissora, oferecendo links para as notícias publicadas por outros.

Agora ele supervisiona um mundo editorial no qual ainda há artigos como “Os meninos mais gatos acompanhados de cães” (não confundir com “30 gatos sentados como humanos”) e “50 coisas que você nunca vai ver na vida real”, que inclui a foto de um chihuahua usando cheeseburgers como sapatos.

Esta estranha numerologia é uma atualização dos antigos truques do mercado editorial. Por alguma razão inexplicada, o acréscimo de um número no começo do nome de uma lista a torna irresistível. Faz décadas que as revistas femininas publicam matérias com títulos como “101 métodos de perder peso” e “18 segredos para conquistar o coração dele”.

Mas estas firulas com os números aparecem agora ao lado de matérias sérias a respeito de execuções hipotecárias fraudulentas. “Estou contratando pessoas que não querem desperdiçar o próprio tempo republicando o trabalho dos outros”, disse ele. “Ninguém vai se importar conosco se nos limitarmos a dar matérias quase tão boas quanto o furo que outra pessoa deu algumas horas atrás.”

Peretti já tinha uma equipe de editores que sabia como criar conteúdo comercializável e readaptá-lo a um novo formato, mas ele queria mais. O jornalismo é o melhor dos aplicativos, e suas vantagens não dependem da otimização voltada para as buscas: a rede aponta imediatamente para o seu site quando você publica um furo de reportagem. É aí que entram Smith e sua equipe de jornalistas versados na linguagem digital.

Assim, Peretti tem agora o conteúdo de alto e de baixo nível, o jornalismo e a diversão – e tudo pronto para ser compartilhado. “As pessoas estão acostumadas a receber tudo isto misturado num feed do Facebook”, disse Peretti. “Uma reportagem a respeito da Primavera Árabe aparece ao lado de uma foto do bebê de sua irmã. Por que não inventar um site cujas publicações reúnam estes dois mundos?”

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