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'Lei de direitos autorais precisa tratar do P2P'

Para Pablo Ortellado, do GPOPAI-USP, proposta de mudança da Lei de Direitos Autorais precisa tratar da troca de arquivos

Por Tatiana Mello Dias
Atualização:

Começou nesta semana a consulta pública que definirá a reforma da Lei de Direitos Autorais (LDA) no País. Pablo Ortellado, professor da USP e coordenador do Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas para o Acesso à Informação (GPOPAI) é ativista pela cultura livre há tempos. Ele diz que a reforma proposta pelo MinC traz avanços importantes, mas a reforma ainda poderia ir além.

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O processo do projeto foi satisfatório? Eu acho que o processo demorou bastante, bem mais do que o previsto. Poderia ter sido concluído há um ano e meio. Agora a reforma está atropelando o calendário eleitoral e esse não é o melhor cenário (para aprová-la). No que diz respeito ao contorno geral do processo, são mudanças super positivas.

Alguns problemas não são fundamentais, mas é  importante que sejam resolvidos, pelo menos nesse processo de consulta. Um deles é o prazo de duração do direito autoral, que vai permanecer 70 anos (pela proposta). Para gente isso é um absurdo. O direito internacional só obriga 50 anos, o que já é um limite alto. Não tem porque permanecer nesse nível. Do ponto de vista jurídico não há dificuldade de mudar isso.

Outro ponto, que aparentemente vão incluir, é a taxa para o xerox. A cópia de livros deveria ser fruto de uma limitação sem cobranças, porque é um setor muito sensível. O acesso aos livros é impossível para os nossos estudantes. E, do jeito como está sendo pensada, a taxa do xerox deve encarecer o orçamento dos estudantes a mais ou menos 60 reais por ano. É desnecessário. O direito internacional também permite uma limitação que os estudantes possam fazer cópias para fins educacionais, não-comericais, livremente. Esses são os dois principais pontos. De resto a reforma é muito positiva. Ela criminaliza o jabá e permite cópias para fins de preservação, permite mudança de formato.

As propostas apresentadas são atuais? A reforma vai adiante no sentido de permitir mudança de formatos, o que é fundamental. É absurdo que eu não possa comprar legitimamente um DVD e copiá-lo. Nesse sentido é um avanço. Agora, ela não trata de uma questão difícil — e perde a oportunidade de tratar dela — que é a legalização do P2P (troca de arquivos na internet). Está na hora de aproveitar essa oportunidade para tentar encaixar um mecanismo que legalize o P2P e tire 70% dos usuários da internet da ilegalidade. Isso não está previsto nesse projeto de lei.

A reforma prevê um ‘fair use’, um uso amigável, para remix. Isso é um avanço? A proposta tem as exceções e limitações sobre os usos livres que você pode fazer. E ela está introduzindo várias possiblidades de uso livre. Você vai poder ter reproduções (de vídeos e músicas) em sala de aula, que é um absurdo que hoje você não possa. Ela prevê uma série de outras circunstâncias que não estavam previstas, como preservação. A Cinemateca tem um filme dos anos 20. Se o dono não é localizado, em tese a Cinemateca tem de deixar o filme estragar. Agora vai haver um sistema para usar obras órfãs, que chegam a ser 70% dos casos. Nunca se sabe se (a obra) já é domínio público, e às vezes é tão arriscado usar que é melhor deixar de lado.

Alguma lei de direitos autorias pode servir como exemplo ideal? O ideal é pegar um pedaço da lei de cada país. Hoje a mais avançada é a da Índia. A própria legislação americana é muito avançada. É um paradoxo porque os EUA têm internamente uma legislação que permite vários usos livres e externamente têm um mecanismo que impõe as piores leis de direito autoral na sua política de comércio exterior por meio dos tratados bilaterais.  A Consumers International listou o Brasil como a sétima pior legislação no que diz respeito ao acesso à educação. Os países asiáticos estão bem colocados, como os EUA, mas eles têm pontos positivos diferentes. A estratégia seria compor os melhores pontos da nossa lei. Eu acho que a nossa nova lei, com as mudanças que vimos, é forte candidata ao primeiro lugar. Resolvendo alguns problemas, e principalmente resolvendo o problema do P2P, o Brasil vai liderar essa discussão no mundo.

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Leia sobre reforma da Lei de Direitos Autorais na reportagem publicada no ‘Link’ de 14/06:Reforma revê direitos autoraisGosta de mp3? Você é um pirata“A nossa lei não merece ser substituída. É boa”“Com mudanças, Brasil vai liderar a discussão”

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