Marco Civil deve ser votado hoje

Relator decide adiar a votação para mudar pontos polêmicos, como a neutralidade e responsabilização dos provedores

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Por Tatiana Mello Dias
Atualização:

Relator decide adiar a votação para mudar pontos polêmicos, como a neutralidade e responsabilização dos provedores

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SÃO PAULO – A Comissão Especial deve começar em instantes a votação do Marco Civil da Internet. O relator, Alessandro Molon (PT-RJ), divulgou na semana passada o relatório final com o projeto de lei regidido em consulta pública. O texto seria analisado pelos membros da Comissão na tarde desta terça-feira, mas a votação foi cancelada ontem. Uma nova versão do texto foi divulgada na manhã desta quarta-feira.

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Alessandro Molon e sua equipe passaram a terça-feira trabalhando em modificações no texto. Ontem circularam rumores de que o governo – especialmente a Anatel e o Ministério das Comunicações – teriam manifestado preocupação em relação a como o Marco define a neutralidade de rede.

Segundo o texto original de Molon, a neutralidade (obrigação dos provedores de não discriminarem nenhum tipo de dado) deve ser total e irrestrita, exceto em casos de restrições técnicas e emergenciais. O Comitê Gestor de Internet no Brasil seria o responsável por regular os casos – e é aí que o governo teria manifestado preocupação.

“O governo fez ponderações sobre as atribuições do CGI. Para o governo, a forma como o texto está pode levantar questionamentos sobre sua constitucionalidade. Estamos estudando uma nova versão”, diz Molon. Segundo ele, a Anatel “participou de audiência pública, assim como vários outros atores”.

O artigo 15, que trata da responsabilização dos provedores, também está sendo revisto. “O texto foi recebido com preocupações”, diz Molon. O Marco Civil isenta os provedores de responsabilização sobre o conteúdo postado pelos usuários. O relator afirma que a nova redação manterá essa base, mas o texto será refinado. Outro ponto que levantou questionamentos, o que afirma que as empresas podem fazer acordos entre si para evitar responsabilização, também será revisto.

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O Marco Civil vem sendo discutido desde 2009. A proposta, feita inicialmente pelo Ministério da Justiça em parceria com a FGV, foi discutida em consulta pública e está desde o ano passado na Câmada dos Deputados. A Comissão Especial criada para discutir o projeto realizou audiências e discussões na web, e o resultado final foi o parecer de Molon divulgado na quarta-feira passada.

Para Ronaldo Lemos, diretor do Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas (FGV), no Rio de Janeiro, o relatório final “chegou a boas soluções para questões controversas”. Lemos diz que o Brasil se antecipa na garantia de direitos na internet, uma discussão que ainda deve tomar corpo no mundo. O Marco Civil foi uma resposta contra leis que poderiam cercear a liberdade online, como o PL 84/99, a “Lei Azeredo”, que previa que provedores deveriam monitorar a navegação dos usuários.

O site TechDirt, por exemplo, elogia e classifica a proposta brasileira como uma lei “anti-ACTA”, referindo-se ao acordo internacional antipirataria bastante criticado por restringir a liberdade na internet, que acabou engavetado pelo parlamento europeu.

Mas o Marco Civil não é unanimidade – e especialistas alertam que, se a proposta não for votada em breve na Comissão, há risco dela sofrer um longo adiamento por conta das eleições deste ano. A expectativa mais otimista é que a lei seja votada na Comissão agora para seguir a plenário antes das eleições, e então ser discutida no Senado ao longo de 2013. Se a primeira votação não acontecer, é impossível saber quanto tempo levará para a lei sair do papel.

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O QUE PODE ATRAPALHAR A VOTAÇÃO DO MARCO CIVIL

Neutralidade de rede. O texto do deputado diz que “a discriminação ou degradação do tráfego respeitará as recomendações do Comitê Gestor da Internet no Brasil”. A Anatel teria discordado deste ponto.

Responsabilidade dos provedores sobre o conteúdo postado pelos usuários. O artigo 15 isenta as empresas de responderem judicialmente pelo conteúdo postado pelos usuários. As empresas só teriam responsabilidade se não removessem conteúdo nocivo após ordem judicial. E poderiam fazer acordos entre si para evitar que os casos entrem na justiça. A proposta tem o “intuito de assegurar a liberdade de expressão e evitar a censura”. O professor de Direito Marcelo Thompson, que dá aulas na Universidade de Hong Kong, diz que o artigo 15 torna os provedores de conteúdo “absurdamente inimputáveis”. “Mesmo que o provedor saiba que armazena tal conteúdo, mesmo que o faça até mesmo por crueldade, não pode ser responsabilizado”, disse ele, em e-mail enviado ao Link.

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Há ainda outro ponto que levantou críticas. O artigo dá a liberdade para as empresas discutirem e fazerem acordos entre si para evitar o caminho judicial. A sugestão, que veio de entidades como a Associação Brasileira de Direitos Reprográficos (que representa a indústria fonográfica brasileira) e o Facebook, pode abrir margem para a suspensão de conteúdos que infringem direitos autorais sem nenhum tipo de controle judicial.

Guarda de dados de navegação. O Marco Civil prevê a guarda de dados de navegação por apenas um ano. O ponto, um dos mais polêmicos no início, opõe defensores da liberdade na rede e entidades preocupadas com a segurança. Se leis mais rígidas prevêem a vigilância sobre os usuários, o Marco Civil flexibiliza a necessidade de se armazenar o rastro de navegação – os provedores deverão armazená-los por apenas um ano. As aplicações de internet poderão armazenar os dados, mas isso não será obrigatório. Para a Fecomercio, isso “representa um perigo para a segurança dos usuários da web e para o efetivo combate à qualquer tipo de crime”.

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