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Opinião|O bom e o mau

Se prevalecer a superação do humano pelo robótico, estaríamos nos condenando?

Atualização:

Está em Zaratustra: “o homem é uma corda estirada entre o animal e o além-do- homem. Uma ponte sobre o abismo”. Incerto é o olhar para a frente e temerário o olhar para trás. A “corda” sobre o abismo busca a transição, mas não pode prescindir do apoio no animal.

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Duas notícias nesta Semana Pascal: um engenheiro chinês fabricou a própria noiva robótica e com ela casou; o dono da Tesla, Elon Musk, um genial inovador, declarou que fabricar um ciborgue é hoje sua prioridade. 

Criar vida da matéria não é tópico novo. A ficção tratou da lenda do Golem, feito de barro por algum rabino e que seguiria estritamente as ordens de quem lhe deu vida. Deve ser a mesma motivação do engenheiro chinês ao projetar a “noiva”, mas os golens do cinema revoltam-se e acabam atacando o criador. Ao projetar a “noiva”, algo pode ter saído errado – errar é humano – e a cibernoiva pode aprontar alguma, se sua programação não estiver perfeita. Os ciborgues não erram: seguem sua programação.

Em artigo do The Guardian, um debate de conceitos entre Musk e Nicolelis, famoso neurocientista brasileiro. Nicolelis vê na automação e na inteligência artificial ferramentas de apoio ao homem. Musk aposta que a inteligência artificial superará a humana: no limite, o ciborgue poderia ser o novo “pensante”, e o humano seu auxiliar mecânico. Se prevalecer a superação do humano pelo robótico, estaríamos nos condenando a desaparecer como espécie? A “corda”, solta do apoio animal, cai no abismo.

Outro perigo é a vaidade: híbris, no sentido grego de orgulho e arrogância desmedidas. Uma falange angélica, capitaneada pelo “portador da luz”, Lúcifer, também tentou alçar-se a grandes alturas, e deu-se mal. Do nosso lado, diz o Gênesis, provamos do fruto da árvore do conhecimento, a árvore do bem e do mal e, a partir de então temos o discernimento (e a respectiva responsabilidade) pelas escolhas que fizermos. 

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Diziam os gregos que “aquele, a quem os deuses querem destruir, passará a avaliar como ‘bom’ o que é mau para si. Perderá seu bom senso”.

Em Nova York foi colocada, diante do touro furioso à porta da bolsa de valores, a estátua de uma menininha corajosa. E há elogios às pencas para a intrépida criança.

Sinceramente não entendo. Entre os animais prevalece o instinto de preservação. Num caso real, o adequado seria que alguém se colocasse à frente da menina protegendo-a do touro, e ela fosse admoestada pelo comportamento insano. Estimular essa “coragem” pode ser apenas falta de bom senso e temeridade quanto à própria preservação. Parece-me um dos desvios de nossos dias.

É Páscoa, época de renascimento. Que o animal-homem, uma espécie biologicamente muito jovem, consiga ainda manter-se e aflorar, mesmo de dentro de um eventual futuro ciborgue. Boa Páscoa! É ENGENHEIRO ELETRICISTA

Opinião por Demi Getschko
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