Políticas para eletrônicos não ajudam indústria local a ser mais competitiva

Há 25 anos, o governo militar lançava a reserva de mercado para a informática, que visava estimular a indústria nacional; leis atuais continuam ineficazes em incentivar exportação

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Por Redação Link
Atualização:
 

Renato Cruz ESPECIAL PARA O ESTADO

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Os eletrônicos no Brasil estão entre os mais caros do mundo, apesar da Lei de Informática e da Lei do Bem, que concedem benefícios tributários à fabricação local. Fatores como impostos indiretos e custos de transporte acabam encarecendo o produto brasileiro e tirando sua competitividade no mercado internacional. A taiwanesa Foxconn fabrica o iPhone e o iPad da Apple em Jundiaí (interior de São Paulo) e na China. Em Jundiaí para o Brasil e na China para o resto do mundo.

A Lei de Informática atual é bem diferente da primeira lei para o setor, promulgada em 1984, que oficializou a reserva de mercado e fechou o Brasil a produtos e capital estrangeiro. Mas existe uma coisa em comum: ser uma lei que tem como base o mercado interno, no lugar de incentivar a exportação.

A reserva de mercado de informática, que durou até o começo da década de 1990, criou alguma inteligência local, mas penalizou consumidores e afastou investimento. A história da Coreia do Sul, que se industrializou depois do Brasil, foi diferente. O país adotou um modelo de industrialização baseado com base na importação de tecnologia, na formação de grandes grupos nacionais e no incentivo à exportação. O modelo brasileiro, por outro lado, teve como base grandes projetos de “substituição de tecnologia” e ênfase no mercado interno.

A Lei de Informática atual usa a demanda brasileira para atrair investimento de fora, mas ainda não conseguiu desatar o nó da competitividade.

A Lei do Bem, sancionada em 2005, isenta do PIS e Cofins os computadores, tablets e smartphones fabricados no Brasil. Recentemente, foi prorrogada até 2018. “Há cinco anos, o produto brasileiro era competitivo, de 10% a 20% mais caro que o importado”, disse o professor Fernando Meirelles, da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo. “Agora, em média, está 50% mais caro, podendo chegar a 100%.”

Segundo Meirelles, os impostos indiretos e o custo Brasil, que inclui itens como logística e insegurança trabalhista e jurídica, acabaram comendo a competitividade do produto brasileiro, trazida pelo corte de impostos. Isso transparece nos dados do setor. Desde 2006, as exportações brasileiras de informática caíram 6,6%, para US$ 385,9 milhões em 2013, enquanto as exportações de telecomunicações despencaram 73%, para US$ 432 milhões.

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Contribuíram para a queda das exportações de telecomunicações as barreiras impostas aos produtos brasileiros pelos países vizinhos. A Argentina, por exemplo, revitalizou a sua zona franca da Terra do Fogo e, ao dificultar a entrada dos eletrônicos do Brasil, fez com que vários fabricantes internacionais de celulares e computadores se instalassem por lá.

Para Humberto Barbato, presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), o produto brasileiro tem competitividade internacional. Mas ele concorda que existem custos característicos do Brasil que elevam os preços ao consumidor. “Precisamos contratar uma segurança ostensiva absurda para o transporte”, exemplificou. “Os carregamentos precisam vir escoltados.”

Mesmo com os incentivos tributários, o eletrônico brasileiro carrega cerca de 14% a 16% de impostos no preço final, incluindo tributos de importação dos componentes, ICMS, PIS e Cofins sobre os insumos. Além disso, as empresas têm o compromisso de aplicar cerca de 4% de seu faturamento em pesquisa e desenvolvimento, como uma das exigências da Lei de Informática. “Essa carga é bem parecida com a que existe em outros países”, disse Barbato.

Para o presidente da Abinee, o Brasil poderia ser uma grande plataforma de exportação de produtos eletrônicos, já que os grandes fabricantes estão instalados aqui. O que emperra essa pretensão, como também afirmou o professor Meirelles, é o custo Brasil. “Aqui são mais caros a energia, a mão de obra, o transporte, os portos e os aeroportos”, afirmou Barbato. Ou seja, a possibilidade de o produto brasileiro brigar pelo mercado internacional depende de mudanças que vão além de uma política setorial.

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Acordos

Existem medidas mais específicas, no entanto, que poderiam melhorar o quadro atual. Uma delas seria a assinatura de acordos internacionais de comércio, para abrir mercados externos aos eletrônicos fabricados aqui. Outra seria o incentivo para a instalação de fabricantes de componentes no País. Os componentes são os itens que mais pesam na balança comercial do setor eletroeletrônico. Desde 2006, sua importação subiu 80%, para US$ 24,6 bilhões no ano passado.

O governo tem apoiado algumas iniciativas, como a instalação da Six Semicondutores em Ribeirão das Neves (MG). Além do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), a fábrica tinha como investidor o grupo EBX, de Eike Batista. Com os problemas enfrentados pelo empresário, a EBX acabou sendo substituída pela argentina Corporación América. A Six Semicondutores deve começar a funcionar no ano que vem.

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Falta ao Brasil uma política clara para o setor de eletrônicos, que traga segurança aos investidores e permita planejamento de longo prazo. A Lei do Bem venceria no fim deste ano, e só teve sua prorrogação para 2018 confirmada em outubro.

A Lei de Informática, que também beneficia as telecomunicações, foi estendida até 2029. “A política de informática dá certo por alguns anos, mas não resolve estruturalmente nada.” Enquanto isso, continuamos a pagar mais caro por computadores, tablets e smartphones.

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