Retrato da Campus Party por um não-geek

Repórter do Jornal da Tarde foi ao evento e conta suas impressões

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Por Fernando Martines
Atualização:

O repórter Felipe Branco Cruz, do Jornal da Tarde, foi à Campus Party na quarta-feira, 28. O jornalista cobriu o evento sob uma ótica diferente que nós do Link (a matéria está aqui):  sua visão é como alguém de fora desse mundo (um não-geek) o entende. Assim,  a partir deste ângulo, ele escreveu para o Link sobre a sua experiência na Campus Party. O relato você lê ai embaixo.

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As três horas que circulei pela Campus Party na manhã de ontem foram suficientes apenas para sentir o clima geek da festa. Não deu para fazer muita coisa. Daí entendi o porque que tanta gente resolve acampar por lá. Ninguém quer perder nenhum minuto de festa. Minuto esse, aliás, aproveitado por downloads super velozes na banda larga de 10gb.

Maciel e seu modding em forma de Kratos    Fotos: Leonardo Soares/AE

Na entrada, uma fila tão grande quanto a capacidade da banda larga. Depois descobri que a demora era porque não bastava credenciar apenas a pessoa, você tinha de credenciar também seu notebook. Sim, porque, lá dentro, sua vida virtual é tão importante quando a real.

Depois de enfrentar a fila, minha primeira providência foi habilitar o Wi-Fi do meu BlackBerry e me sentir mais integrado. Alguns minutos depois, descobri que só era possível se conectar a super banda larga utilizando alguns dos milhares de cabos de redes espalhados pelo chão do galpão. Mas, mesmo assim encontrei várias redes Wi-Fi disponíveis, algumas abertas, outras protegidas por senha, mas nenhuma oficial do evento. Nenhuma dessas redes, aliás, eram estáveis e o alcance era mínimo. Me falaram que o pessoal estava roteando o sinal para aproveitar a conexão dentro do banheiro e dentro das barracas.

A princípio, senti uma certa frieza dos participantes. Todos bem à vontade, usando camisetas, bermudas e chinelos. A frieza porque era difícil encontrar alguém com os olhos para fora das telas de seus notebooks. Todos pareciam muito isolados e, ao mesmo tempo, conectados jogando on-line ou conversando pelo MSN. Mas bastou falar um ‘oi, donde cê é?” para começar um bate-papo que era encerrado com trocas de MSN, twitter e e-mails.

Eventos como esses criam suas micro-celebridades. Na Campus Party deste ano, quem chamava a atenção era Maciel Barreto, de 34 anos, baiano de Itajuípe, cidade de 18 mil habitantes a oito horas de Salvador. Ele posava para fotos com seu computador modificado, em formato do personagem Kratos, do jogo de ação God of War. “Eu conheço mais gente na internet do que a população da minha cidade”, diz. Para fazer o desenho da máquina, Barreto levou três meses e usou fibra de vidro para modelá-la. “Fiz em homenagem a um amigo, fã do jogo”, explica. Para fazer a máquina, ele disse ter gastado em torno de R$8 mil, patrocinados por uma empresa de computação. A configuração não assustava tanto quanto a expressão agressiva de Kratos: um quadcore, com um tera de hd.

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Se fosse feito um censo, 99.9% das pessoas se assumiram nerds. Era o caso dos amigos Rodrigo Tambara, de 19 anos, Mateus Lehmann, de 21, e Bruno Marques, de 19, que vieram de Porto Alegre, de ônibus, após uma viagem de 22 horas, só para a ‘festa’ informatizada. “Nerds sim, com certeza, mas tenho vida social”, pondera Tambara, que é estudante de Ciências da Computação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

A reclamação da turma era uma só: faltava mulher. “É só olhar. A proporção de homem para mulher é muito maior. Além disso, as gatas são todas funcionárias dos stands, dessas que distribuem papeizinhos de propaganda”, diz Tambara. Mas Lehmann lembra que as blogueiras que passam por ali bem que são bonitas. “É difícil achar mulher nerd bonita. Exceções são as blogueiras. Quase todas são bonitas”.

Parece conversa da série americana The Big Bang Theory, exibida pelo canal pago Warner. De fato, eles são fãs da sitcom, que retrata uma turma de nerds que lida com as gostosas do pedaço. “Aproveitei a superbanda larga para baixar a terceira temporada completa”, diz Marques. “Temos um amigo que é igual ao Sheldon. O nerd assexuado”, brinca Tambara.

Dos seis mil acampados, poucos tinham o conforto do blogueiro Rodolfo Castrezana, de 39 anos. Ele foi o primeiro sorteado para dormir em uma barraca de madeira. Promoção de uma empresa, o local foi criado para dar conforto a algum visitante. Tem televisão, frigobar, ventilador e travesseiros com pluma de ganso. A desvantagem é que o sortudo só pode dormir ali por uma noite. No dia seguinte, outro campuseiro, sorteado pelo Twitter, assume o lugar.

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Castrezana e seu “palácio” em meio às barracas

Já estava indo embora quando encontrei com Éder Martins, de 27 anos, baixando músicas e jogando com o colega do lado. Seu monitor era tão grande que parecia uma televisão de LCD (ou melhor, era uma televisão de LCD). A paixão por computadores dele era tanta que ele investiu mais na máquina do que no próprio carro. Seu equipamento era o mais caro da feira, com um valor acima de R$18 mil. “Meu carro, um Apollo, 92, vale três vezes menos. Larguei ele estacionado aí em frente, mas não largo meu computador”, diz Martins. Dentro do CPU, ele conta com seis terabytes de HD, cinco placas de vídeos e uma infinidade de outros apetrechos praticamente capazes de colocar um foguete em órbita.

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