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Jornalista, escritor e palestrante. Escreve às quintas

Opinião|Uma esperança digital

Mas, se em meio à revolta é possível fazê-lo, vale direcionar os olhos para o movimento dos jovens estudantes da Flórida. Ali há uma lufada de esperança

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É: o clima está pesado. Vivemos em um país no qual uma parlamentar é assassinada bem próximo da prefeitura da antiga capital federal. Ou, mais provavelmente, executada por contrariar interesses do crime. Do tráfico ou, talvez, do naco corrupto que existe dentro da polícia. É aquele pedaço da polícia podre que a intervenção federal promete enfrentar, embora não tenha mostrado ainda por onde.

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Mas, se em meio à revolta é possível fazê-lo, vale direcionar os olhos para o movimento, nascido nas redes sociais, dos jovens estudantes da Flórida. 

Ali há uma lufada de esperança.

No dia 14 de fevereiro, um ex-aluno com uma AR-15 semiautomática e várias cargas de munição entrou em um dos prédios baixos da Marjory Stoneman Douglas High School, em Parkland, na Flórida, puxou o alarme de incêndio e, quando seus antigos colegas deixaram as salas, pousou o dedo no gatilho. Atirou por seis minutos. Matou 17, feriu outros 17. 

Massacres são comuns por lá. Ainda assim, o debate está travado. O drama da polarização política pela qual passam EUA, Brasil e meio mundo é que ela trava parlamentos e decisões não são tomadas. Soluções não aparecem. Tudo fica como está, os problemas se agravam.

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Pois, no um mês desde o massacre ao qual sobreviveram, os adolescentes de Parkland já fizeram mais do que todos no passado.

Não — o parlamento não se mexeu. O presidente Donald Trump, errático como de hábito, prometeu mudanças, mas logo amansou. E, no entanto, uma série de grandes empresas começou a virar suas costas para a NRA, a associação que faz lobby pela liberação da venda de armas, que tem muita influência em vários setores da direita. Herz e Avis, que ofereciam descontos a sócios da NRA, suspenderam o benefício. A United Airlines e a gigante de seguros MetLife, idem. A maior varejista física do país, Walmart, anunciou que suspenderá a venda de armas semiautomáticas e, as que sobram, só poderão ser compradas por maiores de 21 anos. Não importa que a lei seja mais complacente. A Dick’s Sporting Goods, outra importante cadeia no negócio, se comprometeu com os mesmos critérios. Tem gente apostando que os políticos, desta vez, terão de ceder ao menos um pouco.

O que faz estes jovens eficazes é que já nasceram no século 21. Em seu mundo, massacres sempre ocorreram. A política sempre foi impossibilitada pelos radicais que veem o outro lado como inimigo. E eles sempre estiveram expostos, para maiores ou menores audiências, nas redes.

Assim, eles mesmos não são radicais. Não partem com a intenção de proibir as armas todas. O contrário: são moderados e pragmáticos. Basta proibir semiautomáticas e ter certeza de que os compradores das outras têm mais de 21, nenhum problema psiquiátrico ou antecedente criminal. E sugerem que a NRA pare de financiar as campanhas de parlamentares. Para que todos tenham certeza de que dinheiro não influencia o voto dos políticos.

Além disso, sua comunicação com o mundo é pelas redes. Uma opinião política num tuíte, no seguinte um meme engraçado de gato. Ligam o live streaming, pode ser uma reunião importante, ou um almoço em que brincam e riem. Adolescentes, ora.

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Na quarta-feira, o movimento disparado pelas redes marcou um mês do massacre promovendo uma caminhada para fora das salas de aula em milhares de escolas americanas. Da última vez que se viu tanto estudante na rua, protestavam contra o Vietnã. Desta vez, não marcharam pelas grandes cidades, só saíram da sala de aula e transmitiram tudo em lives.

Talvez tenha um novo tipo de movimento político chegando. Eficaz por não ser radical ou militante.

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