'Queremos simplificar os experimentos genéticos'

Com passagem pela ‘universidade da Nasa’, brasileiro faz startup para democratizar pesquisa em biotecnologia

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Por Matheus Mans
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Depois de uma temporada na Singularity University, instituição de ensino que fica dentro do campus da Nasa no Vale do Silício, o artista plástico paulista Pedro Terra teve uma ideia incomum. Em vez de continuar a trabalhar com marcenaria, fotografia e ilustrações – algumas de suas maiores paixões – ele decidiu apostar, junto com outros três amigos, em um desafio em um ramo completamente diferente e altamente promissor: a biotecnologia.

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A Arcturus BioCloud, nome dado à startup criada pelos jovens para transformar os experimentos nessa área, está prestes a completar um ano e até agora recebeu pouco mais de US$ 100 mil em investimentos. A missão da empresa, como Terra admite, não é fácil de explicar. “Para os meus amigos falo apenas que trabalho com customização de DNA. É meio complicado mesmo.”

Aos poucos, porém, a ideia começa a se disseminar entre os pesquisadores da área e mais pessoas e empresas começam a apostar no potencial do serviço. A empresa, entretanto, ainda depende de novos investimentos para expandir os negócios. Confira a seguir os principais trechos da entrevista de Terra ao Estado:

Qual a missão da Arcturus? Nós queremos simplificar a forma como experimentos genéticos são feitos. Oferecemos uma espécie de fabricação digital para biologia. Como uma grande parte dos processos ainda é manual, os pesquisadores gastam muito tempo com os experimentos. Queremos digitalizar o mundo biológico para que ele seja mais acessível e para que novas descobertas sejam feitas mais rapidamente. Os nossos serviços reduzem as barreiras para que novos pesquisadores entrem nessa indústria. O custo de montar um laboratório próprio é extremamente alto e isso faz com que apenas um número pequeno de empresas possa inovar em biotecnologia.

Como surgiu a ideia? Um dos meus sócios já tinha interesse em trabalhar com biotecnologia e me chamou para fazer parte do projeto. A ideia era ajudar a automatizar os processos laboratoriais, já que eu tenho experiência com controle de máquinas programáveis por computador. Sempre quisemos construir um GitHub (site que serve como repositório para códigos de software) para biotecnologia. Na Arcturus, se o pesquisador optar por compartilhar o experimento, outras pessoas poderão desenvolver pesquisas a partir daquele código genético. É como acontece no GitHub. É a cultura do compartilhamento.

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Como você explica o que faz para as outras pessoas? O pessoal demora bastante para entender, mas acaba soando mais complexo do que é. Quando um pesquisador quer mudar o código genético de uma bactéria, pode adicionar o gene de um plâncton para saber se ela passa a ser luminescente. Nós fazemos o experimento e depois enviamos o resultado, que aponta se houve luminescência ou se aquele gene em específico falhou. A bactéria funciona como um robô. Ela faz o que lê no código genético e, conforme você muda os genes, a bactéria muda de comportamento. Cada gene é como uma parte da programação de um robô. Nós damos suporte para a pessoa testar o robô e crescer ainda mais esse projeto a partir de experimentos que outras pessoas já fizeram.

Pedro Setúbal/Divulgação

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Por que a computação em nuvem beneficia a Arcturus? A nuvem permite conectar pessoas e estimula a troca de ideias de uma forma que era impossível antes. Estamos conectando pesquisadores a recursos, como laboratórios e equipamentos, que eles talvez não tenham acesso no momento. Além disso, há um fórum onde pesquisadores do mundo inteiro podem discutir projetos de biotecnologia que pretendem realizar. Eles podem até mesmo combinar como dividir os custos dos experimentos na plataforma.

Como vocês garantem a segurança dos dados? Os usuários podem escolher um projeto privado ou público. Se for um projeto público, todas as informações submetidas ficarão disponíveis para qualquer pessoa acessar por meio da internet. Caso o cliente prefira um projeto privado, toda a informação será de acesso exclusivo. Usamos protocolos de segurança já adotados por empresas especializadas em pagamentos eletrônicos ao transmitir informações sobre os pagamentos para garantir a confidencialidade.

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Quanto vocês investiram para criar a Arcturus? Quando ainda estávamos na Singularity University nos deram US$ 2 mil para começar. Depois, nós recebemos um aporte de US$ 100 mil de dois fundos. Mas ainda estamos em busca de dinheiro. Para desenvolver tudo que temos em mente precisamos levantar US$ 1,5 milhão.

Qual a infraestrutura da Arcturus para fazer os experimentos? Atualmente, contamos apenas com o laboratório que é cedido pela aceleradora que apostou na empresa. Esse laboratório é compartilhado com outras pessoas e empresas. Nossa equipe tem apenas quatro pessoas, mas já temos uma sede própria na cidade de San Francisco.

Como a Arcturus ganha dinheiro? O preço dos experimentos varia de acordo com o tamanho do gene e o número de testes que serão realizados. Pode variar de US$ 80 até US$ 5 mil por projeto. Até agora, 400 pessoas diferentes usaram o serviço em mais de 160 países.

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Qual o seu principal desafio à frente da empresa? Levantar dinheiro é o maior deles, mas também temos problemas menores, como a logística, já que usamos alguns serviços terceirizados. Além disso, temos os desafios do dia a dia, como simplificar o processo, deixar o serviço mais intuitivo e ajudar as pessoas a entenderem a plataforma.

Qual a sua visão de futuro para a Arcturus? Quero democratizar o acesso a biotecnologia em todas as frentes, permitindo que pessoas dos mais diversos meios possam entender e participar dessa indústria. Isso vai abrir portas para um mundo de produtos e serviços que ainda é impossível imaginar.

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