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Deu no New York Times

Lançamento precoce

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Por David Pogue
Atualização:

Na coluna que publiquei no New York Times de quinta feira, fiz a resenha de um equipamento chamado Vulkano, que almeja ser ao mesmo tempo um TiVo (grava programas de TV com facilidade) e um Slingbox (permite que os programas sejam transmitidos pela internet e assistidos num iPhone, iPad, iPod Touch, BlackBerry, celular Android, Mac ou PC).

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Como a coluna deixa claro, há muito potencial neste equipamento -- mas nem de longe ele está pronto para ser lançado no mercado.

Este tipo de coisa ocorre algumas vezes ao ano, e sempre fico perplexo diante de casos como este. Lembro-me  especialmente do BlackBerry Storm, lançado às pressas para poder participar da temporada de compras do fim do ano.

A quantidade de defeitos apresentados pelo aparelho era impressionante. Me recordo de estar lendo um e-mail naquele BlackBerry quando subitamente a área do corpo da mensagem foi substituída por uma imagem do que a câmera do telefone estava registrando naquele determinado momento!

A fabricante do BlackBerry, Research in Motion, jurou de pés juntos que não havia nada de errado com o Storm -- mesmo depois de eu registrar os defeitos em pequenos vídeos que enviei aos gerentes de produto da empresa.

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A empresa não ignorava a existência dos defeitos. Todos aqueles que me ajudaram com a resenha do Vulkano, entre eles o gerente do produto e o gerente técnico, admitiram abertamente que o equipamento está cheio de problemas.

Mas, durante nossas conversas, ninguém pareceu estranhar o fato de um produto ser entregue aos analistas da imprensa -- ou às lojas, o que é ainda pior -- nesta condição inacabada.

Como é possível que estas pessoas coloquem produtos no mercado sabendo perfeitamente que não estão prontos para a comercialização?

Tenho algumas teorias a este respeito.

1. A teoria do seja-como-a-Apple. A Apple costuma trazer ao mercado produtos que apresentam problemas e defeitos -- e então, com relativa rapidez, lança atualizações de software que os corrigem. O MobileMe era um desastre quando foi lançado. O mesmo pode ser dito do iMovie '08. O sensor de proximidade do iPhone 4 não funcionava até o lançamento da correção de software da semana passada, o que significava que enquanto a pessoa falava ao telefone, sua bochecha apertava botões aleatórios na tela.

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Mas, por algum motivo, a maioria das pessoas parece disposta a perdoar a Apple. "Bem, eles resolveram o problema -- não é isto o que importa?", dizem.

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Talvez as outras empresas pensem que podem se valer da mesma impunidade. Pegue o dinheiro dos consumidores imediatamente, entregue qualquer coisa a eles, e conserte depois.

2. A teoria da mão esquerda/mão direita. Talvez os responsáveis pelo Vulkano tenham subitamente percebido que não seriam capazes de cumprir o prazo de entrega do produto -- mas, quando se deram conta disto, os departamentos de marketing e relações públicas já tinham dado início à sua operação. Talvez algum executivo tenha concluído que seria constrangedor demais procurar críticos e consumidores para anunciar, "Sabemos que se trata de mais um atraso, mas ainda não estamos totalmente prontos".

3. A teoria do fracasso na Broadway. No início de minha carreira, passei 10 anos trabalhando como diretor de musicais da Broadway. A maioria deles foi um fracasso. (Prefiro pensar que não fracassaram por causa da minha direção.)

Mas o fato é que todos os envolvidos sabiam que tínhamos um desastre nas mãos. Atores, músicos, equipe -- todos sabíamos que teríamos de procurar outro trabalho alguns dias depois da noite de estreia.

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E ainda assim os ensaios e pré-estreias continuavam, nossos ombros suportando o peso do destino inevitável enquanto todos fingiam que estava tudo bem. Então chegava a noite de abertura, as críticas terríveis, e o já esperado cancelamento do restante da temporada.

A situação se transforma numa espécie de apreensão grupal. Ninguém quer apertar o gatilho. Ninguém quer transmitir a mensagem -- especialmente quando são todos pagos.

Talvez seja isto o que ocorre no mundo do mercado de eletrônicos.

Todos têm consciência que o produto será um fracasso, mas a equipe sabe que o melhor é fingir que tudo está bem. Seja como for, sinto-me mal ao apontar todos os defeitos de um produto ambicioso lançado por uma empresa pequena.

Mas convenhamos -- eles me convenceram a receber o produto. Pediram que eu escrevesse uma resenha sobre ele. Na minha opinião, isto faz deles um alvo legítimo de críticas duras.

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Por que as empresas lançam no mercado produtos inacabados, sabendo disto e até reconhecendo a prática?

O mistério continua.

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