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A internet no banco dos réus

Justiça do ES determina que rapaz “desminta relacionamento” na Internet

14/06/2017 | 18h41

  •      

 Por Dennys Antonialli

Por Dennys Antonialli e Beatriz Kira

Especialmente na semana do dia dos namorados, quem está em um relacionamento não faz questão de esconder: na última segunda-feira as redes sociais foram inundadas por fotos de casais pretensamente apaixonados e declarações públicas de amor e cumplicidade, no melhor estilo romântico. Para os solteiros, isso facilita a tarefa de descobrir quem está disponível – quem nunca “fuçou” o perfil do crush para saber se valeria a investida?

Mas na era dos boatos da Internet – ou das chamadas “notícias falsas” – nem mesmo os relacionamentos passam ilesos. Recentemente, chegou à Justiça do Espírito Santo um caso envolvendo um “relacionamento inventado”.  Em maio de 2016, Lázaro Nascentes Dias anunciou para seus amigos o seu relacionamento com Izabela Stelzer, com quem alegava ter mantido relações sexuais. Para dar mais veracidade à história, o rapaz chegou a forjar e compartilhar com seus amigos uma conversa de WhatsApp com a suposta namorada. Os “prints” circularam e chegaram até Izabela, que decidiu registrar uma queixa-crime contra Lázaro por difamação (crime contra a honra, previsto no artigo 139 do Código Penal Brasileiro).

O caso acabou sendo resolvido em uma audiência de conciliação entre as partes, de forma no mínimo curiosa: Lázaro ficou obrigado a publicar uma “retratação” em seus perfis do Facebook e Instagram, desmentindo o fato e pedindo desculpas a todas as pessoas envolvidas – incluindo o namorado real de Izabela. Pelo acordo, as postagens deveriam ser feitas no “modo público”, isto é, de forma que ficassem acessíveis a quaisquer pessoas. No Facebook, a postagem deve ser mantida por tempo indeterminado; no Instagram, deve permanecer por no mínimo 90 dias.

A possibilidade de “desmentir boatos” ou de neutralizar os impactos da veiculação de “notícias falsas” é um desafio que se torna particularmente complexo na Internet: como já comentamos aqui, como garantir, por exemplo, que uma informação publicada como “direito de resposta” vai atingir o mesmo público ou o mesmo número de leitores que a publicação original havia atingido? Como se certificar de que os danos causados por esses tipos de boatos possam ser efetivamente minimizados, sobretudo quando envolvem questões tão delicadas, como as normativas de gênero?

No caso capixaba, essa dificuldade justificou a exigência de manter a retratação como uma postagem “pública”, acessível a todos. Além disso, como a rede de pessoas que teve acesso à “notícia falsa” era provavelmente reduzida (limitava-se ao círculo de amigos dos dois envolvidos), a postagem nas redes sociais utilizadas por Lázaro já seria suficiente. Contudo, essa situação muda de figura quando lidamos com conteúdos viralizados ou amplamente compartilhados, com uma rede de atingidos muito difícil de mapear ou prever.

Ao mesmo tempo em que visa assegurar uma retratação efetiva em relação à mentira que envolveu Izabela, a exigência de postagem no “modo público” por tempo indeterminado no perfil de Lázaro levanta questões sobre a possibilidade de “esquecimento” do caso. Afinal, seria razoável exigir que ele nunca possa se desvincular dessa história, simplesmente apagando a postagem de seu perfil? Não deveria haver um limite de tempo para essa penalidade imposta?

A dificuldade de as pessoas se desvincularem de fatos do seu passado em razão da “super memória” da Internet, cujos mecanismos de busca facilitam o resgate de casos e notícias associados ao seu nome e imagem, é uma das questões centrais do “direito ao esquecimento”. Se, de um lado, há circunstâncias em que parece razoável pensar em mecanismos que possibilitem o “esquecimento” de fatos específicos e associados à vida de uma pessoa, de outro, há enormes riscos para a liberdade de expressão e de acesso à informação que podem derivar de um direito genérico de se “editar a própria história”. No último dia 12 de junho, o tema foi debatido em uma audiência pública no Supremo Tribunal Federal.

Entre a retratação e o esquecimento, o caso do relacionamento inventado por Lázaro aponta para questões complexas envolvendo a circulação de informações na Internet. É verdade que boatos sempre existiram, desde muito antes da Internet. A decisão entre esquecê-los, combatê-los ou escancará-los sempre foi sensível, mas enfrentar a ingrata tarefa de traçar a linha entre o que é verdadeiro e falso na rede também passa por entender as novas dimensões que a memória assume na era digital. Afinal, na Internet, nem sempre mentira tem perna curta.

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Sobre o Blog

Dennys Antonialli, Francisco Brito Cruz e Mariana Giorgetti Valente. São pesquisadores do InternetLab (internetlab.org.br), centro interdisciplinar de pesquisa em direito e tecnologia, em São Paulo.

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