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Felipe Matos

Lei das Fake News: solução ou problema?

20/07/2020 | 19h33

  •      

 Por Felipe Matos

Imagem: Gordon Johnson / Pixabay

Em abril de 2018, aquele longínquo tempo em que as pessoas se aglomeravam e Bolsonaro ainda não era presidente do Brasil, eu escrevi nesse mesmo blog sobre os perigos da disseminação de fake news para o processo eleitoral que se aproximava no país. Disse ainda que grupos de WhatsApp eram onde morava o perigo maior, já que são privados e mais difíceis de se monitorados. Por fim, alertei que as plataformas precisavam agir de forma mais incisiva, com políticas e práticas de controle, se quiséssemos evitar o problema.

Naquela época, pouco foi feito. Mas, dois anos depois, já convivemos com consequências da disseminação deliberada de desinformação, no Brasil e no mundo, seja em temas políticos, como as eleições, ou de saúde pública, na disseminação da pandemia da Covid-19.

Agora, tanto plataformas, como legisladores começaram a se mexer. Tramita no congresso o PL 2.630/2020, a chamada Lei das Fake News, aprovada no Senado e que segue em avaliação pela Câmara dos Deputados. Ao mesmo tempo, o Facebook, controlador também do WhatsApp e do Instagram, realizou recentemente uma ofensiva contra contas que promoviam desinformação, retirando do ar diversas delas, ligadas a movimentos políticos de diversos espectros em todo mundo, inclusive grupos bolsonaristas no Brasil. É um movimento que responde também a pressões de parte da sociedade e de diversos anunciantes, que vêm aderindo a movimentos de boicote à rede social para pressionar por políticas mais duras em relação a discursos de ódio e notícias falsas em suas plataformas.

Mas afinal, a lei é boa então? Em primeiro lugar, precisamos reconhecer que se trata de um problema real, mas extremamente complexo, global e que ainda não foi bem resolvido por legislações em nenhum lugar do mundo. Por isso mesmo, exige ampla discussão e debate com a sociedade, plataforma, ecossistema, juristas e entidades do setor. No Brasil, as legislações recentes que trataram o ecossistema de tecnologia passaram por processos de consulta pública, diversos momentos de diálogo e escrutínio da sociedade civil, como no caso do Marco Civil da Internet, da Lei Geral de Proteção de Dados, e até mesmo do Marco Legal das Startups – esse último, passou por consulta pública, mas ainda não teve o texto do Executivo entregue para o legislativo.

O que estamos vendo, portanto, é um assunto extremamente complexo, sensível e de suma importância, sendo tratado às pressas pelos legisladores, sem o devido debate, comprometendo em muito a qualidade da discussão. Alguns pontos do projeto sugerem coleta adicional de dados dos usuários para eventuais processos que vão além do que permitiria a própria LGPD, o que pode gerar brechas para vazamentos e até uma espécie de “salvo conduto” para plataformas processarem ainda mais informações sobre seus usuários. Até o registro do CPF dos usuários chegou a ser cogitado, o que burocratizaria o acesso, sem necessariamente trazer soluções efetivas para o problema – ou alguém aí acha que criminosos fariam de bom grado o cadastro de seus próprios CPFs ao utilizar a rede para cometer delitos?

Existem ainda pontos delicados, como a própria definição do que é desinformação ou discurso de ódio, quem avalia e decide sobre o que pode ou não ser bloqueado, como e quando. Errar a mão nesse ponto pode abrir brechas complicadas para o próprio exercício da liberdade de expressão, além de coloca nas mãos da plataforma responsabilidades que seriam da justiça, de julgar e bloquear ou permitir certos tipos de conteúdo.

Por fim, o texto ainda entra em termos técnicos para definir o que é uma plataforma de troca de mensagens entre usuários e alguns de seus recursos técnicos, como o encaminhamento de mensagens, bem como recursos que deveriam ser tomados quando uma mensagem é encaminhada. O perigo aqui é basear a lei não em princípios norteadores, mas em funcionalidades técnicas específicas. Assim, pode-se criar uma lei datada, que não irá se adaptar a futuras evoluções tecnológicas e formatos de comunicação que vierem a surgir.

Por um lado, reconheço a importância do tema, a necessidade urgente de discussão e até pontos importantes do PL, como o aumento da transparência ao propor que as plataformas devem informar aos usuários quem é o responsável pelo impulsionamento patrocinado de mensagens ou quando se está conversando com uma conta automatizada – um robô. Entretanto, por mais frustrante que seja levar ainda mais tempo para tratar uma questão tão importante e urgente, não se pode, na pressa, dar força de lei a procedimentos tão sensíveis e polêmicos. A falta de diálogo com a sociedade civil e o atropelo com que o projeto vem sendo tocado me fazem concluir que a Lei das Fake News da forma como está traz mais problemas do que soluções ao tema.

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Sobre o Blog

Empreendedor em série desde os 14 anos, Felipe Matos já apoiou mais de 10 mil startups ao longo de sua carreira. É fundador da aceleradora Startup Farm e diretor executivo do grupo Dínamo, que luta por melhorias em políticas públicas para startups. É conselheiro de diversas startups e de organizações nacionais e internacionais, como a Associação Brasileira de Startups e a rede Startup Nations. Foi diretor do programa Start-Up Brasil, do governo federal, e é cofundador da gestora de venture capital Inseed Investimentos e do Instituto Inovação. Neste blog, Matos vai contar histórias sobre o ecossistema brasileiro de startups.

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