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O preço psicológico do empreendedorismo

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Por Felipe Matos
Atualização:

Imagem: Pixelbay Foto: Estadão

As capas de revistas mostram empreendedores sorridentes e bem-sucedidos, mas a realidade é bem menos glamurosa. Empreender é extremamente difícil e trabalhoso. O início de todo negócio exige dedicação implacável, que toma horas de sono, de lazer e da família, geralmente sem pagamento de salário e sem garantia de sucesso.

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Em minhas andanças acompanhando milhares de empreendedores, já vi muitas amizades e relacionamentos amorosos se quebrarem durante o processo. Além de resiliência - capacidade de lidar com as adversidades e atravessá-las com êxito - os empreendedores precisam de resistência e inteligência emocional para lidar com longas jornadas de trabalho e com todo o custo psicológico que acompanha esse tipo de jornada.

Falo com consciência de causa. Durante anos, sustentei um ritmo de trabalho invejável, construí uma empresa admirada e tirei do papel um programa público de apoio a startups, compensando com trabalho adicional a falta de estrutura adequada. Tudo funcionou muito bem nos primeiros anos, até que começaram os sinais de que algo não ia bem. Nos poucos momentos de descanso, eu comecei a apagar em exaustão. O sono passou a não ser mais reparador e minha produtividade caiu vertiginosamente. Exigente que sou, passei a trabalhar ainda mais para recuperar a produtividade perdida. Estava alimentando uma bomba relógio. E ela explodiu, trazendo consigo episódios de síndrome do pânico, apinéia do sono e uma crise depressiva. E como cereja do bolo, um câncer de pele. Foram dois anos entre as primeiras quedas de produtividade e a decisão de parar. Sinto por alguns colegas e parceiros que conheci nesse período e que nunca chegaram a me conhecer no auge da minha capacidade. Tive vergonha, pois esses só viram 10% do que eu tinha a oferecer e ainda carrego alguma culpa por isso.

Vários tratamentos de saúde depois, sinto-me na obrigação de emitir o alerta. É preciso tomar cuidado com o mito do empreendedor super herói, aquele que dá conta de tudo, que se vangloria por trabalhar 18 horas por dia e virar a noite no batente. Eu já fui assim e também já vi muito empreendedor se orgulhando publicamente desse tipo de jornada. Vejo alguns até mesmo buscando formas de ampliar seu tempo produtivo com estimulantes.E pior: cobrando de sua equipe o mesmo nível de dedicação. É inegável que certas situações vão exigir uma dedicação extra, principalmente no começo. Empreender exige hard work, mas permanecer nesse ritmo de forma indeterminada não é sustentável. No longo prazo, não há super-homem ou mulher maravilha que resista e a conta chega não só para a saúde mental, como para a física também.

Se por um lado, é impossível fugir de momentos de dedicação extra, por outro, deve-se manter espaços de compensação e descanso e se evitar a supervalorização dessas longas jornadas como algo cool ou desejável. É importante que empreendedores reflitam sobre seus hábitos e busquem construir uma cultura de jornada de trabalho saudável para si e para seus colaboradores. Só assim serão capazes de manter uma boa performance para si e sua empresa, não só momentaneamente, mas também no médio e longo prazos.

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