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Como a tecnologia está mudando a cultura

Mombojó: "é bom saber que somos auto-suficientes"

Confira a íntegra da entrevista com o Mombojó, que recomeça um novo ciclo de sua carreira com o novo disco

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Por Tatiana Mello Dias
Atualização:
(JOSE PATRICIO/AE) Foto: Estadão

Eles estão aproveitando a Copa, mas deixaram de ver o final da partida entre Itália e Paraguai (que terminou empatada) para recaber a reportagem em casa. Parte da banda vive em uma casa grande no bairro da Pompéia, em São Paulo. Na sala, uma mesa de sinuca; no porão, um estúdio onde acontecem os ensaios (embora os vizinhos reclamem).

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O Mombojó recomeça um novo ciclo de sua carreira com o novo disco, Amigo do Tempo, que está para download no site. Aqui vai a íntegra do papo com eles que aconteceu na semana passada:

Como está sendo a recepção ao disco?Marcelo - a gente teve 12 mil visitas no site. E acho que estamos nos 15 mil downloads. É uma divulgação muito boa para um disco que tem uma semana. E no Twitter o pessoal está comentando muito, tem muita gente ouvindo e ouvindo o disco todo, porque comentam as diversar músicas do disco. Uns falam mal, mas estão ouvindo.

Chiquinho: eu acho que o retorno dessa vez foi bem mais rápido. No primeiro disco, os sites de relacionamentos não funcionavam tão bem. A gente tinha internet discada naquela época. Não tinha como saber, não tinha um retorno tão direto.

Marcelo: e a gente conta com os seguidores dos nossos seguidores. A gente posta uma coisa, aí alguém que tem 10 mil seguidores retuíta, e vai à potência de sei lá quanto.

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Tem um lado ruim nesse contato direto?Marcelo: eu confesso que estava bem agoniado com a história de lançar. Um cara falou uma coisa ruim lá e eu fiquei meio desestabilizado, 'não vai dar certo'.

Chiquinho: normal, faz parte. A gente não se guia muito por isso, não.

Antes você dependia dos críticos. E hoje todo mundo é um pouco crítico, né?

Chiquinho : não é porque alguem elogiar esse disco que a gente vai manter uma fórmula para o sucesso. Não é por aí. É muito bom ouvir pessoas falando bem, aprovando a convicção que você tem, é satifatório. Um elogio já cobre dez críticas para gente.

Vocês começaram de maneira totalmente independente e vocês voltaram para a independência agora. Porque?

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CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

Felipe: é alternância de poder, é saudável. Em Recife mesmo é o terceiro ano de PT, de gestão, e já não está tão legal como era antes. A gente viu como é ser independente, depois vimos como é uma gravadora, agora vê depois, é legal voltar e ter esse frescor, aprender com dois lados pra se valorizar, e quem sabe voltar pra uma gravadora de forma melhor.

O que vocês aprenderam com essas mudanças? Marcelo: Hoje nós estamos em uma configuração que está muito boa de trabalhar. Os cinco da banda todos os dias pensando nas coisas. Temos uma equipe extramúsica muito boa, todos são amigos, e a gente vem cultivando isso ocm o tempo. Faz uma citação mesmo ao tempo, mas tem muita gente legal ao redor da gente que cultivamos ao longo do tempo. E os cinco estão bem cientes do que é trabalhar com música hoje em dia. Temos a noção de que fazer o disco não é fácil, do dia para noite. É um desprendimento pesado. E a nossa união está muito forte.

 Foto: Estadão

A banda no estúdio do porão (JOSE PATRICIO/AE)

Por que quatro anos sem disco novo?

Vicente: foi uma série de coisas. A morte de Rafa. Foi tipo... aquele tapa.

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Marcelo: a gente estava se preparando...

Chiquinho: ...para gravar o próximo disco.

Vicente: a gente estava se preparando... Não pensou em parar. Mas pensou em dar uma respirada. Desmarcamos o que tínhamos marcado.

Marcelo: em vez de juntar forças para gravar um disco, tivemos que juntar forças para voltar a tocar.

Vicente: começamos a tocar o que a gente tocava antes nesse novo formato. Saiu o Marcelo (Campello) também. E fomos atrás de projetos para patrocinar. Isso foi há um ano e meio. Terminou que não rolou esse projeto, fomos fazer independente, tudo ficou muito na nossa mão.

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Chiquinho: todos são muito flexíveis. Quando você não tem o dinheiro pra fazer...

Vicente: chegou um momento que ficou 'velho, tem que lançar logo' (risos).

Rolou uma pressão financeira?

Marcelo: deu uma reduzida nos shows. A gente já tinha feito nas capitais. E sei lá, você vai meio que perdendo forças.

Vicente: e tem meio que uma dívida com o público também, que está esperando. Tem uma coisa meio 'ôxe, mas o Mombojó existe ainda?'.

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Chiquinho: tem aquela coisa em torno do disco, o ciclo do disco. Você lança o disco, se fala muito, aí você corre o país para lançar o disco, divulgar, até a hora que você grava outro. A gente estava no final do outro ciclo.

Marcelo: a gente deu um respiro depois que Rafa faleceu e Marcelo saiu, no fim de 2008. A gente lançou duas músicas do disco pela MTV, o projeto Sintonizando Recife. Isso ainda deu um arzinho. Fizemos alguns shows nesse projeto. Mas aí foi acabando o fôlego. Agora em junho a gente retoma as atividades. Zerou.

O "Amigo do tempo" é uma resposta a esse tempo?

Vicente: é o nome de uma música que acabou encaixando com vários sentidos. Depois de ser feita. É uma letra que faz muito sentido para a vida de qualquer um, ainda mais para gente que passou pelo que passou.

Como é o processo de composição de vocês?

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Felipe: tem mudado para caramba. Na verdade, cada disco é diferente. No primeiro disco, a banda surgiu em cima de algumas músicas. As primeiras músicas deram a cara da banda, e em cima disso fomos criando um repertório. Testamos muito músicas ao vivo, passamos anos para gravar o disco. No segundo, a gente já passou pouco tempo no estúdio. Não teve muito tempo para trabalhar o repertório com o produtor. E nesse nós tivemos de novo um tempo maior. Mas também rolou de diversificar. Teve um dia que os meninos de juntaram sem mim, fizeram várias bases, depois eu ouvi e escrevi uma letra. É legal testar novos formatos. Sempre que tem uma ideia nova é bacana testar e ver o que isso vai gerar.

Marcelo: isso vem mudando um pouco, né. Porque a partir do momento em que você tem uma placa legal em casa e um computador você não precisa chegar pro pessoal 'ó o que eu fiz'. Por internet mesmo você manda.

Chiquinho: esse disco foi o primeiro que teve uma música feita meio remotamente. "Antomonotonia" tinha um riff.. (canta) Tatananana... Tinha um riff de cordas e nós fizemos a música baseados nisso.

Vocês conseguiram patrocínio do governo de novo?

Vicente: não. Inscrevemos alguns projetos e nenhum foi aprovado. Nenhum edital.

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Marcelo: o primeiro foi pela prefeitura do Recife. E dessa vez as pessoas falavam 'é só vocês se inscreverem, não é possível'. A gente se inscreveu em todos e não rolou nenhum.

Vicente: mas no final das contas foi legal. Acabamos desenvolvendo uma teoria na cabeça, porque a gente conseguiu fazer com a ajuda de amigos. Não paramos de fazer shows, e patrocinamos o disco com isso. É até um novo formato que surgiu naturalmente. A gente aprendeu bastante.

O que você precisa, no mínimo, para gravar um disco legal dessa maneira?

Felipe: não tem um mínimo. Depende do que você quer. Se você tiver um computador, uma placa de áudio legal para gravar, poucos microfones, tenta esgotar o máximo que isso render e depois junta a grana e vai para o estúdio para finalizar.

Marcelo: se você tiver uma sala legal que der para você microfonar e tirar som disso, melhor ainda, né?

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Felipe: Pode morar em apartamento, chamar uns amigos. Não precisa fazer uma coisa específica. Tem que ter um cara bom no estúdio, isso conta.

E a divulgação? Tem alguma fórmula?

Marcelo: isso é um eterno estudo. Eu fico mais responsável pela divulgação. Eu não sei o que é mais efetivo. Mas o que a gente está fazendo, que é deixar a coisa bem fácil, no nosso site a capa inical é o disco, já é um grande passo.

Chiquinho: falam que as pessoas gostam do Mombojó porque a gente coloca as músicas na internet. Não é tão simples assim. A gente aposta muito nessa história de estreitar relações com nosso publico. E tenta se esforçar ao máximo para que o público seja fiel. Isso é o mais difícil. Uma banda na internet estourar, isso não é difícil. Mas isso das pessoas quererm saber o que o Mombojó está fazendo é o mais difícil.

Marcelo: o que eu acho legal é sempre manter contato com quem ouve você. Todo ouvinte é um divuglador em potencial. Cada vez mais no Twitter você tem mais seguidores, e essa é uma ferramenta que cresce por si própria. A gente pergunta o que pode melhorar no site. Estamos tentando implementar agenda, loja virutal.

E cadê o blog?

Marcelo: nesse momento tá fechado, em construção. A ideia é voltar com um blog com uma lojinha, com o disco. Porque nós não temos o disco ainda, tá na fábrica.

Felipe: a gente achou melhor dar um tempo para as pessoas ouvirem o disco.

Marcelo: É o que a gente quer fazer esse momento.

(JOSE PATRICIO/AE) Foto: Estadão

Tem gente que fica discutindo se põe ou não a música na internet, que é uma coisa que já vem com vocês desde que a banda nasceu...

Chiquinho: às vezes eu pergunto 'mas isso ainda é pauta'? É bom, né, porque a gente acaba aparecendo. E, sim, isso ainda é pauta. Só alimenta mais ainda a vontade de ter uma coisa ilegal. Se um disco vazou e eu baixei, eu falo 'meu irmão, tem uma coisa aqui que só eu tenho'...

Que é a tal da cultura do 'vazou', né?

Marcelo: tem a tal da discussão de estar 'vazando' coisas por querer, porque o vazamento torna a história mais divulgada. "O disco de não sei quem vazou...", e baixa só por isso.

Vocês não tentaram fazer um 'vazou' do disco de vocês, não? (risos)

Felipe: (risos) fizemos o oficial, né?

Chiquinho: vazou mesmo porque a gente já tocava as músicas ao vivo, e o pessoal já conhece algumas músicas.

Vocês estão acompanhando a história da mudança da lei de direitos autorais?

Marcelo: a mudança, não.

Felipe: a gente já acompanhou um pouco mais, com o Ronaldo Lemos.

Chiquinho: de vez em quando a gente se encontra com o Ronaldo Lemos, que é um amigo da gente. E a gente está na licença Creative Commons desde sempre. Eu acho bom a gente até deixar na página inicial que é Creative Commons, né?

Marcelo: o disco não tá ainda, mas não é porque não está, é porque não deu tempo. É mais um trabalho (risos).

Como que vocês conheceram as licenças Creative Commons?

Marcelo: foi por (HD) Mabuse. Sabe quem é o Mabuse? Ele apresntou. A gente achou legal a ideia de uma pessoa mexer legamente na sua música.

Quando vocês adotaram, ninguém falava muito disso...

Vicente: mas foi bem natural. A gente não botou ainda por esquecimento, porque a gente já encara assim. É natural.

Felipe: é a mesma coisa que a gente faz hoje em dia, que é ter a postura mais simples para gerar o máximo. Tinha um grupo que até fazia ações musicais, o Re:combo. Era um coletivo de música livre. A gente estava próximo e tentou tirar coisas legais disso para o nosso trabalho.

Chiquinho: tem aquela visão de que todo mundo tem que liberar tudo. Eu acho que não é assim. Eu respeito os artistas que têm na cabeça 'toquei meu violão assim, quero que as pessoas escutem ele desse jeito'. Eu respeito isso, mas o Mombojó não tem essa postura. É muito dessa história da generosidade intelectual, de espalhar e ver nossa obra snedo reciclada.

Marcelo: o bom da licença é isso, você pode escolher a sua. O copyright não. Você pegar um sampler de uma coisa ali... tem toda uma discussão em cima disso. A gente sempre trabalhou muito com sampler.

Vicente: a gente curte essa onda de usar sampler. Acho musicalmente bacana.

Felipe: cada vez mais a gente está gerando o nosso próprio sampler. Mas também não é uma ideologia.

Marcelo: a gente chegou a disponibilizar uma faixa aberta no nosso site. Mas por falta de epsaço no provedor, por causa dessas coisas internéticas, a gente deixou de fazer. É uma coisa a se pensar.

Chiquinho: Hoje em dia as coisas estão muito mais na mão da gente.

Nesse intervalo vocês chegaram a procurar uma gravadora?

Felipe: a nossa empresária correu atrás, mas foram coisas que não interessavam à gente. Distribuição. Ficamos vendo os editais, e pensávamos 'será que algúem tem que vai aceitar a nossa mentalidade?'

Porque você acha que não?

Felipe: porque as gravadoras... Acho que a gravadora que mais se aproxima com esse tipo de coisa é a Trama. Só que com a Trama a gente já foi.

Hoje em dia não existe mais o fetiche da gravadora...

(todos) Tem, tem.

Felipe: eu acho que tem gente que vive nesse mundo da lua ainda. Se o objetivo é vender milhões de discos, esse objetivo não existe mais. Já é um bom motivo para as gravadoras mudarem de alguma forma.

Vicente: elas teriam que vender realmente muito barato se quiserem atingir as metas de venda.

Felipe: tem que liberar o disco na internet uma semana antes. Aí perguntam 'mas porque você não libera o disco uma semana depois para vender um pouco mais?". Ou seja, é o mundo da lua.

Vicente: e é aquela velha história. Ganhar dinheiro com disco não é tão fácil.

Chiquinho: antigamente pra gravar um disco a gravadora dava um adiantamento. Isso não existe mais.

A parte do trabalho da gravadora vocês mesmos conseguem fazer?

Marcelo: na realidade hoje a gente é a nossa própria gravadora. Concebeu o disco com o maior interesse de tirar o prejuízo é da gente que botou do bolso, né? Fizemos do jeito que achamos que vai girar mais. Estamos pensando muito na área de merchandising.

Qual é o lado ruim da independência?

Marcelo: tem que ter um suporte, eu acho. Duas coisas que fogem muito da concepção da história. Tipo, fechar show. Acho que é uma coisa ruim. Para gente que não sabe lidar tanto. Assessoria de imprensa...

Chiquinho: isso é verdade. A gente não sabe lidar diretamente com vocês (aponta para a repórter). em>(risos)

Felipe: acho que tem um monte de lado bom, e mesmo com eles uma gravadora ainda pode dar uma estrutura melhor para a banda. Hoje em dia ainda pode. Mas, para a gente, é bom saber que somos auto-suficientes. Se não houver uma melhora, já estamos bem com o que a gente tem.

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