PUBLICIDADE

Foto do(a) blog

Quem joga, sabe

Never Alone registra cultura ameríndia com beleza em game

Por Murilo Roncolato

Por Murilo Roncolato
Atualização:
 

Never Alone é o game da estreante Upper One Games que chega para Xbox One, PS4 e Steam e deve conquistar não só gamers, mas todo e qualquer pessoa interessada em aprender sobre uma cultura diferente da sua. E Never Alone executa essa tarefa de forma exemplar.

PUBLICIDADE

O game é um plataforma com elementos de puzzle que exigem do jogador tarefas não mais complexos que pular, pendurar-se e acertar objetos com uma arma simples. Jogando, percebe-se que a simplicidade pode ter sido até proposital. O foco aqui é a mensagem.

Never Alone é um jogo sobre compartilhamento e cooperação, narrado por um membro dos Inupiat, povo ameríndio nativo da região ocidental do Alasca. O jogo segue a trajetória da garota Nuna, que sai em busca da origem das tempestades de neve e, no caminho, passa a contar com a ajuda de uma pequena raposa branca (mais especificamente uma raposa-do-ártico), que permite que a menina se conecte com espíritos da natureza, que a ajudaram em sua jornada.

A história em si é uma metalinguagem. Trata-se de uma narrativa que ensina sobre como a prática de contar histórias é um elemento fundamental na cultura Inupiat. Ao longo do jogo, percebemos que a história visa passar a visão do povo nativo sobre como o mundo funciona.

Para isso, e aí entra o elemento mais brilhante de Never Alone, a desenvolvedora contou com a participação de atuais membros do povo Inupiat que compartilham, na forma de 24 mini-documentários, suas visões de mundo, práticas cotidianas e eventos que ouviram do passado.

Publicidade

Os pequenos vídeos, inicialmente bloqueados, vão se tornando disponíveis ao jogador conforme seu avanço no game. Assistir aos relatos reais no início me pareceu um elemento paralelo e opcional. De alguma maneira, desbloquear novos vídeos se tornou uma obsessão e o objetivo último do jogo, de fato.

O bonito é ver que tudo o que surge no jogo não é aleatório. O documentário vai justificando cada novo elemento. Nuna veste uma roupa de pele pesada, logo você entende que as roupas são de rena (caribu), e eram consideradas "as melhores" pelos Inupiat.

Ao encontrar o que eles chamam de homem-coruja, ele pede à menina que encontre seu tambor perdido. Logo, eu aprendia sobre a importância do tambor na sua cultura e como o instrumento faz parte até hoje de rituais daquele grupo.

 

O mesmo homem-coruja entrega à garota uma ferramenta chamada bola (conhecida por nós como boleadoras), utilizada pele povo do Alasca para caçar aves, e que será usada por Nuna para quebrar blocos de gelo, atingir objetos voadores ou provocar o urso polar que a perseguirá durante o trajeto.

 
 

Muitas vezes, a história faz uso de uma espécie de história em quadrinhos, bem semelhante ao cordel brasileiro. Logo, são apresentados os métodos usados pelos antepassados daquele povo para registrar as histórias contadas de geração para geração sobre o que acontecia em seu cotidiano gelado. No fim das contas, é uma questão de preservação da memória.

Publicidade

 

Jogabilidade

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

Apesar da linda estética criada para o jogo, que trabalha inclusive com uma tela com bordas desfocadas e escurecidas, como se retratasse ali um conto oriundo da imaginação de alguém, as mecânicas do jogo deixam um pouco a desejar.

O título ("nunca só", em português) se reflete na sua jogabilidade. Apesar de ser possível jogar sozinho, o ideal é que o jogador opte por um mecanismo cooperativo, no qual um player opera Nuna enquanto o outro controla a raposa. Caso contrário, um único jogador terá que ir variando o personagem ao longo do jogo permitindo que o outro seja controlado por inteligência artificial. E aí começam os problemas.

Never Alone é um puzzle que envolve principalmente saltos precisos. Um erro e o personagem cai no infinito, é devorado, amassado, ou acaba congelado no mar. Importante notar que quando um dos jogadores morre, o jogo reinicia do último ponto salvo. Permitir que um controle tão sensível seja feito por um computador, resulta em frustração.

Child of Light, da Ubisoft, me veio muito à cabeça enquanto jogava Never Alone. Seu desenvolvimento por meio da narrativa (embora fantástica neste caso) é bem semelhante, mas o modo cooperativo funciona bem melhor neste caso do que no da menina Iñupiat.

Publicidade

Mas nada grave. Avaliar mal Never Alone por esse fator é preciosismo e indica má percepção do que realmente importa neste caso.

Soma

Ao concluir a saga, a sensação é justamente a de que aprendemos algo novo. Além de ser um jogo divertido e, por vezes, tenso, o que fica é o envolvimento com uma cultura de forma bem mais profunda do que se apenas tivéssemos assistido ao documentário. A união da produção audiovisual com a mecânico do jogo promove um outro nível de comunicação.

É bom pontuar que esse entrosamento já esteve presente em outros jogos não descaradamente educativos como Where in the World is Carmen San Diego? (duvido que boa parte do seu conhecimento geográfico não se deve a esta peça clássica), Oregon Trail (sobre a marcha para o oeste americano) (ambos citados pela Polygon) e Valiant Hearts (sobre a Primeira Guerra Mundial). Mas Never Alone consegue passar o seu recado de forma tão sutil, cativante e respeitosa - como ao incluir a tradução de "never alone" para Iñupiat no título (Kisima In?itchu?a) - que o faz merecer destaque.

Never Alone (Kisima In?itchu?a)Desenvolvedora: Upper One GamesPublisher: E-Line MediaPreço: até R$ 29,00Plataformas: PC, PS4 e Xbox One.Já disponível: No Brasil

Publicidade

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.