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Inovação e tecnologia no mundo das startups

Inconsistências e problemas com aceleradoras fazem 20% deixar o Start-Up Brasil

Conversei ontem à tarde com Rafael Moreira, diretor de Políticas de Tecnologias da Informação e Comunicação do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e um dos organizadores do programa Start-Up Brasil, do governo federal, sobre a divulgação das doze novas aceleradoras que vão participar do programa este ano (não conhece o Start-Up Brasil? Veja o que o Link já publicou sobre o assunto e o infográfico abaixo).

Por Ligia Aguilhar
Atualização:
 Foto: Estadão

Falamos sobre os critérios de seleção neste último edital, que parece ter solucionado problemas do anterior, como a concentração geográfica das aceleradoras no sudeste e a escolha de aceleradoras iniciantes que não tinham estrutura pronta.E foi inevitável tocar em um ponto delicado que já foi discutido neste blog e que tem sido uma das maiores queixas dos empreendedores nos últimos tempos: a dificuldade das startups selecionadas para fechar acordo com as aceleradoras.

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Infelizmente, a maioria das startups que passa pelo problema conversa comigo em off por temer enfrentar problemas caso o nome da empresa seja divulgado. Mas as discussões nos fóruns de startups confirmam o que tenho escutado nos bastidores: muitas aceleradoras exigem participações muito altas no negócio (o teto do Start-Up Brasil é 20%, valor considerado alto no mercado para investimentos na faixa oferecida pelas aceleradoras do programa, entre R$ 15 mil e R$ 100 mil) e colocam os empreendedores em uma situação desvantajosa. "Pedir 15%, 20%, 30% de uma startup por 'survivor money' é não só uma ofensa aos empreendedores, como um dos grandes motivos que impedem nossas startups de inovar", diz Alan Meira, da Engarte, startup selecionada na segunda rodada do programa, em um texto publicado na internet. Meira ainda está em negociação com as aceleradoras.

Outro empreendedor me contou que algumas aceleradoras sequer responderam aos e-mails que ele enviou pedindo informações, enquanto outras retornaram colocando condições consideradas por ele pouco vantajosas para sua empresa. A saída para quem não aceita as condições é desistir do programa e, com isso, ficar sem a outra parte oferecida pelo governo, os R$ 200 mil em bolsas Cnpq.

Moreira reconheceu o problema e disse que o que eles chamam de taxa de quebra do Start-Up Brasil, ou seja, o número de empresas que deixam o programa, está mais alta do que o previsto. Hoje, cerca de 20% das selecionadas não participam do programa, enquanto o estimado inicialmente era um máximo de 10%.Há outros fatores que também implicam nas desistências, como iniciativa própria da startup após a aprovação em outros programas de incentivo e até mesmo inconsistência entre o modelo de negócio declarado na inscrição e o que realmente é adotado pela startup, o que gera desinteresse por parte das aceleradoras. Moreira falou que a organização está tentando mitigar esse tipo de problema. E que em breve vai divulgar um raio-x mostrando sucessos e fracassos do programa, já que há também casos de empresas que foram premiadas internacionalmente, por exemplo. Confira a entrevista na íntegra abaixo:

Como foi a seleção das aceleradoras nessa nova etapa?Foi muito interessante porque tinha muita gente do mercado e de fundos de investimento na banca avaliadora. O que tentamos olhar dessa vez foi a equipe de cada aceleradora, a estrutura, se elas tinham equipes experientes e de qualidade. Olhamos com muito cuidado a rede de relacionamentos, quem eram as pessoas, com quem elas estavam conectadas, quais os parceiros estratégicos. Tentamos ver a disposição das aceleradoras para fazer aportes individuais, tínhamos medo que elas quisessem fazer crowding out (redução no investimento quando o estado aumenta a despesa pública), deixassem de investir para que o governo fizesse isso. Nós queremos que elas invistam e acreditem nos projetos. Algumas têm contatos internacionais, avaliamos com cautela se elas tinha construído networking com aceleradoras internacionais para fazer aceleração cruzada, porque isso também é importante, especialmente para quem lida com hardware. Nos Estados Unidos é comum as aceleradoras enviarem o empreendedor para a China para entender a cadeia de fornecimento, então, esse tipo de cooperação internacional foi muito avaliada. E, obviamente, avaliamos o posicionamento com ecossistema digital, como a aceleradora está posicionada no mercado, se tem histórico de aceleração, quem são os executivos que tocam a aceleradora no dia a dia... todo esse conjunto de dados resultaram em notas individuais para cada uma.Foi interessante porque tivemos maior dispersão geográfica. Também aumentamos o número de aceleradoras de nove para doze porque vimos que às vezes tinham dez startups por aceleradora e isso causava problemas de atendimento e também de fôlego de investimento.

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O valor do investimento oferecido por cada uma e a fatia de participação societária exigida serão divulgadas?Isso vai será obrigatoriamente divulgado antes do lançamento do edital de startups, porque é um dado valioso para os empreendedores fazerem a autorregulação do programa e evitar conflitos.Nas propostas enviadas, as aceleradoras foram avaliadas positivamente ou negativamente de acordo com a participação exigida. Para a gente é importante que exista um alinhamento do empreendedor com a visão de negócio que a aceleradora tem, mas também não podemos dar poder demais para ela e deixar a relação desbalanceada.

Muitos empreendedores estão se queixando que as aceleradoras exigem participações muito altas nos negócios. Há casos de startups que não conseguiram se associar a nenhuma aceleradora após a aprovação no programa por causa disso...A gente tem acompanhado a taxa de quebra, que são as startups que não conseguem firmar acordos, e vamos fazer uma reunião com as novas aceleradoras para debater esse assunto. A gente acreditava que a taxa de quebra ficaria em torno de 10%, mas hoje está em cerca de 20%, um número que consideramos alto. Nesse meio há casos de startups que receberam investimento-anjo no meio do caminho e desistiram do programa, outros casos em que o empreendedor vendeu uma coisa quando se inscreveu no edital e na hora em que a aceleradora foi entender o negócio viu que havia outro time, que o modelo de negócio não era o proposto no edital, e houve também os casos de discordância e problemas de gestão. Fizemos uma pesquisa com todos os que não conseguiram firmar acordo, ligamos para eles e estamos compilando esses casos. Alguns realmente têm tido dificuldade com as aceleradoras, que pedem o valor máximo de participação estipulado no edital (20%) sem aportar um valor adicional. Queremos discutir isso com elas porque não pode ir direto para o teto. Mas também não podemos ser muito rígidos porque, se aparece uma "joia da coroa" ao longo do processo e uma aceleradora quiser pedir 30% de participação em troca de um investimento de R$ 30 milhões, não podemos impedir. Algumas que deram mais problemas nas etapas anteriores foram punidas em suas notas pela banca nesse novo edital e queremos avaliar com as aceleradoras o modelo para reduzir a taxa de quebra. Também achamos que com um número maior de aceleradoras essa taxa vai cair porque, no edital anterior, duas das nove aceleradoras selecionadas ficaram titubeantes ao longo de 2013 em sua estruturação e pegaram poucas startups.

Esses problemas na negociação entre empreendedores e aceleradoras se intensificaram na segunda rodada de seleção do programa. Isso aconteceu por que as aceleradoras perderam o fôlego de investimento já na primeira fase?Foi exatamente isso. Vimos que na segunda fase houve mais discussões, em parte por causa de problemas de implementação de duas aceleradoras, o que diminuiu a oferta de vagas. Na primeira rodada tivemos quebra e pudemos selecionar 62 startups na segunda rodada (o previsto no edital são 50 startups por rodada). Por isso, nesse novo edital de aceleradoras optamos por valorizar as mais estruturadas em vez que esperar que elas se estruturem ao longo do programa. Nós estamos fazendo uma pesquisa com as startups que se inscreveram e as que foram selecionadas. Queremos mostrar pontos negativos e positivos do processo, quais startups foram as estrelas do programa... até porque em agosto teremos nosso primeiro demo day no Vale do Silício.

Quando será divulgado o próximo edital de startups e que tipo de mudanças podemos esperar?O próximo edital sai no começo de abril durante um evento chamado "Welcome Aboard" para dar boas-vindas ao conjunto de startups da segunda rodada. Do ponto de vista da execução, achamos que o ecossistema aprendeu bastante as regras do Cnpq, a dificuldade para implementação das bolsas está bem menor... No novo edital de startups vamos antecipar em um mês o processo de seleção para dar tempo de as bancas e aceleradoras fazerem um ajuste fino após a seleção, dar um prazo mais elástico para o fechamento dos negócios. Também estamos pensando em ampliar de três para quatro anos o prazo máximo de existência de uma empresa para se candidatar ao programa e não vamos mais permitir que startups que já foram aceleradas por alguma das aceleradoras do programa possam continuar na mesma aceleradora, porque isso criou um mal estar no ecossistema, as pessoas acharam que era marmelada, e preferimos evitar esse tipo de entendimento.

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