Geração conectada ao smartphone cria oportunidades para aplicativos

Para emplacar novos aplicativos, empresas tentam entender o comportamento de adolescentes na internet

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Por Agências
Atualização:

Reuters

 

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Conor Dougherty THE NEW YORK TIMES

Ao longo da última década, os anunciantes gastaram milhões de dólares para tentar transformar Talia Kocar e toda a geração Y em clientes fiéis. Mas em uma tarde recente em Santa Monica, na Califórnia, em uma espécie de ritual de passagem, Talia, de 25 anos, acompanhou um grupo focal de adolescentes bebendo amostras grátis de Snapple e lambendo pó de Doritos dos dedos enquanto respondiam questões sobre seus smartphones. Talia trabalha no Wishbone, um aplicativo para redes sociais repleto de enquetes engraçadinhas sobre cultura pop, vestidos de baile e outras coisas típicas da vida adolescente. Os usuários – em sua maioria meninas – postavam fotos comparando rappers, celebridades e afins.

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Talia afirmou que suas primeiras tentativas de pesquisa de mercado começaram com idas à lojas da Starbucks e salões de manicure, onde devia encontrar usuários do Wishbone e perguntar o que gostavam e o que não gostavam no aplicativo. Ela recebeu inúmeras informações, mas queria saber mais. Por isso o grupo focal.

Cheia de adolescentes típicos, a sala estava repleta de angústias e contradições. Eles adoram o Instagram, o aplicativo de compartilhamento de fotos, mas temem que suas postagens sejam ignoradas ou ridicularizadas. Sentem uma pressão menor no Snapchat, o serviço que faz as mensagens desaparecerem, mas dizem que o Snapchat é meio irritante, já que é difícil manter uma conversa quando as mensagens não param de desaparecer. Eles não gostam de propaganda, mas também não gostam de ter que pagar pelos serviços.

Em certo momento, a pesquisadora questionou quando era menos provável que estivessem na internet. “Quando estou no chuveiro”, respondeu uma garota.

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Ninguém deu risada, porque a resposta estava longe de ser exagerada. Cerca de 70% dos adolescentes norte-americanos têm acesso a um aparelho celular, de acordo com uma pesquisa feita recentemente pelo Pew Research Center. A maioria entra na internet todos os dias, e cerca de um quarto fica on-line “praticamente o tempo todo”.

Esses números criaram um mercado de marketing crescente, além de verdadeiras fortunas para aplicativos como o Snapchat e o Instagram, que pertence ao Facebook. Em 2016, as empresas devem gastar US$ 30 bilhões em anúncios em aplicativos apenas nos Estados Unidos, cerca do dobro do valor gasto em 2014, de acordo com a empresa de pesquisa de mercado eMarketer.

Contudo, muito embora esses serviços tenham as mesmas funções básicas – encontrar amigos, postar fotos, enviar mensagens –, os adolescentes transitam constantemente entre eles, desenvolvendo hábitos para determinar o que postar e onde, deletando os aplicativos que saem de moda.

Isso abre um caminho interessante para empresas como a Wishbone, que foi aberta há um ano e já conta com três milhões de usuários mensais. Desde julho, o aplicativo está entre as 30 mídias sociais mais baixadas na App Store da Apple, de acordo com a App Annie, empresa de análise de dados sobre aplicativos. Contudo, se manter na crista da onda pode ser bem difícil. Os aplicativos móveis são um sucesso ou um fracasso e poucas empresas conseguem chegar aos bolsos dos clientes.

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Na expectativa de que seu aplicativo faça parte desse grupo de elite, pessoas como Talia examinam dados e realizam grupos focais para entender como convencer novos usuários a assinarem o serviço, além de fidelizar os usuários mais antigos. Essas iniciativas ajudam a mostrar como as vidas dos adolescentes são documentadas nas telas de aparelhos móveis.

“Eles recebem uma validação social instantânea, com o simples toque de um botão. Por isso, se você acha que a geração da recompensa imediata já desapareceu, não faz ideia do que significa gratificação imediata antes de passar algum tempo com um adolescente em um telefone”, afirmou Michael Jones, executivo-chefe da Science Inc., dona da Wishbone.

Identidades virtuais. Certa tarde, em meados do ano passado, Leila Khan e Lucy Nemerov, duas alunas do oitavo ano em Palo Alto, na Califórnia, passeavam pelo shopping do bairro, experimentando as amostras grátis da See’s Candies e caminhando pelos corredores da Brandy Melville para ver as roupas. Lucy usa o Wishbone o tempo todo, mas o aplicativo é apenas um dos muitos que ela e as amigas acessam todos os dias.

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Para gerenciar suas identidades virtuais e as relações no mundo que se esconde em seus bolsos, elas estabelecem regras que foram adotadas e internalizadas por seus colegas. Por exemplo, naquela tarde em que nada de especial aconteceu, Lucy postou alguns vídeos no Snapchat – incluindo um trecho da minha entrevista com ela – mas nada no Instagram.

Por que a distinção? Porque o Instagram é para coisas especiais, explicou Leila. No Snapchat, onde as mensagens desaparecem, você pode ser menos seletivo, já que o nível de qualidade não precisa ser tão alto. No Instagram, é preciso ser cuidadoso para não encher os feeds dos amigos com várias fotos sem graça que podem incomodá-los. As meninas não tinham regras para usar o Facebook, porque quase nunca entram na rede social.

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Os criadores de aplicativos temem esse trânsito entre os programas da mesma forma que as redes de TV têm medo dos gravadores digitais de vídeo (DVR). Sempre que alguém deixa um aplicativo e vai para outro, há uma chance de que os usuários nunca mais voltem. E como os aplicativos só conseguem ganhar dinheiro quando os usuários estão ligados e consumindo os anúncios, o número de usuários mensais é menos importante do que o número diário de usuários – e o tempo que passam dentro do aplicativo.

Por enquanto, grandes anunciantes continuam focados na geração Y. Mas uma nova onda já começa a pensar no próximo grupo, segundo Erna Alfred Liousas, analista da Forrester Research. Ela diz que a empresa tem uma série de clientes dos setores de serviços financeiros e de mídia interessados em estudos envolvendo jovens com menos de 17 anos.

Hábito. Como acontece com o café e o jornal, a chave para que um aplicativo seja bem sucedido é transformá-lo em um hábito diário. Essa é a razão pela qual, no início de setembro de 2015, Jones, da empresa Science, observava dados em uma tela. Ele estava acompanhado por Benoit Vatere, diretor do grupo de aparelhos móveis, e Peter Pham, diretor de negócios, discutindo qual seria a melhor hora para enviar mensagens de sistema alertando os usuários do Wishbone sobre novas pesquisas.

As notificações de sistema – alertas insistentes que fazem o celular vibrar e piscar – são a linha de frente da batalha dos aplicativos, interrompendo os ciclos de atenção para lembrar os usuários de que alguém na internet pode estar falando a respeito deles. Durante todo o verão, o Wishbone enviou alertas quatro vezes ao dia, mas os três estavam pensando em intensificar o número de mensagens, agora que os estudantes voltaram às aulas, de forma a se adaptar ao horário escolar.

“Os amigos postam durante o almoço?” Jones perguntou a Vatere. “Seria legal colocar uma mensagem de sistema dizendo que ‘Seus amigos têm novidades’”.

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“E você pode conversar a respeito disso no horário da escola”, acrescentou Pham.

Geração do milênio. Cada geração tem uma mania e as duas últimas foram marcadas pelas tecnologias digitais. Um das maiores diferenças entre a geração X e a geração Y é o fato de que os mais jovens já cresceram habituados à internet. Uma grande diferença entre a geração Y e a Z são os smartphones.

Mudanças econômicas e culturais tiveram uma influência ainda maior, afirma Neil Howe, autor e historiador que criou a expressão “geração do milênio”. A grande recessão e suas consequências provavelmente tornaram a geração Z mais avessa a riscos, afirmou. Ao mesmo tempo, as crianças de hoje ouviram os conselhos dos pais sobre segurança on-line e bullying.

Em pesquisas, sua empresa de consultoria, a LifeCourse Associates, descobriu que os adolescentes têm muito medo de serem criticados nas redes sociais e são mais preocupados que os pais quanto aos aplicativos que os fazem se sentir mal – ou pelo menos não têm vergonha de dizer isso.

Durante o grupo focal realizado na Science, uma garota contou que costuma mostrar as fotos pelo menos a três pessoas antes de postar no Instagram. Outra disse que descartava qualquer post que não tivesse muitas curtidas. “Eu posto e logo em seguida deleto, porque não quero que as pessoas, sei lá…” afirmou, com vergonha de dizer quantas curtidas recebeu.

O Wishbone vê uma oportunidade nessa ansiedade. O aplicativo não pede que os usuários tirem fotos em que estejam “lindos!!!”, nem exige que seus pais viagem nas férias para lugares perfeitos para as fotos do Instagram. Os usuários simplesmente fazem enquetes engraçadas e conversam sobre celebridades, maquiagens e bandas. É um aplicativo sobre gostos, não sobre a identidade dos usuários.

Rajada Victor, de 14 anos e estudante do nono ano, que vive em Los Angeles, estava sentada ao lado da menina que tinha vergonha de dizer o número de curtidas das fotos. Em uma segunda entrevista, ela contou que ficou cansada de postar sem parar na internet, mas que continuava a usar o Wishbone, que confere o dia todo: durante as aulas, nos corredores da escola e durante os fins de semana.

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