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Operadora AT&T pede lei sobre neutralidade da rede nos Estados Unidos

Em anúncio publicado em jornais norte-americanos, presidente da operadora anseia por Constituição da Internet, que garanta que tráfego não possa ser bloqueado ou restringido por provedores e empresas de internet

Por Brian Fung
Atualização:
Randall Stephenson, presidente executivo da AT&T Foto: Reuters/Brendan McDermid

A operadora norte-americana AT&T pediu nesta quarta-feira, 24, que o Congresso americano escreva uma lei que proteja o princípio da neutralidade da rede, tentando colocar fim a um longo debate sobre o futuro da internet nos Estados Unidos. 

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Em um artigo publicado como anúncio em grandes jornais do país como o The Washington Post e o The New York Times, o presidente da empresa, Randall Stephenson, pediu a criação de uma “Constituição da Internet”, que poderia garantir uma rede livre, na qual o tráfego não possa ser bloqueado ou restringido nem por provedores de conexão, nem por empresas de internet como Google ou Facebook. 

Para analistas, a campanha da AT&T pode representar uma mudança na discussão atual sobre o tema – em dezembro, vale lembrar, a agência regulatória de telecomunicações dos EUA (FCC, na sigla em inglês) votou para acabar com as regras vigentes de neutralidade da rede, no que poderia beneficiar a AT&T e outras operadoras. No entanto, a decisão está sendo desafiada na Justiça e no Congresso, e muitos Estados norte-americanos estão buscando suas próprias legislações para não se submeter à decisão da FCC. 

Ter de lidar com dúzias de regras diferentes de neutralidade da rede, a nível estadual, pode ser um pesadelo para as operadoras, indo a um cenário de extrema insegurança jurídica. Embora a FCC diga que os Estados não possam decidir suas próprias regras, essa é uma batalha que pode se arrastar por anos na Justiça – e empresas como a AT&T buscam estabilidade. 

“A ação do Congresso é importante para estabelecer uma Constituição da Internet que se aplique a todos, garantindo neutralidade, transparência, abertura, ausência de discriminação e proteção à privacidade de todos os usuários”, escreveu Stephenson. Segundo o executivo, sua empresa apoia a neutralidade da rede, mesmo tendo sido uma ferrenha opositora às regras escritas em 2015 que protegiam o princípio. “Não bloqueamos sites. Não censuramos conteúdo. E não colocamos obstáculos, discriminamos ou degradamos performance de internet baseados no conteúdo. Ponto final.” 

Futuro. Hoje, a expectativa do Partido Democrata é conseguir votar uma lei que reverta a decisão da FCC. No Senado, o partido já tem o apoio de 50 congressistas (sendo 49 democratas e a republicana Susan Collins). No entanto, a votação pode ser revertida pela maioria republicana na Câmara dos Deputados ou até mesmo por Donald Trump. 

A proposta da AT&T toma um caminho diferente. Há muito, os legisladores consideram escrever uma lei nacional sobre neutralidade da rede, mas até hoje, republicanos e democratas falharam nesse compromisso. O anúncio da empresa pode criar momento para esse esforço – mas seria algo difícil após a cisão nacional depois da eleição de Trump e o atual ambiente polarizado, disse o comissário republicano da FCC Michael O’Reilly, a jornalistas na última segunda-feira. 

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Enquanto a AT&T disse que a lei federal deveria prevenir empresas de bloquear ou colocar obstáculos a conteúdos online, a empresa diz pouco se operadoras deveriam ter o poder de acelerar o acesso a determinados sites e serviços – especialmente quando recebem recursos financeiros dessas empresas para dar tal prioridade. Críticos do cenário de tecnologia dizem que permitir tal manobra pode criar “vias rápidas” na internet, favorecendo a concentração econômica e acabando com a livre concorrência na internet, um problema para startups e pequenos negócios. 

Há, no entanto, quem defenda que a priorização de tráfego pode criar novos modelos de negócios, beneficiando os consumidores. Um porta-voz da AT&T disse que priorização paga de tráfego pode facilitar serviços que os consumidores desejam, como telemedicina, carros autônomos e Internet das Coisas. 

O pedido da AT&T por uma lei que se aplique isonomicamente a empresas de tecnologia e operadoras é um ponto de virada na longa batalha entre o Vale do Silício e os provedores de internet. Além disso, mostra uma nova visão sobre as gigantes de tecnologia, que se torna cada vez mais popular em Washington. 

“Aqueles no Congresso que insistem na regulação pesada a provedores podem acabar ignorando preocupações sérias com os consumidores e a privacidade, bem como com o monopólio dos gigantes do Vale do Silício”, disse Fred Campbell, diretor do grupo de pesquisas Tech Knowledge. 

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Já os pesquisadores que desenvolveram o conceito de neutralidade da rede não o imaginaram sendo aplicado às empresas do Vale. Em um artigo de 2003, o advogado Tim Wu disse que as empresas de tecnologia poderiam ser vítimas de um mundo sem neutralidade da rede, porque as operadoras poderiam ter motivo para direcionar os consumidores para aplicações e serviços com os quais mantenham relações comerciais. 

O resultado, escreveu Wu na época, poderia ser uma internet diferente daquela onde aplicativos competem livremente. Há quem defenda que a isonomia pedida pelas empresas possa ser só uma distração – mesmo que as gigantes de tecnologia mereçam sim o escrutínio por seu poder exacerbado na sociedade. 

“O argumento que a AT&T usa de ‘mas e o Google?’ é uma distração triste, uma vez que esse é um debate ainda recente”, disse Harold Feld, vice-presidente do grupo de defesa dos consumidores Public Knowledge. “Desde que começamos, parece que a intenção da AT&T é maniqueístca, colocando o malvado Google contra os pobres provedores de internet.” / TRADUÇÃO DE BRUNO CAPELAS

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