Travis Kalanick, fundador e CEO do Uber, pediu licença por tempo indeterminado da companhia
O aplicativo de carona paga Uber tem passado por mudanças importantes, que culminaram na renúncia de Travis Kalanick ao cargo de presidente executivo, anunciada ontem. A saída dramática de Kalanick, que foi afastado sob forte pressão dos investidores do Uber, é apenas uma das profundas mudanças que a empresa deverá passar nos próximos meses para sair de uma grave crise. Desde o afastamento do executivo, na semana passada, um conselho executivo é responsável por gerir o Uber. A empresa já iniciou a busca por um novo presidente executivo e mantém a seleção de um novo diretor de operações.
Em paralelo a isso, recomendações listadas após uma ampla investigação na empresa conduzida pelo escritório de advocacia do ex-advogado-geral dos Estados Unidos, Eric Holder, serão colocadas em prática nos próximos meses. O trabalho incluiu mais de 200 entrevistas com funcionários do Uber, contribuições anônimas de funcionários e também análise de cerca de 3 milhões de documentos. O relatório final de Holder foi divulgado na semana passada. Confira, a seguir, as cinco principais mudanças que devem acontecer no Uber nos próximos meses:
1. Liderança compartilhada
Com a saída de Travis Kalanick, o Uber terá de arranjar um novo presidente executivo. A empresa também está em buscaum chefe de operações -- a vaga está aberta desde março, mas a empresa ainda não conseguiu encontrar um candidato para assumir o posto. De acordo com o relatório da investigação, esse profissional será parceiro do presidente executivo e deve ser uma pessoa com experiência em supervisionar empresas com estruturas complexas e que tenha conhecimento em diversidade, ou seja, em liderar times compostos por profissionais de etnias e gêneros diferentes.
A empresa também deve definir métricas claras de desempenho para o time executivo. A melhoria da diversidade e inclusão, dois aspectos que devem se tornar pilares da nova fase do Uber, deverão ser monitorados por métricas, que serão consideradas na avaliação desses executivos. Aspectos como satisfação dos empregados e compliance também serão adotados na avaliação de desempenho.
Em relação à diversidade, o atual chefe de diversidade, Bernard Coleman, ganhará mais poder dentro do Uber. Segundo o relatório, ele deverá reportar diretamente o presidente executivo e ao diretor de operações da empresa. Além disso, um dos executivos do alto escalão do Uber terá a tarefa de monitorar se as recomendações serão amplamente adotadas pela empresa, com métricas. Ele terá autoridade total sobre a condução do processo de mudança. O executivo que ficará a cargo da tarefa ainda não foi definido.
2. Conselho mais atuante
Outras recomendações dizem respeito à composição e função do conselho de administração. Segundo o relatório, o conselho deve ser reestruturado nos próximos meses para incluir mais membros independentes. Além disso, um comitê pode ser criado para supervisionar se o Uber está melhorando seus indicadores relacionados a compliance, diversidade e ética.
3. Reformulação dos valores
A lista de 14 valores do Uber -- que se tornou símbolo da cultura agressiva da empresa no mercado -- será reformulada, segundo as recomendações do conselho e dos funcionários. "É vital que eles reflitam comportamentos mais inclusivos e positivos", diz Holder, no relatório. Novamente, a importância da diversidade para a empresa deve ser um dos pontos reforçados na reforma. Além disso, valores que já foram usados por funcionários para justifical mal comportamento serão retirados da lista, bem como valores que são redundantes. Na prática, a lista deve diminuir nos próximos meses.
O relatório cita, especificamente, quatro valores "problemáticos" para a nova fase da empresa: Let Builders Build (Deixe os construtores construírem, em tradução livre), Always be hustlin (termo para determinação ou fazer algo com energia, mas que também é, pelo Dicionário de Cambridge, uma gíria que remete a faltar com a ética ou cometer atos ilícitos para ganhar dinheiro), Toe stepping (que se refere a interferir em assuntos que são de responsabilidade de outra pessoa) e Principle confrontation (que tem sido usado pelo próprio Kalanick para justificar os confrontos do Uber com o governo em diversas cidades do mundo). Segundo as recomendações, todos os executivos em posições de liderança terão de "abraçar" os novos valores e comunicá-los aos funcionários.
4. Gestão de pessoas mais forte
De acordo com o relatório, a área de recursos humanos do Uber precisa ter o apoio dos executivos na liderança do aplicativo para que a área seja vista como uma autoridade dentro da empresa. Além disso, os profissionais desse setor deverão receber treinamento para entender como tratar denúncias sobre discriminação ou assédio. Com relação à diversidade, é preciso que o responsável pelo RH do Uber divulgue estatísticas sobre o assunto na empresa anualmente, com metas de melhoria.
Alguns processos, que são básicos na maioria das empresas, foram destacados por Holder no relatório. A partir de agora, o Uber precisará limitar o consumo de álcool em reuniões e jantares corporativos. A empresa também deverá proibir relacionamentos íntimos ou amorosos entre profissionais, quando eles estão em níveis hierarquicos diferentes na mesma linha de comando.
5. Inclusão de profissionais
Outra recomendação que será adotada nos próximos meses será a de recrutar mais candidatos negros e hispânicos, além de mulheres, nos processos de seleção do Uber. De acordo com o relatório, uma mulher e um representante de uma minoria sempre deverão estar contemplados no processo de seleção para uma vaga. O relatório também recomenda que o Uber adote um processo de análise "cega" de currículos, para evitar que os líderes privilegiem uma determinada etinia ou gênero nas contratações.
A empresa também deverá atualizar sua política contra discriminação e assédio, inclusive para contemplar casos em que funcionários do Uber sejam vítimas de funcionários de outras empresas. A empresa também deverá adotar políticas de trabalho mais flexíveis, com opções de trabalho remoto, por exemplo, para permitir que profissionais que tenham filhos pequenos possam trabalhar na empresa. A companhia também vai adotar uma política de promover jantares e outros eventos no período noturno mais cedo, de modo que os funcionários possam voltar para casa e ficar com suas famílias.
Lembre as recentes polêmicas envolvendo o Uber
Em 2016, Travis Kalanick aceitou um cargo na equipe de conselheiro econômicos de Donald Trump, presidente dos Estados Unidos. A decisão gerou retaliação de usuários contrários ao governo, que criaram a campanha #DeleteUber. Em apenas alguns dias, o app foi desinstalado por 200 mil pessoas, o que fez com que Kalanick renunciasse ao cargo. “Não entrei para o grupo para mostrar apoio ao presidente ou suas ações, mas infelizmente isso foi mal interpretado como sendo exatamente isso”, disse o executivo na época.
No Brasil, a empresa está enfrentando graves problemas de segurança. Motoristas reclamam que há pouca fiscalização de usuários quando o pagamento é efetuado em dinheiro — ao contrário do pagamento em cartão de crédito, não é preciso colocar dados pessoais. Com isso, relatos de assalto e sequestros de motorista e passageiros surge de maneira frequente. O Uber diz que faz uma checagem de segurança e, há pouco tempo, passou a exigir CPF dos usuários que pagam em dinheiro.
O Uber também sofreu um revés em fevereiro deste ano com a Justiça brasileira: a 33.ª Vara de Justiça do Trabalho de Belo Horizonte reconheceu o vínculo empregatício de um motorista brasileiro com o Uber. De acordo com a decisão, o ex-motorista Rodrigo Leonardo Silva Ferreira, de 39 anos, tem direito a receber aviso prévio indenizado, férias proporcionais e valores correspondentes ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), com multa correspondente a 40% pela demissão.
Ex-funcionária do Uber, Susan Fowler denunciou em seu blog que um gerente na empresa usou um software de bate-papo interno para tentar "fazer com que ela fizesse sexo com ele". Como prova, a ex-funcionária ainda fez imagens da tela com as mensagens mostrando o assédio. Em resposta, Travis Kalanick ordenou nesta uma "investigação urgente" sobre as alegações de assédio.
Depois das alegações de Fowler sobre assédio dentro do Uber, o jornal norte-americano The New York Times publicou informações que aumentam o número de acusações sobre a companhia. Segundo o jornal, funcionários usaram cocaína durante uma viagem da empresa e um deles foi demitido após assediar algumas de suas colegas de trabalho.
A Waymo, unidade de carros autônomos da Alphabet -- holding que controla o Google -- está processando o Uber, alegando roubo de tecnologia própria. Segundo o texto do processo, a tecnologia que teria sido roubada é a de sensores capazes de identificar a posição dos carros no espaço e ajudá-los a se locomover sozinhos. "A tecnologia LiDAR da Uber é, na verdade, a tecnologia LiDAR da Waymo", diz a denúncia. O Uber disse em comunicado que o processo da Waymo é uma tentativa sem fundamento de desacelerar um competidor e que, por isso, eles irão se defender vigorosamente das acusações no tribunal.
Os problemas do Uber em relação à assédio sexual não terminaram com as acusações de Susan Fowler. Ex-chefe de buscas do Google, Amit Singhal foi contratado pelo Uber em janeiro, como uma grande aposta da empresa para aprimorar seu sistema. Pouco de um mês depois, a empresa o demitiu. O motivo? O Google tinha desligado Singhal de seu quadro de funcionários após o executivo ser investigado por um abuso sexual contra uma funcionária. Procurado pela imprensa, ele desmentiu.
Presidente executivo do Uber, Travis Kalanick foi filmado discutindo com um motorista de seu próprio aplicativo. Em cenas gravadas por uma câmera dentro do carro, o executivo troca farpas com o motorista Fawzi Kamel, que reclamou das tarifas cobradas pelo serviço de caronas pagas. Depois de ter as cenas divulgadas na imprensa, Kalanick disse que “precisa crescer” como líder.
De acordo com reportagem do The New York Times, o Uber usou um software para enganar autoridades e escapar de fiscalização em cidades onde está ou esteve ilegal. Para isso, eles coletam ilegalmente dados de usuários do aplicativo para identificar os fiscais e autoridades governamentais, como forma de se prevenir de penas ou sanções. O Uber disse que a plataforma foi usada para evitar “usuários que usam o serviço de maneira inapropriada”.
Em 2016, o órgão público que regula transporte em Londres, no Reino Unido, definiu que condutores de empresas privadas de transporte têm que provar a capacidade de domínio da língua inglesa de seus motoristas. Para tentar reverter a situação, o Uber entrou com uma ação. No entanto, a empresa perdeu o processo e agora precisa comprovar que seus motoristas falam inglês perfeitamente. O Uber disse que tal medida faria com que 33 mil condutores perdessem as suas licenças para operar na capital.
O Uber vem enfrentando problemas de regulação no continente asiático. Em fevereiro, a companhia parou de operar em Taiwan por causa de uma multa milionária implantada pelo governo local por operar ilegalmente no território. Em março, a empresa sofreu outro revés quando um juiz de Hong Kong condenou cinco de seus motoristas por usaram o aplicativo. A punição desmotiva o uso do serviço na região pelo medo que os motoristas têm de ganharem sanções parecidas.
No dia 19 de março, Jeff Jones, presidente do Uber, renunciou ao cargo após seis meses depois de o ter assumido. Dentro da empresa, ocupava a segunda posição mais importante, logo abaixo de Travis Kalanick. Jones alegou que estava deixando a companhia por incompatibilidade de valores. No começo de março, Ed Baker, vice-presidente de produtos e desenvolvimento do Uber, e Charlie Miller, principal investigador de segurança, também deixaram a empresa.
O site norte-americano The Information divulgou que, em 2014, uma equipe do Uber visitou uma casa de prostituição em Seul, capital da Coreia do Sul. De acordo com a publicação, os quatro gestores da companhia escolhiam mulheres da casa, chamando-as por números, para sentar-se com eles. Depois dessa noite, uma funcionária do Uber reportou ao RH da empresa que a viagem a deixou desconfortável.
Na segunda feira, 27, o Uber voltou a colocar seus carros autônomos na rua. Na última sexta-feira, 24, a empresa havia suspendido o projeto após um de seus protótipos capotar ao colidir com outro veículo no estado norte-americano do Arizona. Depois do acidente, uma investigação foi conduzida e a empresa decidiu liberar seus carros para rodarem nas três cidades onde testa o projeto — Tempe, no Arizona, São Francisco e Pittsburgh. Segundo a polícia local, o carro pilotado por humano foi o responsável pelo acidente com o carro autônomo do Uber.
O Uber anunciou em 28 de março que deixará de funcionar na Dinamarca a partir de abril deste ano. Uma nova legislação local obriga que todos os motoristas a utilizem taxímetro, o que inviabiliza o serviço. Desde 2014, a companhia sofre dificuldades no país, que encara o Uber como uma concorrência injusta aos táxis.
Emil Michael, vice-presidente sênior de negócios e segundo na linha de comando do Uber, deixou a empresa após o conselho administrativo afirmar que vai acatar os conselhos registrados no relatório final da investigação de assédio sexual. "Entrei na empresa há quase quatro anos e vivi uma experiência completa ao ajudar o Uber a se tornar a empresa de mais rápido crescimento de todos os tempos", amenizou o executivo. Não ficou claro, porém, se Michael foi demitido ou se ele próprio renunciou ao cargo.
O cofundador e presidente executivo do Uber, Travis Kalanick, anunciou uma licença da empresa por tempo indeterminado no meio de junho. A saída do executivo foi anunciada em um e-mail para os funcionários e faz parte de uma série de recomendações feitas ao conselho após a investigação que começou por denúncias de assédio sexual na empresa. Kalanick disse que deixa a empresa para atravessar o período de luto após a morte de sua mãe em um acidente de barco e que usará a licença para "refletir, trabalhar em si mesmo e construir um time de liderança de classe mundial".