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Jornalista, escritor e palestrante. Escreve às quintas

Opinião|A estranha história de Alex Jones

O Vale é de esquerda, mas é liberal. Mas quando só a direita sofre, abre espaço para críticas

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Alex Jones, dono do siteInfowars Foto: Ilana Panich-Linsman/The New York Times

Foi um movimento novo, de todo atípico no Vale do Silício. Afinal, é raro que as empresas dali, em geral rivais agressivas, ajam como se tivessem combinado. Pois foram juntas que quase todas baniram, nos últimos dias, Alex Jones e seu site, Infowars. Jones, um teórico da conspiração agressivo que tem seguidores aos milhões na direita extrema, está na internet há mais de 20 anos. De presto, dois importantes políticos da direita viram na ação censura ideológica: o senador americano Ted Cruz e o líder do Partido da Independência do Reino Unido, Nigel Farage.

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Este debate vai longe e resvala na eleição brasileira.

Esta história em particular começou no último dia 17, quando Monika Bickert, vice-presidente de políticas internas do Facebook, prestou depoimento perante o Comitê de Justiça da Câmara dos Deputados americana. Inúmeros posts do Infowars haviam sido apagados pela rede social nos meses anteriores. Os deputados queriam saber por que o site não havia sido banido já que as regras afirmam que quem as viola repetidamente deve ser cortado. Ela não tinha uma resposta. No dia 25, o YouTube apagou uma série de vídeos do site. Era a segunda vez que o fazia. E, no caso da rede de vídeos, a regra é clara. Três ofensas, fora. Jones chegara à segunda.

No dia 27 de julho o Facebook bloqueou o perfil pessoal de Jones. “Nossas regras deixam claro que proibimos conteúdo que incentive agressão.” Em 1.º de agosto, o Spotify retirou inúmeros episódios do podcast do Infowars. No domingo, a Apple sacou não os episódios, mas os próprios podcasts do ar. Não era mais possível assinar Jones via iTunes. Nem Spotify, nem Apple, haviam entrado ainda no debate sobre política na internet. Pois apareceram num repente. Incisivos. Na segunda-feira, o Facebook baniu de vez a página profissional de Jones e a do Infowars. O YouTube fez o mesmo: banido para sempre. E a Amazon, discretamente, retirou todas as recomendações para livros e tudo o mais produzido por ele. Por enquanto, só Twitter o mantém no ar.

Infowars, o site, recebe 10 milhões de visitantes por mês. Trata de um mundo paralelo. Não fala em globalização, mas em globalismo, um sistema no qual o planeta é controlado por uma estrutura chamada Nova Ordem Mundial. Donald Trump foi eleito para combater este grupo secreto – os EUA representam o último bastião independente, qual a aldeia de Astérix. Hillary Clinton e Barack Obama são demônios. Literalmente. Vindos do inferno. Não acontecem massacres em escolas americanas – são notícias fabricadas pela imprensa e os sobreviventes são atores profissionais especializados em momentos de crise. Os judeus controlam o sistema de saúde americano. E o Partido Democrata é, secretamente, uma rede de pedofilia.

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Não é raro que Jones diga no ar que uma pessoa precisa morrer. Durante a eleição, conseguiu pela primeira vez entrevistar um candidato à presidência. Trump. Que lhe disse ao vivo: “não vou desapontá-lo”. Segundo Jones, não tem mesmo desapontado.

Diz a piada contada a quem chega pela primeira vez ao Vale que o último republicano deixou a região nos anos 1950. Maconha é legal, há décadas casais gays se integraram ao cotidiano. Fala-se toda sorte de sotaques, não há tom de pele que não seja visto nas ruas. O liberalismo de esquerda predomina e isto não é segredo para ninguém.

Estas empresas nunca tiveram qualquer controle editorial sobre o que nelas circulava. Repentinamente, e aparentando conluio, puseram para fora um neofascista. A direita brasileira, claro, logo incorporou para si a hashtag #DireitaAmordaçada. Pois é. Não devem ter razão. O Vale é de esquerda, mas é também liberal. Acredita em liberdade de expressão. Mas quando só a direita sofre, o flanco para as críticas está aberto. Escancarado.

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