Como o presidente do Airbnb sucumbiu a um IPO que não queria

Estratégia de expansão da empresa para ser central de turismo deu com os burros n’água e fez startup perder momento ótimo para abrir capital; pandemia fez Brian Chesky cair na real

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Por Agências
Atualização:
Brian Chesky é o presidente executivo do Airbnb – uma empresa fundada após noites dormidas em colchões de ar Foto: Jessica Chou/The New York Times

O presidente executivo do Airbnb, Brian Chesky, resistiu por anos a pedidos de investidores de para fazer uma oferta pública inicial de ações (IPO, em inglês), acompanhando a corrente de outros unicórnios do Vale do Silício. Mas isso faz parte de um passado distante – antes da empresa ser pressionada pelos impactos da pandemia de Covid-19 e mudar sua postura. Isso porque a Airbnb pretende realizar seu IPO na Nasdaq no próximo mês, 12 anos depois que Chesky fundou a empresa com os ex-colegas de quarto Joseph Gebbia e Nathan Blecharczyk.

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A longa estrada até o IPO frustrou muitos investidores e funcionários que esperavam por uma oportunidade de vender suas participações na empresa no mercado acionário. Entrevistas da Reuters com mais de uma dezena de executivos, assessores, investidores e funcionários da Airbnb mostram que Chesky colocou os planos de IPO em segundo plano enquanto tentava transformar a companhia em uma agência de viagens completa. Para isso, ele adicionou “experiências” para que os clientes pudessem participar de atividades de férias, como visitas guiadas a atrações turísticas. Ao ampliar o investimento nessas iniciativas, ele sacrificou a lucratividade do Airbnb, segundo mostram dados do prospecto do IPO.

Foram anos de pressão de investidores e funcionários, bem como a deterioração das finanças da empresa durante a pandemia, para que Chesky desistisse de seus planos de expansão e se comprometesse com o IPO. A Airbnb está buscando uma avaliação de cerca de US$ 30 bilhões, menos que os US$ 50 bilhões que executivos de bancos de investimentos disseram a Chesky que a empresa valia se o IPO fosse feito dois anos atrás.

“Chesky não tinha com sonho tornar a Airbnb uma empresa de capital aberto. Isso era parte de um processo de satisfazer todos os envolvidos com a empresa e recompensá-los”, disse Ron Conway, fundador da SV Angel, um dos primeiros investidores da Airbnb e apoiador de Chesky. Representantes da Airbnb não comentaram o assunto.

A Airbnb atingiu oficialmente a condição de “unicórnio” em 2011, quando superou a avaliação de mercado de US$ 1 bilhão. Como a empresa levantava mais dinheiro com investidores, Chesky resistia à ideia de levar a companhia ao mercado de ações. Ele dividia seu tempo entre administrar a Airbnb, visitar imóveis e desenvolver experiências para os usuários do site. “Ele tem uma casa agora, mas por anos ele experimentava um novo Airbnb toda a noite. Ele ficava algumas noites em cada um. No porta-malas do carro dele ficavam todos os seus pertences, disse Conway.

Disputa pelo IPO 

Ao longo do tempo, porém, Investidores começaram a ficar frustrados com a falta de comprometimento de Chesky sobre um IPO da Airbnb. Em 2017, Lawrence Tosi, que tinha ingressado na empresa como vice-presidente financeiro dois anos antes, egresso do grupo de investimentos Blackstone, guiou investidores em uma rodada de captação de US$ 1 bilhão. Ele citou a expectativa de que uma oferta pública de ações provavelmente ocorreria nos próximos 12 meses, disseram fontes com conhecimento das discussões.

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Tosi também iniciou negociações com bancos de investimentos sobre um IPO que avaliaria a Airbnb entre US$ 45 bilhões e US$ 50 bilhões, disse uma das fontes. Ele estava promovendo estes encontros em nome de Chesky, que tinha pedido a ele para preparar a companhia para um IPO no primeiro trimestre de 2018, acrescentou a fonte. Mas aí Chesky desistiu da ideia. Ele publicou uma mensagem descrevendo a Airbnb como empresa focada em um “horizonte infinito de tempo”, um claro sinal de que tinha decidido evitar a divulgação de resultados financeiros típica de uma companhia de capital aberto.

No dia 19 de agosto, a Airbnb, que aluga habitações para viajantes, apresentou a documentação para um IPO Foto: AFP

Tosi acabou brigando com Chesky, argumentando que o futuro da Airbnb está sobre seus negócios principais de aluguel de imóveis para temporadas e viagens de negócios. Desistir do IPO para expandir a atividade de experiências significaria desperdício de dinheiro. Em 2018, Tosi saiu da Airbnb.

Pandemia 

Chesky manteve a perspectiva viva de IPO para os investidores, mas nunca cravou prazos até setembro de 2019, quando a Airbnb anunciou que faria um IPO em algum momento de 2020. Ele respondeu à frustração de muitos dos funcionários da empresa, que tinham recebido opções de ações que vencem no início de 2021, disseram as fontes.

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Quando o coronavírus atingiu a empresa em cheio, Chesky decidiu levantar capital de novo, mas as rodadas de aporte anteriores tinham sido realizadas sobre perspectivas de rápido crescimento, não sob uma crise. Se a Airbnb já fosse uma empresa de capital aberto, poderia ter levantado recursos por meio de uma venda de ações no mercado.

Em vez disso, a única opção foi dívida, e uma dívida cara. A Airbnb assegurou US$ 2 bilhões em empréstimos de várias companhias de investimentos, incluindo de Silver Lake e Sixth Street Partners, a uma taxa de juros anual combinada de mais de 9%. Em comparação, a Uber conseguiu financiamento de US$ 1,5 bilhão em 2018 a uma taxa de 6,2% ao ano. 

Alguns dos planos grandiosos de Chesky, incluindo programas de televisão e filmes da Airbnb, foram pelos ares assim que a empresa se viu forçada a demitir 20% dos funcionários e a cortar o orçamento de marketing com a chegada da pandemia.

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Ele acabou se concentrando em revitalizar o negócio principal da Airbnb – o de aluguel de apartamentos em cidades. Na quarentena, a empresa ofereceu casas que as pessoas podiam alugar para terem um lugar para ficarem. A estratégia funcionou e a Airbnb teve lucro de US$ 219 milhões no terceiro trimestre. 

Mas a empresa nunca teve lucro anual, acumulando resultado negativo de quase US$ 700 milhões nos primeiros nove meses do ano, bem diferente da performance de dois anos atrás, quando ficou a apenas US$ 17 milhões de ter resultado positivo. Em uma reunião de conselho da empresa no final de julho, Chesky concordou com um IPO da empresa até o final do ano, disseram as fontes.

“Quando a covid-19 chegou, Chesky teve que reverter uma série de iniciativas que estavam sendo preparadas há três anos”, disse Michael Ovitz, co-fundador da Creative Artists Agency e conselheiro informal de Chesky. “Ele ficou muito impactado com tudo isso.”

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