Grandes bancos fizeram testes com WhatsApp, mas desistiram antes de anúncio

Instituições que ficaram de fora do lançamento do WhatsApp Pay, Itaú, Bradesco e Santander chegaram a participar dos testes, mas desistiram, dizem fontes próximas ao tema; novos parceiros podem chegar ao serviço em um mês, apurou a reportagem

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Por Aline Bronzati (Broadcast) e Bruno Capelas
Atualização:
Recurso de pagamento do WhatsApp foi lançado na segunda-feira, 15, e chegará gradualmente para todos os brasileiros Foto: WhatsApp

Os grandes bancos brasileiros participaram dos testes para aderir à solução de envio e recebimento do WhatsApp, anunciada esta semana, apurou o Estadão/Broadcast. Às vésperas do lançamento no Brasil, primeiro mercado escolhido pelo Facebook para disponibilizar a novidade, contudo, os pesos pesados do setor desistiram de se juntar à gigante de tecnologia, diminuindo a escala, ao menos por ora, da funcionalidade.

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O WhatsApp teria definido a próxima janela para a inclusão de novos parceiros em 90 dias, conforme quatro fontes ouvidas pela reportagem. No entanto, como na prática não há contrato de exclusividade com aqueles que já aderiram à solução, alguns candidatos poderiam ser inseridos antes. A bandeira de cartões Elo, de Bradesco, BB e Caixa, e também o Santander Brasil já estão se preparando nos bastidores. Bancos digitais, como Inter, C6 e Neon, também podem se unir ao aplicativo em breve, disseram fontes de mercado. 

A escolha do Brasil por parte do WhatsApp para ingressar no setor de meios de pagamentos, ainda que via parceiros, esquentou a discussão da entrada das gigantes de tecnologia no sistema financeiro. Além de claramente incomodar os grandes bancos, motivou uma atuação mais ativa por parte dos órgãos reguladores. Tanto Banco Central quanto o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) estariam colhendo informações sobre o modelo de negócio do aplicativo do Facebook no País.

Com cerca de 120 milhões de usuários no Brasil, maior do que a base de qualquer grande banco, o WhatsApp teria disponibilizado a solução a 1,5 milhão de usuários, conforme revelou o Estadão/Broadcast, no dia do anúncio. A ideia do aplicativo é estender a novidade de forma gradual. A funcionalidade está sendo ofertada a usuários de cartões de débito e crédito das bandeiras Visa e Mastercard emitidos pelo Banco do Brasil, pela fintech Nubank e o Sicredi, sistema de cooperativas. Os pagamentos serão processados pela Cielo, líder do setor de maquininhas. 

Um dos pontos que gerou chiadeira no mercado foi justamente a composição dos parceiros. Fontes ouvidas pela reportagem sugerem que o movimento do WhatsApp foi exclusivo com o Banco do Brasil e, consequentemente, com a Cielo, da qual controla ao lado do Bradesco.

No entanto, pessoas próximas à estruturação do projeto alegam que demais competidores fizeram os testes. No caso dos bancos, além do BB, teriam participado ainda Bradesco, Santander e Itaú Unibanco. Segundo as fontes, porém, as instituições teriam deixado o projeto de lado, alegando que difícil conciliar o desenvolvimento da solução com os desafios impostos pelo isolamento social e a pandemia do novo coronavírus. Procurados, os bancos não comentaram. O Santander informou que "está avaliando". 

"Os grandes bancos adotaram uma postura bem defensiva, no sentido de evitar alimentar a cobra (gigante de tecnologia) que vai lhes morder o calcanhar", diz uma fonte próxima à autoridade monetária, na condição de anonimato. 

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Também há reclamações em torno de uma “eventual exclusividade” com a Cielo para o processamento dos pagamentos. Fontes, porém, negam que exista tal restrição no acordo com o WhatsApp. Assim como no caso dos bancos, para as maquininhas, o Facebook teria feito consultado possíveis fornecedores no ano passado, processo conhecido no jargão de mercado como RFI (do inglês, Request for Information)

A Cielo teria sido a escolhida para iniciar a solução. Porém, na ocasião, teriam sido consultados concorrentes da líder das maquininhas como Rede, do Itaú, Getnet, do Santander, Stone e a Adyen. Procuradas pela reportagem, as empresas não se manifestaram.

Há dúvidas sobre como Facebook deve ser regulado

A chegada do WhatsApp também levantou questionamentos sobre se o seu controlador, o Facebook, deveria ser regulado pelo Banco Central ou não. Há quem defenda que o aplicativo é quem origina as transações e, por isso, deveria se enquadrar como uma instituição de pagamentos. O tema gera opiniões diversas no mercado. Enquanto parte defende que a gigante passe pelo crivo da autoridade monetária, outros entendem que a estrutura de atuação, com agentes que já são regulados, eliminaria essa necessidade.

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"O Banco Central tem de questionar, entender. Está no seu papel, mas o WhatsApp desenvolveu uma solução integrando todos os elos da cadeia existentes hoje. São eles quem são os originadores", avalia o diretor de renda variável da Eleven Financial, Carlos Daltozo.

Para o sócio da área de Bancos, Meios de Pagamento e Fintechs do Focaccia, Amaral e Lamonica Advogados (FAS Advogados), Pedro Eroles, há preocupações sob a ótica da segurança e do sistema de meios de pagamentos instantâneos, o PIX. Esse, inclusive, teria sido uma das razões que desagradou o BC – que teme concorrência com a solução do WhatsApp. "O PIX surge em um processo de desconcentração e foi encabeçado pelo BC. A partir do momento que tem entrada de um player específico, com uma adesão de mercado enorme gera um fator de preocupação justamente de concentração no setor", avalia.

O WhatsApp também deve pressionar o BC a se posicionar em relação à regulação das gigantes de tecnologia. Diferentemente das fintechs, empresas como Facebook, Amazon e Apple não surgiram no setor de serviços financeiros, mas de uma outra forma de prestação de serviços tecnológicos. Agora, avançam para outras frentes, em busca de obter mais informações de seus usuários. "Depois de conhecer todo o seu perfil social, querem saber dos seus atos de consumo", explica o vice-presidente de um grande banco, na condição de anonimato.

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Em recente publicação, o BC avaliou que as gigantes têm ingressado de forma rápida no sistema financeiro nacional e que representam um 'grande desafio' para a regulação, conforme o Relatório de Economia Bancária (REB). Isso porque as possuem uma grande base de consumidores, fácil acesso a informações e modelos de negócio robustos.

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A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) está fazendo uma avaliação técnica da entrada do WhatsApp no mercado brasileiro de pagamentos. "Desconhecemos os detalhes da operação do WhatsApp e estamos fazendo uma avaliação técnica. Não temos como nos pronunciar agora. Estamos fazendo uma avaliação", disse o diretor setorial de Tecnologia e Automação Bancária da Febraban, Gustavo Fosse, em coletiva de imprensa, nesta tarde.

Consultado, o Cade informou que, até o momento, não há nenhum processo público sobre o caso. O BC manteve o mesmo posicionamento do dia do lançamento da solução do WhatsApp. A autoridade monetária afirmou que está 'vigilante' e considera 'prematura' iniciativas que possam gerar fragmentação de mercado e concentração em agentes específicos. "O BC vai ser vigilante a qualquer desenvolvimento fechado ou que tenha componentes que inibam a interoperabilidade e limite seu objetivo de ter um sistema rápido, seguro, transparente, aberto e barato", acrescentou.

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