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MPT planeja ações coletivas contra Uber e similares

Relatório distribuído a promotores pretende criar o entendimento de que prestação de serviço a aplicativos configura vínculo empregatício

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Por Matheus Mans
Atualização:
Em abril, aplicativo tinha 13 milhões de usuários no País Foto: PATRICIA CANCADO/ESTADAO

Após um ano de estudo, procuradores do Ministério Público do Trabalho (MPT) aprovaram um relatório, obtido com exclusividade pelo Estado, no qual afirmam que a prestação de serviços a aplicativos como Uber, Cabify, 99, Rapiddo e Loggi, configura vínculo empregatício de motoristas e motoboys. O MPT planeja usar o documento para embasar ações coletivas contra as empresas na Justiça do Trabalho.

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O relatório é fruto do “Grupo de Estudos Uber”, que reúne procuradores interessados no crescente número de ações contra o Uber. Apesar de ter sido elaborado antes da reforma trabalhista, o estudo levou em conta ações impetradas contra a companhia norte-americana, símbolo da chamada “economia do compartilhamento”, em países com realidades trabalhistas diferentes da brasileira.

Segundo os procuradores, Uber e similares não são parte da economia do compartilhamento e precisam arcar com as responsabilidades trabalhistas como qualquer companhia. “O que o Uber e outras empresas fazem é controle por aplicativo, criando um grupo de falsos autônomos”, afirma Rodrigo Carelli, procurador do MPT. “É preciso uma mudança, senão a sociedade vai pagar a conta no final.”

Para chegar a essa conclusão, em pouco mais de um ano, 11 procuradores do MPT examinaram oito ações coletivas contra o Uber em seis países, entre eles Estados Unidos, Espanha e Inglaterra. Além disso, estudaram quatro processos de motoristas brasileiros contra o Uber: em um deles, a Justiça reconheceu o vínculo empregatício, enquanto nos outros três, a Justiça foi favorável ao Uber. Eles também estudaram uma ação movida por um motoboy contra o aplicativo de entregas Rapiddo, no qual a Justiça deu ganho de causa ao profissional.

Aprovado em junho, o relatório foi distribuído a um amplo grupo de promotores do Ministério Público Federal. A expectativa é que eles entrem com ações coletivas na Justiça contra as empresas. Uber e Rapiddo, que já foram acionados individualmente, podem ser as primeiras a sofrer os processos. “Queremos embasar ações civis coletivas para que haja uma unificação de decisões da Justiça”, afirma Carelli.

Efeito. Caso as ações aconteçam em larga escala, o caso deve prejudicar o crescimento da “economia do compartilhamento” no Brasil, segundo especialistas. Deverá haver também novas discussões em relação à responsabilidade das empresas em outros itens, como danos aos veículos ou custos com combustível. “Isso dificulta a ampliação de economia colaborativa, que possibilita às pessoas o trabalho de forma autônoma”, diz Jorge Boucinhas, professor de direito trabalhista da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (FGV). “O modelo será gravemente afetado.”

Em outros países, o Uber tem sofrido as consequências de processos semelhantes. Nos EUA, uma ação coletiva iniciada em 2016 exige do Uber um pagamento de US$ 850 milhões. O Uber ofereceu US$ 100 milhões para fazer um acordo, mas o valor foi negado e o processo continua em aberto. Na Suíça, o órgão que administra seguro social decidiu, em 2016, que os motoristas são empregados do Uber, para fins previdenciários. A França também exigiu que o Uber pague multa por falta de reconhecimento de impostos previdenciários, mas o Uber recorreu. Hoje, a modalidade UberX, a mais popular do serviço, já não pode mais operar no país europeu.

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O relatório do MPT vai no mesmo sentido. “As novas relações que vêm ocorrendo através das empresas de intermediação por aplicativos, apesar de peculiares, atraem a plena aplicabilidade das normas de proteção ao trabalho subordinado, autorizando o reconhecimento de vínculo empregatício entre os trabalhadores e as empresas intermediadoras”, dizem os procuradores no relatório. Uber e os aplicativos de entregas Rapiddo e Loggi são citados várias vezes no documento, mas segundo apurou o Estado, Cabify e 99 também estão no alvo do MPT.

Como justificativa, os procuradores afirmam que há controle da jornada de trabalho dos profissionais, usando o caso do Uber como exemplo. “O trabalho dos motoristas é moldado pelo uso de práticas de vigilância pelo empregador para realizar um controle brando dos trabalhadores”, afirma o documento. “O aplicativo estimula motoristas a aceitarem todas as corridas e a permanecerem o maior tempo possível trabalhando.”

Reações. Procuradas, as empresas que podem ser afetadas se mostraram contrárias ao entendimento dos procuradores. “Os motoristas são clientes, que pagam taxa para ter acesso ao serviço”, disse a 99, em nota.

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O aplicativo de entregas Loggi informou que “já passou por dois procedimentos questionando seu modelo de negócio” e que a “conclusão foi pelo arquivamento pela inexistência das violações.” A Rapiddo disse que “a relação com fornecedores de serviços está muito distante de uma típica relação de emprego.”

O Cabify disse que “não existe qualquer procedimento administrativo conclusivo do MPT em relação à Cabify” e que “os condutores cadastrados não são prepostos da empresa”. Também em nota, o Uber afirmou que já venceu dez processos na Justiça do Trabalho no País e está recorrendo em outros dois. A empresa diz que não “contrata os motoristas, mas os motoristas que contratam o Uber” quando escolhem usar o aplicativo.

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