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Neutralidade da rede: tudo que você precisa saber sobre a polêmica nos EUA

Nesta quinta-feira, 14, nos Estados Unidos, acontece uma votação organizada pela agência reguladora de telecomunicações para revogar o princípio básico da internet; decisão pode afetar internet no mundo todo

Por Bruno Capelas e Carolina Ingizza
Atualização:
Ajit Pai, o presidente da agência reguladora de telecomunicações dos EUA, colocou a neutralidade da rede na mira Foto: Eric Thayer/NYT

A agência reguladora de telecomunicações dos Estados Unidos (FCC, na sigla em inglês) pretende realizar uma votação nesta quinta-feira, 14, para acabar com a neutralidade da rede no país – princípio básico da internet, a neutralidade da rede não permite que operadoras bloqueiem ou cobrem por tráfego diferenciado de internet dos usuários. O projeto de reforma nas regras é encabeçado por Ajit Pai, nomeado presidente da FCC em janeiro pelo presidente Donald Trump.

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Desde que a votação foi anunciada, empresas de tecnologia, como Google e Amazon, representadas pela Internet Association, e pioneiros da internet, como Tim Berners-Lee, pediram que a FCC adiasse a data para que os Estados Unidos pudessem organizar um novo debate. Ao longo do ano, a entidade fez uma consulta pública sobre o tema, mas descobriu-se em novembro que quase um milhão de comentários registrados foram feitos por meio de fraudes usando nomes de pessoas reais. Outros 500 mil teriam sido registrados por meio de e-mails russos. No entanto, Ajit Pai não cedeu à pressão.

No entanto, apesar das recentes polêmicas, o debate sobre neutralidade da rede ainda é um pouco restrito fora do mercado de tecnologia. Para tentar clarear as questões, o Estado preparou um guia com fatos importantes sobre o tema para ajudar o leitor que quer acompanhar o desenrolar da votação norte-america.

O que é neutralidade da rede?

Neutralidade da rede é um princípio básico da internet, um dos pilares para que a rede continue seja livre e aberta. A internet nada mais é que uma rede de múltiplos pontos de acesso que trocam informações entre si através de pacotes de dados. A neutralidade da rede prega que todos os pacotes de dados sejam tratados de forma igual pelas operadoras e provedores de internet.

Na prática, isso faz com que as operadoras não possam bloquear, aumentar ou reduzir a velocidade de determinados tipos de dado. Então não importa se o usuário está vendo Netflix ou mandando WhatsApp: os dados devem ser tratados de forma igual.

Isso significa que, sob a neutralidade da rede, as operadoras não podem cobrar mais para quem quiser utilizar determinados serviços, ou em instância última, reduzir a velocidade ou bloquear a conexão dos usuários. Além disso, as empresas não podem pagar às operadoras para ter preferência no pacote de dados – o que pode ser uma vantagem competitiva enorme. Para os defensores da neutralidade da rede, isso estimula a inovação e a competição livre no mercado.

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Como a neutralidade da rede funciona hoje nos Estados Unidos?

Preocupado com as diferenças econômicas que a internet sem neutralidade poderia trazer, o governo Obama, em 2015, aprovou regras que estabelecem que a neutralidade da rede é um princípio básico da internet. Por isso, as operadoras americanas estão proibidas de cobrar preços diferentes para acessos diferentes.

Por que o Governo Trump quer acabar com a neutralidade?

Ajit Pai, escolhido para presidir a FCC por Donald Trump, é próximo das operadoras de telefonia móvel e advoga abertamente contra a neutralidade da rede. Para ele, o princípio é uma forma de regulação muito pesada para as companhias. Durante o Mobile World Congress de 2017, inclusive, ele chegou a dizer que “a neutralidade da rede é um erro”.  

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Além disso, ele acredita que o modelo atual impede que pessoas de baixa renda acessem à internet. Em um universo sem neutralidade da rede, teoricamente, usuários poderiam comprar pacotes mais baratos, com acesso a poucos sites e plataformas, o que ampliaria o acesso à rede.

Na última segunda-feira, 11, Pai anunciou também que, se a revogação da neutralidade da rede for aprovada, ele pretende transferir a supervisão dos serviços de internet dos Estados Unidos à agência reguladora do comércio (FTC), o que alarmou ainda mais os defensores do princípio da internet.

Quem apoia e quem é contra a neutralidade da rede?

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Ativistas de direitos digitais, startups e empresas de tecnologia, de modo geral, são a favor da neutralidade da rede. Já as operadoras e os setores mais liberais da economia são contra a neutralidade, por acreditarem que se trata de uma regulação muito pesada, que limita as possibilidades de ganho das empresas. Operadoras locais, como a AT&T, a Verizon e a Comcast advogam contra a neutralidade nos Estados Unidos.

Já companhias como Amazon, Spotify, Google, Facebook, Twitter, Twitch, Netflix, Spotify, Airbnb e Snap já se manifestaram abertamente nos últimos meses contra a tentativa da FCC de acabar com a neutralidade. Elas argumentam que o fim do princípio iria dificultar a inovação no país, uma vez que sites pequenos precisariam pagar para as operadoras de telecomunicações para conseguirem ser acessados por usuários.

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Grandes nomes do mercado de tecnologia, como Steve Wozniak, cofundador da Apple, e Tim Berners-Lee e Vint Cerf, considerados pioneiros da internet, também se posicionaram a favor da neutralidade. Em carta conjunta, os pioneiros declararam que a FCC não entende como a internet funciona e que a entidade formulou sua proposta com base em erros.

Como a neutralidade da rede funciona no Brasil?

No Brasil, a neutralidade da rede é um dos princípios básicos do Marco Civil – é ela que impede que sua operadora cobre mais caro pelo fato de você baixar filmes um torrent ou assistir vídeos online.  No entanto, há uma discussão bastante cinzenta, que é a definição do que pode ou não ferir essa questão. No decreto de regulamentação do Marco Civil, foi definido que o Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) precisam ser ouvidos para essa discussão. No entanto, práticas como a do zero rating — em vez de o usuário pagar para acessar determinado serviço, as empresas subsidiam o custo dos dados, então determinados aplicativos não são descontados da franquia do consumidor — acontecem e ainda devem ser debatidas.

Por que a discussão dos EUA é importante para o Brasil?

O poder econômico e a influência da indústria de tecnologia dos Estados Unidos pode influenciar discussões globais, caso a neutralidade da rede seja revogada lá. No Brasil, apesar das regras já definidas no Marco Civil da Internet, talvez o debate sobre o tema reacenda questões já resolvidas. O exemplo internacional pode levar o setor de telecomunicações brasileiro a pressionar o governo por mudanças na norma local.

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*É estagiária, sob supervisão do repórter Bruno Capelas

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