O escândalo de propina que abalou um império
Herdeiro da Samsung foi preso, e governo da Coreia do Sul corre o risco de ser derrubado
07/03/2017 | 05h00
Por The New York Times - O Estado de S.Paulo
Favores. Jay Y. Lee é escoltado pela polícia: histórico de relação próxima com o governo
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Jay Y. Lee, herdeiro de um dos maiores impérios corporativos do mundo, seguiu os passos de seu proeminente pai. Assumiu o comando de empresas do grupo. É próximo do presidente coreano. Tinha novas ideias. Mas, como seu pai, foi acusado de infringir a lei. Lee, o líder de fato do grupo Samsung, foi indiciado num processo de suborno na semana passada e está envolvido em um escândalo político que abalou o país.
A imagem de um grande empresário algemado, escoltado pela polícia da prisão para se encontrar com promotores, enviou uma mensagem: a ordem econômica do pós-guerra da Coreia do Sul está ameaçada.
O episódio não é exatamente novidade. Desde os anos 1960, quando a Samsung foi apanhada contrabandeando adoçante, seus líderes têm sofrido consequências mínimas ao cometer ilícitos. Por duas vezes, o pai de Lee foi salvo da prisão por um presidente sul-coreano preocupado com a possibilidade de que uma mancha na reputação da Samsung poderia ferir a máquina econômica que fez a Coreia do Sul renascer das cinzas após a Guerra da Coreia.
Desta vez, no entanto, o desfecho pode ser diferente. O imbróglio político pode levar ao poder um novo grupo de líderes menos propenso a tratar os empresários de forma suave. O público está farto de crimes de colarinho branco. Além disso, a mistura única de empresas e política na Coreia do Sul está ficando cada vez mais insustentável numa era de competição acirrada com a China.
Agora, o chefe da Samsung e outros executivos são acusados de usar propina para consolidar sua posição. O escândalo pode derrubar o governo da Coreia do Sul e acarretar medidas mais duras contra as grandes empresas. Neste momento, os sul-coreanos acompanham de perto a trama de poder e intriga familiar. Ela inclui um patriarca enfermo, uma confidente ao estilo Rasputin da presidente (Park Geun-hye), um escritório suspeito da Samsung e uma alegada propina na forma de um cavalo.
O novo escândalo pode ser a chance para a Coreia do Sul cortar o cordão umbilical com a Samsung. “Não devemos perder esta oportunidade de cortar os laços corruptos entre política e negócios”, disse Moon Jae-in, parlamentar e líder da oposição, favorito a se tornar o próximo presidente. “Somente quando a Samsung se arrepender de seu conluio com a política, ela poderá se tornar mais forte.”
Mas Lee ainda pode sair ileso. Ele alega que não praticou suborno e que é vítima de extorsão. A Samsung afirma que não pagou propinas e que a verdade virá à luz no tribunal.
Ascensão. A Samsung está em transição. O grupo é líder global em televisores e smartphones, mas vai além disso. Fabrica e vende produtos tão variados como navios cargueiros e cartões de crédito. Suas empresas registram vendas de US$ 262 bilhões. Hoje, responde por 20% das exportações sul-coreanas.
Mas a gigante está sob pressão. O fracasso do smartphone Galaxy Note 7 manchou sua reputação. Rivais chineses estão produzindo telefones, TVs e eletrodomésticos mais baratos – e cada vez mais sofisticados. Sua empresa de construção naval está dispensando pessoal.
Fundada pelo avô de Lee como uma loja de peixes e hortaliças em 1938, a Samsung – que significa três estrelas – se ramificou em novas empresas após a Guerra da Coreia, incluindo têxteis, açúcar, álcool. Em 1969, chegou aos eletrônicos.
A expansão foi parcialmente financiada pelo governo. O então ditador Park Chung-hee queria transformar a Coreia do Sul em um país industrial de capacidade exportadora. Ao mesmo tempo, Park enfrentava pressões da população para endurecer com empresas que lucravam com os esforços para reanimar a economia.
Os dois lados chegaram a um acordo. Park permitiu que o avô de Lee conservasse sua fortuna. Em troca, os exortou a transformar a Coreia do Sul numa potência exportadora, com o auxílio de financiamentos baratos do governo. Isso deu origem ao “chaebol”, a parceria entre governo e empresas no país.
O pai de Jay Y. Lee, Lee Kun-hee, assumiu a Samsung após a morte de seu pai, Lee Byung-chull, em 1987. Na época, a Coreia do Sul havia se tornado a mais bem-sucedida economia da Ásia, mas seus produtos eram vistos como baratos e de má qualidade no exterior. No esforço para mudar essa imagem, Kun-hee ateou fogo em milhares de telefones da marca que apresentaram defeitos em 1995.
O esforço funcionou. Hoje, a Samsung é uma das poucas fabricantes de eletrônicos capaz de pedir preços especiais por seus televisores, smartphones e eletrodomésticos.
No entanto, ao longo do tempo, a Samsung também se viu envolvida em alguns dos maiores escândalos de corrupção da Coreia do Sul. Lee Kun-hee foi condenado duas vezes, primeiro por suborno e depois por evasão fiscal. Ele só escapou da prisão porque recebeu perdão presidencial.
Em 2014, Kun-hee sofreu um ataque cardíaco e desapareceu das vistas do público. A Samsung disse que ele está incapacitado, mas não fornece detalhes. Graças a um poderoso grupo de executivos e consultores, o controle da família Lee sobre a Samsung permaneceu intacto. / TRADUÇÃO DE CELSO PACIORNIK
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