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Opinião|O Google pensa sobre política

O discurso do Google está alinhado com a nova postura do Vale do Silício

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Críticos vêm se queixando de que quem consome conteúdo político na plataforma é rapidamente apresentado a vídeos com discurso de ódio Foto: Alain Jocard/AFP

Na última quarta, o YouTube anunciou uma mudança de impacto em suas políticas internas. Canais ou mesmo vídeos individuais que promovam a superioridade de um grupo humano sobre o outro, e que usem este argumento para justificar preconceito de alguma forma, serão extirpados do sistema. Enquanto o anúncio era feito, o vice-presidente de política global, e responsável geral pelo Jurídico do Google, estava a caminho do Brasil para o evento anual da companhia no País.

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“Estamos fazendo uma aposta nos quatro Rs”, explica Kent Walker. “Remover conteúdo radical, Reduzir a recomendação de conteúdo fronteiriço, Reconhecer fontes com autoridade sobre cada tema, e Premiar, permitindo monetização, aquilo que contribui para a melhora do ambiente.” Premiar, em inglês, é Reward.

Walker, que também é membro do prestigioso Council of Foreign Relations, é quem costuma depor perante o Congresso americano para explicar as políticas da empresa. A mudança que ele aponta é grande e atinge a lógica de como o YouTube funciona. Críticos vêm se queixando de que quem consome conteúdo político na plataforma é rapidamente apresentado a vídeos com discurso de ódio, ou carregados de teorias conspiratórias, e tudo recomendado pelo próprio sistema. Como uma das principais fontes de informação do mundo online, o YouTube estaria assim contribuindo para o aumento do número de radicais em democracias. Agora, os piores serão removidos. Os outros não serão recomendados, assim como não haverá mais incentivo financeiro.

Não é um equilíbrio fácil. Afinal, à direita surgem outros críticos. Estes sugerem que não só o Google, mas todas as empresas do Vale, se portam de maneira cínica. Que, no fim, quem perde espaço é sempre a direita. Acusam censura. “O que dizemos, sempre, é que se num caso pareceu partidário, preste atenção nos casos do outro lado.” Os critérios do que pode ou não, defende Walker, são públicos. E os algoritmos são cegos, equações matemáticas que encontram o que buscam independentemente da cor das bandeiras.

“Metade dos funcionários do Google são engenheiros. Nossos processos internos todos são baseados em análise de dados e nosso trabalho é levar estes dados a quem toma decisões.” A decisão pode ser sobre onde jantar hoje à noite. Mas pode ser, também, como regular as novas tecnologias. O discurso do vice-presidente do Google está alinhado com a nova postura do Vale do Silício: sob pressão de parlamentos mundo afora, também perante as crescentes turbulências políticas, agora defende regulação.

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“Aumentou muito a quantidade de informação circulando no mundo e isso transforma as estruturas sociais”, ele reflete. “É natural que venham novas leis para nos ajustar a esta realidade. Quando eu era pequeno, tinha acesso a um jornal, três canais de TV e a revista Time uma vez por semana. Meus filhos, com o Google Tradutor, podem ler qualquer jornal do mundo.”

Quando democracias surgiram, informação circulava de  duas formas. Ou alguém falava — e aí só um número pequeno de pessoas podia ouvir. Ou algo era impresso, e embora alcançasse um público maior, a digestão do conteúdo era naturalmente lenta. O século 20 apresentou o rádio e a TV, permitindo que uma pessoa falando pudesse alcançar multidões instantaneamente. O tempo das redes sociais muda muito o jogo. “Tínhamos modelos para pensar sobre comunicação de um para muitos ou de um para um, agora estamos perante uma conversa de muitos para muitos que ocorre de forma persistente.”

Os efeitos, na economia e na política, já estão sendo sentidos. Encontrar um novo equilíbrio não será fácil. Ou rápido.

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