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Elon Musk e Twitter: Batalha judicial deve ser próximo capítulo da ‘novela’

A maioria dos especialistas jurídicos diz que o Twitter tem a vantagem, mas Musk se diverte com a situação

Por Lauren Hirsch and Kate Conger
Atualização:
Twitter recebeu oferta deUS$ 44 milhões para a venda da plataforma para Elon Musk Foto: REUTERS/Dado Ruvic

Agora que Elon Musk sinalizou a intenção de desistir da oferta de US$ 44 bilhões para comprar o Twitter, o destino da influente rede de mídia social será determinado pelo que pode ser uma batalha judicial épica, envolvendo meses de litígios caros e negociações de alto risco por advogados de elite de ambos os lados.

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A questão é se Musk será legalmente obrigado a manter o acordo para a aquisição ou se será autorizado a desistir, possivelmente com uma multa de 10 dígitos.

A maioria dos especialistas jurídicos diz que o Twitter tem vantagem, em parte porque Musk atribuiu algumas restrições ao seu acordo para comprar a empresa, e a plataforma está determinada a forçar o acordo.

Musk, porém, se diverte com impulsividade e arrogância nessa história e é apoiado por um conjunto de banqueiros e advogados importantes. Em vez de se envolver em uma prolongada briga pública com o homem mais rico do mundo e suas legiões de seguidores obstinados, o Twitter pode ficar sob pressão para encontrar uma solução rápida e relativamente pacífica – uma que possa preservar a independência da empresa, mas deixá-a em uma posição financeira decente.

Mike Ringler, sócio da Skadden, Arps, Slate, Meagher & Flom, escritório de advocacia que representa Musk, informou ao Twitter na sexta-feira, 8, que seu cliente estava abandonando a negociação. Ringler argumentou em sua carta que o Twitter violou o acordo com Musk ao não fornecer a ele informações detalhadas sobre como mede contas inautênticas. Ele também disse que Musk não acreditava nas métricas que o Twitter divulgou publicamente sobre quantos de seus usuários eram falsos.

O conselho do Twitter respondeu dizendo que pretendia concluir o processo de aquisição e processaria Musk em um tribunal de Delaware para que ele fosse forçado a fazê-lo.

No centro da disputa estão os termos do acordo de fusão que Musk acordou com o Twitter em abril. Seu contrato com a rede do passarinho permite que ele rescinda o acordo pagando uma taxa de US$ 1 bilhão, mas apenas em circunstâncias específicas, como perder o financiamento da dívida. O acordo também exige que o Twitter forneça dados que Musk possa exigir para concluir a transação.

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Nessa questão, Musk exigiu que o Twitter fornecesse um levantamento detalhado de contas consideradas “spam” em sua plataforma. Ao longo de junho, os advogados de Musk e do Twitter discutiram sobre quantos dados compartilhar para satisfazer as perguntas do bilionário.

A frieza de Musk sobre o acordo com o Twitter coincidiu com uma enorme queda na avaliação de empresas de tecnologia, incluindo a Tesla, a empresa de veículos elétricos da qual é presidente e que também é sua principal fonte de riqueza. Musk não respondeu a um pedido de comentário.

O Twitter sustenta que seus números de spam são precisos, mas se recusou a detalhar publicamente como detecta e contabiliza contas de spam. Isso porque usa informações privadas como números de telefone dos usuários e outras pistas digitais sobre suas identidades, para determinar se uma conta é ou não autêntica. Um porta-voz do Twitter se recusou a comentar sobre em que momento a plataforma planejava processar Musk para forçar o acordo de fusão.

“As conclusões são: o tribunal diz que Musk pode sair fora”, disse David Larcker, professor de contabilidade e governança corporativa da Universidade de Stanford. “Outra conclusão é que Musk é forçado a seguir com o acordo, e o tribunal pode impor isso. Ou pode haver algum meio-termo em que haja uma renegociação de preços.”

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Necessidade

Para o Twitter, concluir a venda para Musk é vital. Ela fechou o acordo com Musk enquanto outras empresas de tecnologia desfrutavam de avaliações otimistas; agora, alguns, como Snap e Meta, holding do Facebook, despencaram ao enfrentarem pressão publicitária, agitação econômica global e inflação crescente. Os papéis do Twitter caíram cerca de 30% desde que o acordo foi anunciado e são negociados bem abaixo do preço de oferta de Musk, de US$ 54,20 por ação.

Especialistas jurídicos disseram que a disputa de Musk em relação às contas spam pode ser uma manobra para forçar o Twitter a voltar à mesa de negociações, na esperança de garantir um preço mais baixo.

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Durante a negociação, nenhum outro comprador em potencial surgiu como uma alternativa de cavaleiro branco a Musk, tornando sua oferta a melhor que o Twitter provavelmente receberá.

O trunfo do Twitter é uma “cláusula de desempenho específica”, que dá para a empresa o direito de processar Musk e forçá-lo a concluir ou pagar pelo acordo, desde que o financiamento da dívida que ele tenha levantado permaneça intacto. Aquisições forçadas já aconteceram antes: em 2001, a Tyson Foods tentou desistir de uma aquisição do frigorífico IBP, apontando problemas financeiros e irregularidades contábeis da IBP. Um vice-chanceler da corte de Delaware decidiu que Tyson tinha que concluir a aquisição.

Burocracia

Mas a autoridade legal é diferente da realidade prática. Uma ação judicial provavelmente custará milhões em taxas legais, levará meses para ser resolvida e vai adicionar ainda mais incerteza aos funcionários já ansiosos.

Desentendimentos de negócios muitas vezes terminaram em acordos ou renegociações de preço. Em 2020, a gigante de luxo LVMH Moët Hennessy Louis Vuitton tentou romper seu acordo de US$ 16 bilhões para adquirir a Tiffany & Company, garantindo um desconto de cerca de US$ 420 milhões.

“Esse negócio é um movimento de barganha em uma transação econômica”, disse Charles Elson, um professor recém-aposentado de governança corporativa da Universidade de Delaware. "É tudo sobre dinheiro."

Um preço mais baixo beneficiaria Musk e seus financiadores, especialmente porque o Twitter enfrenta dificuldades financeiras. Mas o Twitter deixou claro que quer forçar Musk a manter sua oferta de US$ 44 bilhões.

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O resultado mais prejudicial para o Twitter seria o colapso do acordo. Musk precisaria mostrar que o Twitter violou material e rompeu intencionalmente os termos de seu contrato, uma barreira alta que os candidatos à compra raramente cumprem.

Um comprador argumentou apenas uma vez com sucesso, em um tribunal de Delaware, que uma mudança material nos negócios da empresa-alvo lhe dava a capacidade de sair do negócio de forma limpa. Isso ocorreu em 2017, na aquisição de US$ 3,7 bilhões da empresa farmacêutica Akorn pela empresa de saúde Fresenius Kabi. Depois que a Fresenius assinou o acordo, os ganhos da Akorn caíram e ela enfrentou alegações de um delator de contornar os requisitos regulatórios.

Mesmo que o Twitter mostre que não violou o acordo de fusão, um chanceler no tribunal de Delaware ainda pode permitir que Musk pague a multa e saia do negócio, como no caso do acordo da Apollo Global Management combinando as empresas químicas Huntsman e Hexion em 2008. (Os processos foram concluídos em um acordo quebrado e uma multa de US$ 1 bilhão.)

Forçar um comprador a adquirir uma empresa é um processo complicado de supervisionar, e um chanceler pode não querer ordenar a um comprador que faça algo que ele não cumpra, um risco que é particularmente agudo neste negócio, dado o hábito de desrespeitar os limites legais.

“O pior cenário para o tribunal é que ele dê uma ordem e Musk não cumpra, e eles precisem descobrir o que fazer a respeito”, disse Morgan Ricks, professor da Vanderbilt Law School.

Embora Musk normalmente dependa apenas de um pequeno círculo de relacionamento para administrar seus negócios, que inclui a fabricante de foguetes SpaceX, para a negociação com o Twitter, o bilionário trouxe uma equipe jurídica maior para supervisionar a aquisição. Além de seu advogado pessoal, Alex Spiro, ele contratou advogados do escritório Skadden, Arps, Slate, Meagher & Flom. Skadden é um escritório de advocacia corporativo de referência, com ampla experiência na discussão de casos no tribunal de Delaware, incluindo a tentativa da LVMH de interromper a aquisição da Tiffany.

Por sua vez, o Twitter contratou advogados de duas firmas, Wilson Sonsini Goodrich & Rosati e Simpson Thacher & Bartlett, para administrar o negócio. Wilson Sonsini é consultor jurídico de longa data do Twitter, que construiu sua reputação em negócios de capital de risco e tecnologia. Simpson Thacher é um escritório de advocacia sediado em Nova York com mais experiência em fusões e aquisições corporativas em geral.

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Se o Twitter renegociar seu preço de aquisição ou aceitar uma separação, provavelmente enfrentará mais problemas legais. Os acionistas iriam processar em qualquer um dos cenários, somando-se a vários processos de acionistas que o Twitter já está enfrentando sobre a aquisição. Em abril, analistas financeiros chamaram o preço de Musk de uma oferta baixa, e os acionistas do Twitter podem recusar o negócio se a empresa concordar em reduzir ainda mais seu preço de aquisição.

Uma separação também pode trazer mais escrutínio legal a Musk. A Securities and Exchange Commission (SEC), órgão regulador do mercado de ações americano, revelou em maio que estava examinando as compras de ações do Twitter por Musk e se ele divulgou adequadamente sua participação e suas intenções para a empresa de mídia social. Em 2018, o regulador garantiu uma multa de US$ 40 milhões para Musk e para a Tesla, depois que o bilionário publicou no Twitter que havia garantido financiamento para tornar a Tesla uma empresa privada. A alegação era falsa e equivalia a fraude de valores mobiliários.

“No final das contas, um acordo de fusão é apenas um pedaço de papel. E um pedaço de papel pode dar a você uma ação judicial se seu comprador ficar com medo”, disse Ronald Barusch, advogado aposentado de fusões e aquisições que trabalhou para a Skadden Arps antes de representar Musk. “Um processo não lhe dá um acordo. Geralmente dá uma dor de cabeça prolongada. E uma empresa danificada.”

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