Quem é a Tencent, a ‘discreta’ gigante de tecnologia da China

Estratégia. Segunda maior companhia de tecnologia da Ásia, chinesa estreou no Brasil na semana passada, ao investir US$ 180 milhões no Nubank; com negócios em vários países, empresa, no entanto, é pouco conhecida no exterior por não colocar sua marca nas aquisições

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Por Mariana Lima
Atualização:
Potência asiática. Grupo é o segundo maior conglomerado de tecnologia da China Foto: Reuters

Existe uma premissa no mercado de tecnologia: quanto mais inserida no dia a dia dos usuários, mais forte é a companhia. Foi seguindo essa regra – com negócios que vão de aplicativos de pagamento e mensagens instantâneas a redes sociais – que a chinesa Tencent se tornou, em 20 anos, o segundo maior conglomerado de tecnologia do país, atrás apenas do Alibaba. Avaliada em US$ 348 bilhões, a gigante asiática estreou na semana passada no mercado brasileiro: com um aporte de US$ 180 milhões no Nubank, transformou a fintech na startup mais valiosa da América Latina.

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No cardápio de negócios oferecido pela Tencent aos chineses há o QQ, um aplicativo de mensagem instantânea tão popular no país como o WhatsApp é hoje no Brasil, a Tencent Music, maior plataforma de streaming de música, semelhante ao Spotify no mundo, e o WeChat, aplicativo que funciona como hub de rede social, mensagens instantâneas e meios de pagamentos digitais.

Além dos produtos próprios, a empresa chama a atenção por ser uma forte investidora. Estima-se que o seu fundo, a Tencent Holdings, tenha investido US$ 30 bilhões em empresas pelo mundo entre 2015 e 2017. Na lista de companhias globais que receberam aportes há nomes como Spotify, Snap e Tesla – além de inúmeros estúdios de games, como Ubisoft e Activision. 

Apesar do tamanho e da influência no mercado chinês, a empresa é pouco conhecida fora do país natal, muito em razão de sua estratégia de expansão. “A Tencent tem se expandido pelo mundo por meio de investimentos e aquisições de empresas e opta por não trocar a marca já existente”, explica Eduardo Tomiya, presidente da Kantar Consulting para América Latina, cujo último ranking BrandZ Top 100 Global mostrou a empresa como a marca mais valiosa na China e a quinta do mundo – muito por conta do tamanho da população chinesa. 

Trajetória. A história da companhia teve início em 1998, quando Ma Huateng, então funcionário de uma em empresa de telecomunicação, decidiu copiar o famoso programa de troca de mensagens instantâneas de Israel, o ICQ. Em um ano, sua versão, o ICQO, já tinha 1 milhão de usuários ativos e foi alvo de interesse do governo, que se tornou sócio da companhia. Em 2004, já rebatizada como Tencent, a empresa abriu capital em Hong Kong, garantindo até o ano passado um retorno de 67.000% aos acionistas e transformando Huateng no homem mais rico da China.

O momento, no entanto, não é dos melhores para a companhia, que perdeu US$ 200 bilhões em valor entre janeiro e outubro. O revés começou no início do ano, quando investidores passaram a se preocupar com avaliações inconsistentes das empresas de tecnologia, derrubando as ações do setor em todo o mundo. 

Em seguida, o anúncio de que teria margens menores de lucro desencadeou uma onda de venda dos papéis da empresa. E, por fim, começou a sofrer com o aumento das restrições regulatórias para a aprovação de lançamento de jogos na China, que precisa do aval do governo. As regras mais duras fizeram a companhia registrar no segundo trimestre a primeira queda no lucro em dez anos.

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Emergentes. Apesar do 1 bilhão de consumidores do mercado interno, é no Ocidente que está a aposta da empresa para continuar crescendo – em especial nos países emergentes. Para Otto Nogami, professor de economia do Insper, o foco nesses países é uma tendência entre as chinesas. “Elas demoraram para sair do país, mas agora querem ganhar espaço em mercados até então dominados pelos EUA”, diz. “A favor delas, pesa o preço mais baixo, fator crucial nos emergentes.”

Do aporte na brasileira Nubank, anunciado na terça-feira, US$ 90 milhões serão investidos na empresa, enquanto outros US$ 90 milhões serão usados para comprar a participação de acionistas – ao todo, a chinesa deve ficar com cerca de 5% da fintech.

Para Miguel de Carvalho, pesquisador do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o investimento na startup brasileira é movido pelo interesse dos chineses em estarem presentes em setores estratégicos. “No Brasil, a atuação chinesa é forte em áreas como petróleo e energia. Com o investimento da Tencent (que tem 40% de seu capital nas mãos do governo), os chineses abrem caminho para se posicionarem no mercado financeiro.” 

O aporte da Tencent é o terceiro grande investimento dos chineses no setor de tecnologia brasileiro neste ano. Em janeiro, a Didi Chuxing comprou o controle da 99, startup de mobilidade urbana, por US$ 600 milhões. No mês passado, foi a vez do fundo GGV aportar US$ 63 milhões na startups de bicicletas Yellow. 

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