Samsung tropeça na corrida do recall do Galaxy Note 7

Com risco da bateria explodir, agências reguladoras de aviação recomendam que o smartphone não seja ligado durante os voos

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Por Su-Hyun Lee e Paul Mozur
Atualização:
 Foto: Reuters

Todos esperavam que o recall fosse dramático - mas rápido.

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Há duas semanas, a Samsung disse que faria o recall de 2,5 milhões de unidades de seu novo smartphone de ponta, o Galaxy Note 7, dias depois de alguns consumidores terem dito que seus aparelhos pegaram fogo. O recall é o maior da história da indústria dos smartphones, mas a Samsung também foi elogiada por alguns analistas por sua rapidez e prontidão em agir.

Hoje, esse recall não parece nada ágil.

Nos dias recentes, autoridades reguladoras da segurança nos Estados Unidos alertaram consumidores a não ligarem seus aparelhos Note 7 em aviões - e nem mesmo usar o telefone, independentemente da finalidade. A agência reguladora de aviação sul-coreana voltou atrás e adotou a mesma proibição, seguindo o exemplo de suas semelhantes ao redor do mundo.

Os constantes lembretes do potencial de combustão afetaram ainda mais a reputação da Samsung, resultando em redução de até US$ 14 bilhões no valor de mercado da empresa, justamente quando esta parecia estar reagindo à antiga rival, Apple, com a nova linha de smartphones Galaxy. Também há dúvidas quando a possibilidade da pressa da empresa em retirar os aparelhos do mercado ter criado mais problemas.

Especialistas dizem que isto levou a uma iniciativa mal executada que confundiu o consumidor, frustrou as autoridades e continuou a atrair manchetes na imprensa americana e coreana. Dados da empresa de análise da indústria Apteligent mostram que o recall da Samsung fez as pessoas pararem de comprar o aparelho, mas a maioria dos donos de celulares afetados continua a usá-los.

“Pensei, ‘Como pode acontecer isso?’”, disse Jennifer Schecter, porta-voz do grupo de defesa do consumidor Consumer Reports, sem fins lucrativos. Ela disse que o grupo encontrou uma resposta inconsistente para o recall no território americano, com algumas lojas e operadoras oferecendo os celulares mesmo dias após o anúncio da Samsung.

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“A Samsung anunciou o recall, mas o governo não estava envolvido, a mensagem não foi clara, não havia uma solução aprovada e nem uma forma garantida de conserto”, disse ela.

Uma porta-voz da Samsung não quis comentar os debates com reguladores, destacando apenas um pronunciamento da empresa afirmando que estava trabalhando com a Comissão de Segurança dos Produtos ao Consumidor dos EUA.

O recall é um constrangedor revés para a Samsung, ícone da inovação sul-coreana que responde por um quinto das exportações do país. Sua importância pode levar as autoridades reguladoras a serem complacentes, dizem os especialistas.

A agência reguladora da aviação coreana recomendou na semana passada que os passageiros não usassem nem carregassem a bateria de seus celulares Note 7 nos voos somente depois de a Administração Federal da Aviação dos EUA ter feito a mesma recomendação. As agências da Europa, Japão, Índia e outros países emitiram notificações semelhantes.

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A situação é “lamentável”, disse Kang Jeong-hyeon, vice-diretor da divisão de normas de voo do Ministério Sul-Coreano das Terras, Infraestrutura e Transporte. Ele disse que o ministério não agiu de imediato porque a Samsung afirmou que os riscos eram administráveis.

Mas, quando os americanos fizeram sua recomendação, a Coreia do Sul não teve escolha senão segui-la, disse Kang. “Como autoridade do país da sede da empresa responsável pelo produto, o ministério ficou preocupado com as repercussões caso fosse o primeiro a proibir os aparelhos nos aviões”, disse ele. A Samsung confirmou que representantes da empresa se reuniram com o ministério, mas nada comentou além disso.

As autoridades coreanas responsáveis pela segurança do consumidor dizem que os esforços da empresa estiveram de acordo com a legislação sul-coreana, e a Samsung adotou medidas adicionais nos dias mais recentes para minimizar o estrago. Essa semana a empresa tornou disponível uma atualização de software que impede o Note 7 de carregar a bateria até o final, diminuindo o risco de superaquecimento. A Samsung também comprou espaço na mídia americana e sul-coreana.

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A Samsung não revelou informações específicas a respeito de quantos aparelhos afetados estão em circulação em quais mercados, mas muitos dos celulares em questão foram provavelmente vendidos em mercados fundamentais para onde a empresa envia seus produtos primeiro, como Estados Unidos, Coreia do Sul e países europeus como Grã-Bretanha.

Nos EUA, a Comissão de Segurança dos Produtos ao Consumidor exige que as empresas a notifiquem dos defeitos e coordenem com ela os avisos públicos de recalls. A comissão também pede às empresas que trabalhem no sentido de determinar como avisar os consumidores e coordenar a melhor maneira de fazer a substituição ou devolução dos produtos defeituosos.

Mas no dia 2 de setembro, quando a Samsung anunciou que substituiria 2,5 milhões de unidades do Note 7, a empresa emitiu o comunicado por conta própria. Foi criado um site dizendo aos usuários do Note 7 que voltassem ao local de compra do celular ou entrassem em contato com o atendimento telefônico.

A agência americana ainda não emitiu um anúncio formal de recall. Em pronunciamento do dia 9 de setembro, foi feito aos consumidores o alerta para simplesmente não usarem o celular. Também foi dito que a Samsung e a comissão estavam preparando o anúncio oficial de um recall.

Em hong Kong, a Samsung disse inicialmente aos consumidores que estes não seriam afetados porque os modelos vendidos ali usavam uma bateria diferentes. No dia seguinte, a empresa disse que cerca de 500 unidades acabariam afetadas.

Especialistas dizem que o desejo da Samsung de lidar rapidamente com o problema pode ter criado a confusão. Kim Jinbaek, professor da Faculdade de Administração da Universidade Chung-Ang, em Seul, e ex-funcionário da Samsung, citou o exemplo da Toyota Motor no Japão, criticada a partir de 2009 por sua lentidão naquele que se tornaria um grande recall de segurança. Na época, disse Kim, a Toyota negociou com as autoridades reguladoras americanas.

“A Samsung, por sua vez, decidiu não esperar por tal coordenação”, disse ele.

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Aumentando a confusão, a Samsung disse no pronunciamento inicial que os celulares seriam substituídos, evitando o uso da tóxica palavra “recall”. A empresa também demorou em avisar os consumidores para não usarem o celular, o que só foi feito no dia 10 de setembro.

Os próprios funcionários da Samsung pediram à empresa num fórum eletrônico interno que agisse rapidamente, de acordo com reportagens da mídia local confirmadas pela companhia. O serviço permite que os funcionários publiquem mensagens anônimas.

“Queremos tomar a melhor decisão para não termos que nos envergonhar diante dos consumidores que usam os aparelhos Galaxy”, dizia uma mensagem.

“A empresa deve muito aos consumidores de participaram da pré-venda dos celulares“,dizia outra. “Nosso futuro depende de como vamos tratar esses consumidores fiéis.”

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