Zuckerberg se esquiva de perguntas específicas e gera 'climão' no Parlamento Europeu

Em audiência que durou pouco mais de uma hora, fundador e presidente do Facebook enfrentou perguntas duras de parlamentares, que terminaram sessão frustrados por não terem suas questões respondidas

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Por Claudia Tozzeto
Atualização:
Mark Zuckerberg é presidente e fundador do Facebook Foto: EBS/ AFP

O fundador e presidente executivo do Facebook, Mark Zuckerberg, enfrentou uma sabatina dura nesta terça-feira, 22, em uma audiência no Parlamento Europeu. Durante quase 50 minutos, os parlamentares questionaram o executivo sobre o monopólio do Facebook, a disseminação de notícias falsas na rede social e sobre o uso da plataforma para interferência em eleições. Ao final da audiência, contudo, ficou evidente o "climão", uma vez que os parlamentares ficaram visivelmente frustrados depois que Zuckerberg agrupou suas perguntas em tópicos, evitando respondê-las uma a uma. Alguns tentaram retomar perguntas, mas o executivo disse que preferiria respondê-las por escrito posteriormente.

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O modelo da audiência no Parlamento Europeu hoje, que foi transmitida ao vivo pela internet por meio do site do Parlamento Europeu e do Facebook, foi bastante diferente das audiências na Câmara dos Deputados e no Senado. Com o novo marco legal de proteção de dados pessoais da União Europeia (GDPR) prestes a entrar em vigor, os parlamentares estavam mais preparados para fazer perguntas técnicas ao presidente do Facebook do que seus colegas americanos -- que acabaram sendo criticados por fazer perguntas que levaram Zuckerberg a ter de explicar como o Facebook e a internet funcionam.

Contudo, o modelo adotado para a sessão no Parlamento Europeu -- em que todos os parlamentares tiveram cerca de três minutos para dizerem suas questões em seguida, deixando as respostas para o final -- prejudicou o resultado. Ao fim das questões, Zuckerberg parecia confuso em relação às perguntas, embora tenha feito anotações durante a sessão. Assim, acabou adotando a estratégia de aglutinar as perguntas em tópicos, como concorrência, notícias falsas, eleições, contas falsas, e resumiu sua visão sobre o assunto, escapando de questionamentos específicos dos parlamentares.

Em diversos momentos em sua resposta aos questionamentos, Zuckerberg repetiu seu discurso de abertura, em que enumerou as ações que o Facebook vem tomando para resolver os problemas, como a suspensão de 200 aplicativos suspeitos e a criação de uma nova central de privacidade. "Não fizemos o suficiente para impedir que nossa plataforma fosse usada para o mal", afirmou Zuckerberg. "Não tivemos uma visão abrangente sobre a nossa responsabilidade. Foi um erro e peço desculpas."

Perguntas. Durante a audiência, muitas perguntas específicas foram feitas. O parlamentar alemão Manfred Weber, por exemplo, perguntou se Zuckerberg poderia garantir que outros escândalos, como o que envolveu a consultoria britânica Cambridge Analytica, fossem revelados daqui a seis ou nove meses. Além disso, ele questionou Zuckerberg sobre por que o executivo tomou a decisão, em 2015, de não notificar os 87 milhões de usuários que tiveram seus dados pessoais coletados indevidamente pelo desenvolvedor Aleksandr Kogan e vendidos à Cambridge Analytica.

Syed Kamall, que representa o Reino Unido, focou nas pessoas que não têm contas do Facebook, mas ainda assim têm seus dados de navegação coletados pela rede social por meio de plug-ins sociais instalados em sites. "Se eu não tenho uma conta do Facebook, a única forma de evitar que o Facebook colete meus dados é não usar a internet?", questionou. "É moralmente aceitável que o Facebook colete dados de pessoas que não usam seu serviço?"

Os fortes questionamentos seguiram. Guy Verhofstadt, que representa a Bélgica, comparou Zuckerberg ao protagonista do livro "O Círculo", de Dave Eggers, que conta a história de uma empresa de tecnologia poderosa. Ele afirmou que a diferença é que Zuckerberg não é tão poderoso, já que pede desculpas repetidamente. "Só nesse ano, você já pediu desculpas três vezes... Você é capaz de resolver os problemas? A única forma que eu vejo que será possível consertar (o Facebook) será com regulação pública", afirmou o parlamentar. "É como aconteceu com os bancos em 2007 e 2008. Eles diziam que poderiam se autoregular, mas eles não conseguiram."

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A audiência também teve uma série de perguntas a respeito de se o Facebook estaria pronto a atender a GDPR a partir da próxima sexta-feira, 25. O executivo, quando abordou o assunto, respondeu que "esperava que sim". Jan Philipp Albrecht, parlamentar alemão que atuou ativamente na construção do texto da GDPR, fez vários questionamentos, que não foram respondidos por Zuckerberg. "Você pode prometer para a União Europeia e para os usuários do Facebook e do WhatsApp que não haverá nenhum tipo de intercâmbio de dados entre os dois serviços a partir desta sexta-feira?", questionou.

Reação. Após o término da audiência, especialistas em privacidade e outros parlamentares que não estavam na audiência manifestaram sua frustração com o resultado.

Damian Collins, membro do Comitê de Digital, Cultura, Mídia e Esportes do Parlamento Europeu, afirmou em seu perfil no Twitter que o Parlamento Europeu perdeu uma oportunidade. "Uma hora de perguntas seguida de uma longa declaração de Zuckerberg e ele não respondeu a nenhuma pergunta", disse. "O formato [da sessão] foi aprovado pelo Facebook e não levou a nenhuma apuração real."

"O formato da audiência no Parlamento Europeu e o comportamento dos deputados foram estabelecidos de forma a tornar Zuckerberg o vencedor claro e unânime, às custas dos cidadãos europeus", afirmou Lukasz Olejnik, pesquisador europeu independente em segurança e privacidade, que foi consultor do Parlamento Europeu durante o desenvolvimento da GDPR, que entra em vigor na próxima sexta-feira, 25.

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