PUBLICIDADE

Desafiador, indie Celeste é o primeiro grande jogo de 2018

Game combina forma e conteúdo de forma graciosa ao usar desafios de jogos de plataforma e exploração para falar sobre depressão

Por Bruno Capelas
Atualização:
Game tem participação dos brasileiros da MiniBoss Foto: Matt Makes Games

Um jogo que, ao mesmo tempo, te desafia e te dá um abraço. Que é, ao mesmo tempo, simples de explicar e dificílimo de superar. E que através de uma metáfora nada complexa, é capaz de construir uma grande narrativa sobre um dos maiores problemas contemporâneos – a depressão. Este é Celeste, grata surpresa do estúdio Matt Makes Games, do canadense Matt Thorson, feito com a colaboração dos brasileiros da Miniboss. Lançado em janeiro para diversas plataformas, Celeste é o que se pode chamar de um game especial. 

PUBLICIDADE

À primeira vista, é fácil não dar bola para o jogo: com gráficos retrô (em pixel art, como convém ao estilo da Miniboss) e jogabilidade baseada em plataforma, ele conta a história de Madeleine, uma garota que resolve sair numa aventura e subir toda a Montanha Celeste – uma acidente geográfico com certa carga mística e capaz de atrair gente de todo tipo, de gerentes de hotéis confusos a aventureiros que topam qualquer coisa por uma selfie especial. 

Também é fácil entender sua mecânica – afinal, Madeleine tem apenas dois comandos possíveis: saltos simples e saltos “especiais”, que a projetam um pouco mais longe do que o normal. Para se locomover entre plataformas, passarelas e passagens especiais, Madeleine pode apenas usar a combinação de um salto simples e um especial – cabe ao jogador entender como a física do game funciona e, a partir disso, bolar estratégias para superar seus obstáculos.

Ao contrário de outros jogos de plataforma clássicos, como Sonic ou Mario, não há inimigos para matar ou abater pelo caminho: é preciso apenas seguir em frente e, às vezes, escapar de inimigos, como acontece em jogos mais modernos do gênero, como Inside ou Super Meat Boy. Celeste é também um jogo dividido em fases – a cada uma delas, o jogador é apresentado a novos tipos de estruturas de cenário, tendo que aprender como superá-las. 

Um dos principais trunfos do game é a forma como faz isso: sem dó nem piedade. É na base das muitas tentativas e inúmeros erros que o jogador aprende como avançar. Ao falhar, a rapidez para poder começar de novo dificulta que o jogador desista do desafio. Quando consegue, a sensação de superação lhe dá adrenalina para seguir em frente até o próximo obstáculo – quando novamente pode tentar e errar, tentar e errar, centenas de vezes, até chegar no topo da montanha. 

Jogo tem desafios em plataforma simples de entender, mas difíceis de serem superados Foto: Matt Makes Games

Envolvimento. Fosse apenas desafiador, Celeste seria um jogo que poderia ser largado facilmente por qualquer jogador pouco afeito a ser desafiado. Há muito mais, porém, do que isso: graficamente, o jogo tem um tratamento muito polido e interessante – a forma como os gráficos retrô são combinados ao 3D poligonal nos menus é bastante elegante. A trilha sonora – que acompanha as fases e poderia se tornar repetitiva pela dificuldade do jogo – é outro ponto alto, pois acompanha a tensão dos desafios propostos pelo game sem cansar o jogador. 

Além disso, a boa sacada de dividir um jogo de exploração em fases delimitadas e criar níveis para quem está a fim de desafios ainda mais intensos – preste atenção nas fitas cassete que mostram os lados-B das fases – geram conteúdo que não esgota o jogo em si mesmo. Afinal, é possível jogá-lo e rejogá-lo em busca de superar recordes. 

Publicidade

O grande trunfo de Celeste, porém, é envolver o jogador com sua narrativa. Diálogos simples e encontros com personagens mostram que Madeleine, mais do que apenas uma mochileira em busca de aventura, tem uma jornada repleta de significado. Subir a Montanha Celeste é, para ela, uma forma de lidar com seus demônios interiores, superar a si mesma e seus problemas – em uma grande metáfora sobre a depressão, um dos grandes males dos tempos modernos. 

Jogo traz bonita metáfora sobre como é viver com depressão Foto: Matt Makes Games

A metáfora é bonita: afinal, ao não ter inimigos externos como obstáculos, tudo o que Madeleine tem que enfrentar é a caminhada morro acima – e os rivais internos que surgem para atacá-la. Ao longo da jornada, ela encontra pessoas com outros problemas tão graves quanto os seus – como o gerente de hotel falido que não consegue deixar o local. É uma forma de exemplificar que “cada pessoa vive sua própria batalha, e apesar dos problemas, precisamos ser gentis uns com os outros.” Além disso, apesar dos encontros que tem pelo caminho ou das ligações que recebe de sua mãe durante a viagem, ninguém consegue exatamente auxiliar Madeleine – é só ela que pode encontrar sua própria paz interior. 

Vale a pena? Muito. Celeste é talvez o melhor jogo de 2018 até agora, por conseguir juntar de maneira sutil elementos que poderiam render bons jogos, mas simples – como a temática da depressão, os gráficos em pixel art, uma protagonista feminina ou a jogabilidade que combina exploração em plataforma. Ao uni-los, porém, Celeste o faz de maneira intrínseca a ponto que eles não consigam ser dissociados – o desafio de ir do ponto A ao ponto B pode ser tão complexo quanto o de lutar contra seus problemas. Um belo jogo – para quem se atrever a subir a montanha. 

CelesteProdutora: Matt Makes GamesPlataformas: PS4, Xbox One, Nintendo Switch e PCPreço: R$ 36,99 (PC)Já disponível no Brasil

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.