'Far Cry Primal': um game perdido na selva

Situado na Idade da Pedra, continuação da série Far Cry traz boa diversão, mas insiste em velhos vícios da Ubisoft

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Por Bruno Capelas
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O que você faria se fosse um homem das cavernas? Se a sua resposta for baseada em Far Cry Primal, a resposta pode ser um pouco repetitiva: proteger os companheiros da sua tribo, coletar elementos, caçar e domar animais que são maiores que você, e, de vez em quando, fazer alguma coisa especial, como matar um homo sapiens de uma tribo rival, participar de um ritual xamânico ou descobrir como construir uma nova ferramenta de caça. Lançado no final de fevereiro para PC, PS4 e Xbox One, o novo volume da série Far Cry coloca o jogador na pele de Takkar, um bravo guerreiro da tribo Wenja, em 10 mil antes de Cristo, buscando trazer novos ares para uma das franquias mais adoradas da Ubisoft.

A premissa é interessante: Far Cry é conhecida por ser uma série de tiro em primeira pessoa, colocando os jogadores em mundos abertos em lugares exóticos como as savanas africanas ou as montanhas do Himalaia. Não deixa de fazer sentido pensar na Europa Ocidental há 12 mil anos como um lugar… exótico. Outra marca registrada da série, a coleta de itens e o aprendizado de tecnologias, também faz bastante sentido. Que melhor jeito de fazer um herói aprender coisas como caçar, coletar flores ou criar armas ainda mais potentes do que retratando isso como parte da evolução da humanidade? Quem souber responder ganha o dente de um tigre-dente-de-sabre.

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No entanto, se a ideia é boa, a execução deixa a desejar. Com um mapa bastante semelhante geograficamente ao de Far Cry 4, lançado no final de 2014, Far Cry Primal sofre do mesmo problema recente de alguns jogos da Ubisoft: enormes mapas de mundo aberto com missões muito parecidas espalhadas por todo o cenário, torres (aqui no caso, são fogueiras) que, quando destravadas, fazem o jogador saber todos os recursos que há por perto, e uma estrutura de dominação geográfica bastante simples.

Além disso, Far Cry Primal também padece de um tropeço bobo: se a ideia de levar os jogadores para a Idade da Pedra poderia abastecer a equipe da Ubisoft de bons pontos de partida para contar histórias, isso não é bem aproveitado. Takkar é um personagem sem grande complexidade dramática, e a história de reunir a tribo perdida em um ataque de um grupo rival, para depois se vingar dos adversários é mal trabalhada. Os coadjuvantes e os vilões, outro ponto forte da franquia (lembre do insano Vaas, de Far Cry 3, e do estiloso Pagan Min, de Far Cry 4), também não chegam a inspirar muita agressividade ou raiva.

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No entanto, esses fatores não fazem com que Far Cry Primal deixe de ser um jogo divertido – e até muito divertido, em alguns momentos. Usar flechas, lanças e até mesmo colmeias para atacar seus adversários – no lugar das tão óbvias balas dos jogos de tiro em primeira pessoa – é um grande acerto, uma vez que dá ao jogador a possibilidade de diferenciar seu modo de jogo com bastante estratégia. A visão em primeira pessoa do jogo é outro destaque: com uma vasta natureza a ser explorada, o bom trabalho na parte gráfica de Far Cry Primal faz deste um dos jogos mais bonitos da geração até o momento – impressão que não se invalida mesmo quando o jogo tem uma ou outra queda de frequência (o que aconteceu diversas vezes durante meu teste, realizado em um Xbox One).

Ainda na questão da ambientação, um detalhe bobo, mas que me chamou muito à atenção foi a questão da linguagem: ao invés de falar inglês (o que seria pouco realista, mas esperado), os personagens de Far Cry Primal tem um dialeto próprio, baseado nas proto-línguas indo-europeias. Vez por outra é possível captar uma ou outra palavra parecida com o português no decorrer das falas, o que dá um sabor minimamente familiar àqueles humanos esquisitos e barbudos que se vê na tela.

Outro grande momento do jogo diz respeito a uma de suas novidades: a capacidade de domar animais e utilizá-los como meios de transporte ou companheiros de combate. Graças a poderes xamânicos, conquistados no início do jogo, Takkar pode domar pequenos animais, como lobos e corujas ou até mesmo uma onça pintada. (Não, infelizmente não dá para domar um mamute. Mas você pode andar em cima de um!).É bastante divertido planejar um ataque a um acampamento inimigo usando uma coruja, uma pantera e o seu próprio arsenal, por exemplo – pena que, dependendo do nível de dificuldade em que se joga, o game fica bastante simples depois que você domina um predador de grande porte, como um urso ou o tigre-dente-de-sabre. Além disso, mesmo em meio à selvageria, Far Cry Primal se permite um momento fofo: você pode dar carne e afagar os bichos que domou.

Além disso, as missões do jogo são divertidas: não é todo dia que você precisa seguir os rastros de um grande urso (aquele abraço, Di Caprio!) para depois matá-lo ou surpreender as tribos inimigas em seus acampamentos só para poder roubar uma pedra preciosa. Pena que, para um mapa tão grande, haja pouca variedade do que fazer – chega uma altura em Far Cry Primal em que, depois de uma sequência de missões, só resta ao jogador “rolar na relva, perdido na selva”.

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Vale a pena? Se tudo o que você procura são algumas boas horas de diversão em um ambiente pouco explorado (a Pré-História) pelos games recentes, Far Cry Primal é uma boa pedida para você. No entanto, ao repetir alguns vícios dos jogos da Ubisoft nos últimos anos, Far Cry Primal tropeça na escala evolutiva ao não conseguir ser mais do que uma grande distração – e a distância entre uma tribo que sobrevive e uma que não, às vezes, pode estar justamente em um pequeno detalhe.

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