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Jogos brasileiros sofrem para achar ‘janela’ de lançamento ideal

Em busca de um lugar ao sol, produtores locais armam estratégias para não bater de frente com grandes games do mercado mundial

Por André Cáceres
Atualização:
Game brasileiro Black Iris vai sair para o PlayStation 4 no meio do ano, mas quer evitar concorrência com remasterização de Dark Souls Foto: Hexa Game Studios

Quando surgiu a notícia de que o primeiro game da série Dark Souls seria relançado para PC, PlayStation 4, Xbox One e Nintendo Switch no dia 25 de maio de 2018, legiões de fãs vibraram com a possibilidade de jogar novamente o RPG de ação. Quem não ficou feliz com o anúncio foram os desenvolvedores de Black Iris, jogo nacional que se destacou na última Brasil Game Show (BGS). O motivo? Inspirado na franquia da From Software, o game chegou a receber a alcunha de “Dark Souls brasileiro” e tinha seu lançamento no PC previsto para a primeira quinzena de junho – ou seja, poucos dias após o retorno do peso pesado japonês – e depois no e PlayStation 4.

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“Foi uma surpresa boa porque poderemos jogar Dark Souls novamente, mas comercialmente não foi tão bom para nós”, admite Abraham Kim, programador de Black Iris e um dos fundadores do Hexa Game Studio. “Temos muito medo, porque não sabemos como o público vai reagir de fato. Espero estar errado, mas acho que isso vai ter impacto negativo na nossas vendas”, diz ele. 

Agora, o objetivo de Kim e seus companheiros é tentar finalizar o jogo antes do lançamento da versão remasterizada de Dark Souls, para que Black Iris não seja ofuscado pelo “primo rico”. “Não está fora de cogitação [antecipar o cronograma], mas vamos prezar pela qualidade e pelo polimento”, ressalva.

Black Iris está desenvolvimento há mais de dois anos, por uma equipe formada inicialmente por duas pessoas, que duplicou durante o processo. “Ainda somos um time enxuto, porque cada um acumula várias funções”, diz Kim, que reconhece a influência de Dark Souls no projeto – antes de jogar o game, lançado originalmente em 2011, ele preferia jogos multiplayer (para vários jogadores). “Depois de Dark Souls, vimos que havia estilos que ofereciam uma grande recompensa após derrotar os inimigos e pensamos se era possível fazer um jogo assim”, relembra o desenvolvedor. Hoje, Black Iris está em sua terceira versão, mas foi um dos primeiros protótipos convenceu a Sony a publicá-lo em sua plataforma. 

Black Iris foi comparado a Dark Souls durante a BGS 2017 pelo estilo gráfico, ambientação sombria, jogabilidade semelhante e, é claro, pelo nível de dificuldade que oferece. O jogo concebido por Hidetaka Miyazaki cultivou a fama de difícil e inspirou diversos RPGs de ação mundo afora, como Lords of the Fallen, Bound by Flame e Nioh, além de aspectos do combate e da exploração de The Witcher III: Wild Hund e The Legend of Zelda: Breath of the Wild. 

Agenda. Mas como é definido o calendário de publicação dos games? As grandes empresas se assemelham a Hollywood, segundo Kim, tentando não disponibilizar jogos parecidos em semanas muito próximas. “Nos estúdios menores, não temos tanto poder de decisão quanto à data de lançamento, pois não temos tanto dinheiro para investir em marketing”, acrescenta Kim. “O jogo é lançado de um a dois meses após estar pronto.”

O estúdio brasileiro Mad Mimic passou por uma situação parecida: seu primeiro jogo, No Heroes Here, foi lançado para PC apenas dois dias após Cuphead, um dos títulos independentes que mais se destacaram em 2017. “Pesquisamos todos os jogos grandes, mas deixamos de lado os lançamentos de independentes”, lamenta Luis Gustavo Sampaio, um dos desenvolvedores da Mad Mimic. “Isso ofuscou demais a gente. Quando começou a baixar a poeira do Cuphead, já era novembro e os blockbusters estavam sendo lançados.”

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No Heroes Here, do estúdio Mad Mimic Foto: Mad Mimic

No segundo trimestre de 2018, No Heroes Here terá um novo lançamento, dessa vez para os consoles. “Agora estamos fazendo uma pesquisa mais abrangente, não só dos grandes, mas também dos indies e de relançamentos, pois tem saído muitos jogos antigos para o Nintendo Switch ou remakes para os outros consoles”, conta Sampaio. 

Esse movimento dos estúdios menores de buscar datas alternativas para fugir da competição pode gerar uma temporada de indies no meio do ano – de forma semelhante ao que acontece com os grandes blockbusters entre outubro e dezembro. “Ainda não existe isso, mas talvez esteja começando a se criar essa temporada”, opina o desenvolvedor. 

Para Daniel Silveira do Nascimento, criador de RocketFist, esse fenômeno é natural, uma vez que “se você é indie, está competindo com os outros indies”. Seu game foi lançado no Switch próximo ao hit Mario + Rabbids Kingdom Battle, mas ele acredita que teve um bom desempenho pois conseguiu fugir dos lançamentos de títulos semelhantes na mesma faixa de preço. 

Nascimento ressalta que os estúdios menores não têm como determinar tão bem a data por questões de orçamento. “Você não pode ficar guardando um lançamento sendo que não tem dinheiro para isso, precisa lançar logo para ter um retorno”, explica o desenvolvedor.

Rocket Fist foi o primeiro game brasileiro a chegar ao Nintendo Switch Foto: Bitten Toast Games

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Há muito se fala sobre quando surgirá o primeiro blockbuster brasileiro, mas as condições no país não são exatamente ideais para se desenvolver um game com orçamento robusto. A companhia polonesa CD Projekt Red é sempre usada como parâmetro por ter sido bem-sucedida em 2015 com The Witcher III: Wild Hunt, mesmo sendo de um país que não é polo tradicional de produção de games. 

Em terras tupiniquins, o mercado consumidor é volumoso, mas existem outros entraves para os jogos nacionais. “A crise econômica não afeta tanto”, afirma Abraham Kim. “Infelizmente, a realidade é que os títulos independentes brasileiros não são comprados pelo público brasileiro. A maioria das compras vem de outros países”, lamenta o desenvolvedor. 

Para Kim, o cenário ideal a ser formado no Brasil seria algo mais próximo do que ocorre na Coreia do Sul. “Lá, mesmo com uma população menor do que a nossa, os estúdios se mantém sem ter a necessidade de exportar seus games. A gente pode ter um mercado sustentável em que alguns jogos não precisam nem sair do próprio país”, espera o desenvolvedor do Hexa Game Studio. 

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