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Alta tecnologia (e falta de tecnologia) nas palestras

As melhores soluções para situações inesperadas nem sempre são altamente tecnológicas

Por Redação Link
Atualização:

Participo de muitas palestras. Costumo optar pelo formato do improviso, sem ler anotações nem roteiros, e uso uma apresentação de slides do Keynote ou do PowerPoint para me orientar. (Não, eu não uso as listas de tópicos — urgh! — e sim vídeos, gráficos engraçados e outros elementos decorativos.)

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Gosto de ter o laptop comigo no pódio por dois motivos. Primeiro, ao pressionar a barra de espaço, posso controlar o avanço dos slides com precisão, o que às vezes é fundamental para garantir a graça de uma piada.

Segundo, isto significa que posso ver anotações e indicações que a plateia não vê. Tanto o Keynote quanto o PowerPoint trazem um recurso de exibição para o palestrante. Neste caso, o projetor exibe para o público apenas os slides, mas, na tela do laptop, posso ver as anotações feitas, estatísticas que gostaria de lembrar, momentos de digressão cuidadosamente preparados — e, ainda mais importante, uma prévia do próximo slide.

Quando estou fazendo uma palestra com a qual já estou bem familiarizado, consigo me safar sem recorrer às anotações e prévias; já pude treinar o bastante. Mas se o cliente pede uma palestra nova, ou uma palestra mais especializada, a possibilidade de ver o próximo slide da sequência é uma referência importante para que eu me oriente quanto aos argumentos que desejo expor.

Em todos os auditórios, tenho o hábito de chegar cedo para cuidar dos preparativos técnicos. Sempre há um técnico em áudio e vídeo de prontidão, cujo trabalho é conectar os falantes do laptop aos do sistema de projeção; com o passar dos anos, passei a conhecer bem estes rapazes (e são rapazes em 99% dos casos).

Neste momento, é hilário reparar na expressão que eles fazem quando saco da mochila o MacBook que uso nas apresentações. Sei exatamente o que passa pela cabeça deles: “Oh, não, ele trouxe um Mac! A Apple muda o encaixe das saídas e entradas de áudio e vídeo com o lançamento de cada novo modelo — os Macs não usam saídas padrão VGA como os laptops que rodam Windows — e é impossível conectá-los ao projetor comprando um adaptador especial para aquele modelo exato de MacBook. Ó Deus, por favor, faça com que este sujeito tenha trazido seu próprio adaptador…”

Nos maiores e mais caros hotéis e teatros, estes técnicos têm cada adaptador que se possa imaginar. Eles abrem uma maleta preta e lá estão os adaptadores, oito modelos brancos diferentes da Apple, cuidadosamente organizados como ferramentas de encanador prontas para sanar os problemas de qualquer palestrante desavisado que apareça por ali com um Mac.

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Nas demais apresentações, é impossível não perceber o alívio dos técnicos quando eu tiro da mochila o adaptador certo.

Seja como for, de tempos em tempos ocorre algum imprevisto que tira este sistema dos trilhos. Alguns meses atrás, cheguei para cuidar dos preparativos técnicos e me reuni com o técnico projecionista de plantão. “Está bem, vou levar seu laptop para os bastidores”, disse ele. “Os slides serão exibidos a partir dali.”

“Ih”, respondi. Eu não estava esperando por essa. “Imaginei que pudesse controlar os slides eu mesmo, a partir do pódio.” “Sim, é isto que vai ocorrer”, disse ele. “Vou lhe dar um sinalizador. É como um controle remoto. Quando apertar o botão, o próximo slide será exibido.”

“Ah”, eu disse. “É como um transmissor USB?”

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“Bem, na verdade, não”, disse ele, um pouco tímido. “O sinalizador faz apenas com que uma luz se acenda nos bastidores. Meu colega vai avançar os slides manualmente quando vir a luz se acender.”

Não pude acreditar que aquele era o plano que o técnico tinha em mente. Eu podia dizer adeus à precisão no ritmo da palestra. Mas o grande problema estava na impossibilidade de ver as anotações e prévias dos slides como eu gostaria. Não havia escolha; era impossível trazer um cabo de vídeo até o pedestal, o que obrigava o laptop a ser levado para os bastidores.

Tentei memorizar o maior número de detalhes possível, decorando até a sequência dos slides, mas tive a impressão de que aquilo não ia dar certo. Eu sabia que a apresentação seria prejudicada se os slides me apanhassem de surpresa.

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Cerca de 10 minutos antes da palestra, alguém me perguntou casualmente se eu distribuiria material impresso para que a plateia acompanhasse o conteúdo de minha fala. “Não”, eu disse, “mas, se quiser, posso mandar um esquema por e-mail depois da palestra! Basta apenas…”

E foi então que a ideia me ocorreu: impressão! Bastaria imprimir os slides com as anotações, trazer as páginas comigo até o pódio e obter o mesmo resultado proporcionado pelo modo de exibição ao palestrante.

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E foi exatamente o que eu fiz. Dia salvo.

Mas, na semana passada, lembrei muito desta situação. Mais uma vez, cheguei para fazer uma nova palestra. Mais uma vez, os técnicos me disseram que o laptop teria que ficar nos bastidores. Mais uma vez, eu ficaria sem minhas anotações.

Desta vez, sorri confiante. Já sabia como contornar o problema. “Tudo bem”, eu disse. Salvei um PDF da apresentação de slides num flash drive e o entreguei à equipe. “Poderiam apenas imprimir o documento PDF que está neste dispositivo? Posso usar as páginas durante a palestra, e vocês controlam o fluxo dos slides a partir dos bastidores.”

Mas, cinco minutos mais tarde, o técnico voltou com más notícias: a impressora estava quebrada. “Pelo visto, você terá que decorar o conteúdo. A não ser que…”

Vi uma lâmpada se acender sobre a cabeça dele.

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Quinze minutos mais tarde, lá estava eu, no palco. No chão diante de mim havia dois monitores: um deles mostrava o mesmo conteúdo que o público estava vendo — e o segundo mostrava meu próximo slide. O técnico bolou uma solução ao mesmo tempo bizarra e engenhosa.

Nos bastidores, ele copiou a apresentação em dois computadores. Cada um deles estava ligado aos “monitores de confiança”, como são chamados. O sujeito encarregado de avançar os slides quando eu apertasse o botão do sinalizador pressionava a barra de espaço em ambos os computadores — mas o segundo computador estava sempre um slide adiantado em relação ao que seria exibido ao público da apresentação, possibilitando que eu tivesse a prévia de que necessitava.

Em mais de 500 palestras, nunca vi uma solução como esta. Um encontro de alta tecnologia e simples engenhosidade.

Mas sabem de uma coisa? No difícil mundo das palestras públicas, só há uma regra: vale tudo aquilo que funcionar.

* Publicado originalmente em 26/03/2011.

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