
Pedro Doria
Feita por dopamina, a política do MBL não tem como durar
A política que, via redes sociais, incita os centros de alerta e prazer do eleitorado tem prazo de validade curto
10/03/2022 | 17h56
Por Pedro Doria - O Estado de S.Paulo
Um partido com política condenada pelos próprios associados
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Mais do que afundar a carreira política do deputado estadual Arthur do Val, o impacto das mensagens em áudio que ele gravou traz lições. Tratam dos limites do tipo de ação política digital utilizada pelo MBL, pelo bolsonarismo, e pelo que alguns chamam de neobolchevismo digital. Arthur foi abatido pelas armas que sempre usou. Mais: por causa das armas que sempre usou.
É bom antes definir que arsenal é este. É tratar política de forma histérica. Tudo é escândalo. O objetivo é manter o giro do conteúdo das redes sociais, um conteúdo que mobilize. É uma política movida a dopamina. O neurotransmissor, que nos deixa alertas quando há risco de vida, também regula o prazer, e por isto mesmo é aquele jorro fugaz. A dopamina ativa o que o viciado sente. Explode, aí passa rápido.
Quando a comunicação política exige estar constantemente incitando os centros de alerta e prazer do eleitorado, voltando-o contra os adversários, a estratégia é de guerra permanente. O diálogo é impossível para quem mobiliza uma massa acéfala a bombardear agressividade, via redes sociais, políticos da oposição. Os ataques incessantes doem. Por isso, não são esquecidos.
Na esquerda, o discurso é de que o Movimento Brasil Livre (MBL), que tem em Arthur um de seus líderes, sempre foi assim. Mas isso parcialmente verdade. Os parlamentares do MBL fizeram um mea culpa público, reconhecendo sua contribuição para piorar o ambiente do debate. Assinaram juntos com a esquerda o principal pedido de impeachment do presidente Jair Bolsonaro (PL). E trabalharam para fazer uma grande mobilização nacional contra às manifestações golpistas de 7 de setembro.
O ato do MBL foi um fracasso. Um dos motivos é que boa parte da esquerda decidiu que sua rivalidade era mais importante do que reunir toda a oposição. Afinal, a política movida a dopamina não é privilégio da direita. Além disso, os ataques que tiram sangue virtual são lembrados no mundo real. Mas há outra razão. Ao tentar se afastar do bolsonarismo, o MBL descobriu que não conseguia mais mobilizar.
Então, o MBL voltou a ser o que era. Mas quem só ataca não faz aliados e a política é a arte de brigar sem romper. Quem rompe quando está por cima, é esquecido quando cai. E todo mundo cai. A política feita por dopamina pode congelar um país por alguns anos. Pode mobilizar uma minoria. Mas não tem como durar.
Em algum túmulo, John Locke se revira. Afinal, dele nasceu o liberalismo justamente para que tivesse voz quem oligarcas viam como “fáceis por serem pobres”.
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