Feito para desmontar

Da insatisfação com o nível de aprendizado em programação dos jovens surgiu um computador para brincar

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Por Anna Carolina Papp
Atualização:

Da insatisfação com o nível de aprendizado em programação dos jovens surgiu um computador para brincar

SÃO PAULO – O inglês Pete Lomas sempre gostou de montar e desmontar coisas. Ainda criança, programou seu primeiro game, um jogo da velha. Na adolescência, criou seu próprio computador com peças de outros eletrônicos.

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Após uma passagem rápida por uma universidade técnica, onde de fato descobriu sua paixão por computadores, Pete se formou em engenharia e ciência da computação na Universidade de Manchester, na Inglaterra, onde deu aulas por seis anos.

Depois, criou seu próprio negócio, em que projetava e construía eletrônicos. “Não me vejo como um inventor e, sim, como um criador, porque pego uma ideia e faço com que ela aconteça”, disse ele ao Link na Campus Party 2013, evento de tecnologia do País realizado no fim de janeiro e começo de fevereiro.

Algo, no entanto, sempre o intrigava: o fato de as pessoas terem perdido o interesse por programação e computação. Para ele, os feitos e inovações da era pós-PC, com seus sistemas fechados e difíceis de serem modificados, nem sempre são sinônimo de evolução.

Foi quando em 2008, em uma exposição na Imperial College, em Londres, Pete Lomas se viu discutindo essa questão com um estranho: “Está muito difícil conseguir bons engenheiros; parece que eles não sabem mais nada hoje. Você pergunta coisas de um circuito simples e eles não sabem fazer. Há dez anos, fariam de olhos fechados!”, disse ele.

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Seu interlocutor lhe respondeu: “Sou professor de ciência da computação na Universidade de Cambridge e tenho um colega, Ebin (Upton), que vê exatamente o mesmo problema em software”. Ele contou a Lomas que os dois tinham uma ideia: construir um pequeno computador para que crianças e adolescentes pudessem ter experiência com programação antes de entrar na universidade.

O engenheiro ficou entusiasmado e já começou a dar palpites sobre eletrônica. Na semana seguinte, Lomas foi à universidade e conheceu Ebin Upton e sua equipe. E aí nasceu a Raspberry Pi Foundation, organização sem fins lucrativos que desenvolveu o computador educativo de mesmo nome.“Basicamente criamos a fundação num aperto de mão: não tínhamos nome, logotipo, plano e nem ideia de como fazer acontecer – só sabíamos que tínhamos de fazer acontecer de qualquer jeito!”, contou.

Baixo custo. Foram muitos protótipos até que, em dezembro de 2011, eles chegaram ao Raspberry Pi: uma placa de circuito sem gabinete do tamanho de um cartão de crédito e que pesa 45 gramas. O sistema operacional é Linux e tem entradas HDMI, ethernet, USB, AV e cartão SD.

Conectado a um monitor, a placa faz basicamente tudo que um computador tradicional faz: navega na internet, edita textos, roda aplicativos e vídeos em alta definição. O modelo A, versão mais simples lançada neste ano, com 256 MB de memória, custa US$ 25. O modelo B, lançado há um ano, com 512 MB e conexão à internet, sai por US$ 35.

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O plano inicial era fabricar 10 mil unidades, com o investimento dos próprios fundadores, mas o novo computador superou todas as expectativas. Pete Lomas contou que, na primeira semana de vendas, recebeu uma ligação de Upton, dizendo: “Pete, não sei nem como dizer isso, mas parece que precisamos muito mais do que 10 mil – já temos mais de 100 mil pedidos”.

Nesse momento, os cofundadores decidiram que teriam de licenciar o produto. “Queríamos mantê-lo aberto, mas tínhamos de fazer uma escolha: se não licenciássemos, faríamos 20 por mês e o projeto não teria o impacto que desejávamos.”

Hoje, mais de 800 mil unidades do Raspberry já foram vendidas, e Lomas acredita que a marca de 1 milhão será alcançada até o aniversário de lançamento, no fim do mês. A renda é revertida para pesquisas, mas também vai para projetos educacionais.

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Para Lomas, o trunfo do Raspberry Pi, além do baixo custo, é o fato de despertar em crianças o interesse por software e hardware, instigando-as a criar coisas novas. “Isso recupera aquilo que falta a elas hoje com os iPhones e todos eletrônicos fechados; elas não podem abrir e têm medo de quebrar”, disse. “É preciso ter algo com que possam brincar, modelar e mudar. E, se quebrar, um novo custa menos do que uma refeição de restaurante.”

“À medida que mudamos a tecnologia, deixamos de ser desenvolvedores para virar consumidores”, critica o cofundador. Ele diz que é possível educar uma geração que não apenas consuma produtos, mas que tenha a oportunidade de questioná-los e vê-los em funcionamento a partir de suas próprias ideias.

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Outra coisa que encanta Lomas é a versatilidade do Raspberry, que pode ser usado para criar uma infinidade de projetos, de câmeras que vão para o espaço a robôs; de baterias eletrônicas a relógios e videogames.

Durante a Campus Party, o engenheiro se mostrou entusiasmado e disse que, depois dela, o Brasil está definitivamente no radar da fundação. “O Brasil tem uma comunidade vibrante de pessoas interessadas em computação e eletrônica. Esperamos que o Raspberry Pi possa ser reconhecido aqui como uma plataforma de computador de baixo custo e útil para fins educativos e para a comunidade em geral”, afirmou. No entanto, por ora o equipamento é vendido aqui por R$ 170 mais o frete.

O próximo lançamento da fundação é outro projeto: a câmera Raspberry Pi, em fase final de testes. Segundo Lomas, ela deve ser lançada ainda neste trimestre.

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—-Leia mais: • Link no papel – 18/02/2013

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