Inteligência artificial de 'Ela' ainda está distante

Lançado na sexta, filme do diretor Spike Jonze acende discussão sobre computadores capazes de ter emoções

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Por Bruno Capelas
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Em ‘Ela’, o ator Joaquin Phoenix interpreta um homem solitário que se apaixona por um sistema de inteligência artificial. FOTO: Reprodução

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SÃO PAULO – Depois do fim de um relacionamento, um homem solitário compra um sistema de inteligência artificial e tem com ele um caso de amor. Essa é, a grosso modo, a história de Ela, filme do diretor Spike Jonze (Quero Ser John Malkovich) que estreia nesta sexta-feira no circuito comercial brasileiro e concorre a quatro estatuetas do Oscar. Estrelado por Joaquin Phoenix (O Mestre) e pela voz de Scarlett Johansson (ela é Samantha, o sistema artificial que se relaciona com o personagem principal) , o longa-metragem mostra um futuro próximo, no qual as máquinas poderão aprender a partir da interação com o usuário e até ter emoções, podendo se apaixonar e fazer sexo. Ao final do filme, entretanto, uma pergunta fica: quanto disso pode ser real?

De acordo com o professor da Escola Politécnica (Poli) da Universidade de São Paulo Felipe Pait, “a princípio não há como afirmar que isso não pode existir. É algo que já era verdadeiro na época de 2001 – Uma Odisséia no Espaço, em 1968”, diz ele, fazendo referência ao filme de Stanley Kubrick que mostrava um computador capaz de jogar xadrez, ter conversas espirituosas e até matar voluntariamente um ser humano.

+ Crítica: ‘Ela’ radicaliza a impossibilidade do contato humano

Jaime Sichman, também professor da Poli, lembra que sites de compra, por exemplo, já usam sistemas de aprendizado com o usuário. “Sempre que compramos alguma coisa em um site de comércio eletrônico, ele guarda esses dados e utiliza em um sistema de recomendação”, explica. A distância entre uma simples sugestão e um diálogo de verdade como os exibidos no longa-metragem, entretanto, ainda é grande.

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O computador HAL 9000 é o companheiro de viagem dos astronautas de ’2001 – Uma Odisseia no Espaço’. FOTO: Reprodução

Para Márcio Cyrillo, diretor da empresa de serviços em tecnologia da informação Ci&T, será preciso antes ampliar o entendimento de como funciona o cérebro humano para ensinar a inteligência artificial a imitá-lo. Segundo ele, é necessário diferenciar capacidade computacional – como a dos supercomputadores da IBM que vencem campeões de xadrez e concursos de perguntas e respostas – com a interação emocional que Samantha demonstra ter no filme.

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Sistemas de voz“O que vemos em uso comercial não está muito longe do estado da arte. Hoje, softwares são capazes de reconhecer vozes, interpretar instruções simples e traduzir com alguns erros”, resume o professor Pait, descrevendo sem querer o funcionamento de sistemas de assistência de voz presentes em muitos smartphones, como o Siri (iOS) e o Google Now (Android).

Na visão de Cyrillo, o Google tem utilizado a inteligência artificial melhor que a Apple, integrando melhor os serviços e os aplicativos, além de investir mais no setor – recentemente, a gigante de buscas adquiriu por US$ 400 milhões a DeepMind, uma startup especializada em IA.

Em breve, esse mercado deverá ganhar um terceiro concorrente de peso: o Cortana, sistema que a Microsoft pretende lançar em abril para integração com o buscador Bing no Windows Phone, com pretensões de se expandir para as outras plataformas. Para os especialistas, entretanto, o novo candidato promete ser apenas uma tentativa da empresa de Bill Gates de alcançar seus rivais.

‘Ela’ foi indicado a quatro estatuetas no Oscar, e foi o melhor roteiro original no Globo de Ouro. FOTO: Reprodução

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‘Segunda Era das Máquinas’Mesmo sem sentir emoções e executar trabalhos com criatividade, os computadores têm modificado o ambiente de trabalho nos últimos anos. É o que mostram os pesquisadores Erik Brynjolfsson e Andrew McAfee em seu livro The Second Machine Age (“A Segunda Era das Máquinas”, ainda inédito no Brasil), dizendo que softwares e automação têm substituído não só empregados em uma linha de montagem como também muitos funcionários de escritório e até mesmo os responsáveis por desenvolver os produtos feitos nas fábricas.

Em uma matéria sobre o livro publicada recentemente pelo Link, fala-se em grandes mudanças nos empregos como os conhecemos hoje. Entretanto, na visão dos especialistas, não há motivo para criar pânico. “O desaparecimento de alguns empregos é uma constante desde a Revolução Industrial, mas, por outro lado, a criação de novas atividades é constante. O número de profissões que existem hoje mas não existiam na época da ‘Odisseia Espacial’ é muito grande”, avalia Pait. Já o diretor da CI&T crê que “as profissões do futuro serão evoluções naturais das que existem hoje, como aconteceu no passado, quando profissionais tiveram de se adaptar e usar um computador”.

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